Comércio Exterior
a) Resultados
Os números da balança comercial brasileira de novembro já refletem a desaceleração no ritmo do comércio mundial, principalmente em relação às exportações. Na terceira semana de novembro, as vendas externas caíram 21,2% pela média diária (US$ 671 milhões) na comparação com a média das duas primeiras semanas (US$ 852 milhões).
As importações mantiveram-se praticamente no mesmo nível, com crescimento de 0,5% na média diária no mesmo período de comparação. Em três semanas, a corrente de comércio (exportações mais importações) soma US$ 22,857 bilhões, indicando queda nas transações comerciais do país com o mundo. Em outubro, a corrente de comércio totalizou US$ 35,817 bilhões, depois de US$ 37,307 bilhões em setembro. Neste mês, mantido o ritmo atual, o total não passará de US$ 30 bilhões.
O desempenho da balança em novembro vem apontando para uma retração tanto das exportações quanto das importações. Na terceira semana do mês houve uma corrente de comércio de US$ 7,028 bilhões, com queda de 11,9% em relação à segunda semana de novembro (US$ 7,978 bilhões). Com US$ 3,355 bilhões de exportações e US$ 3,673 bilhões, a balança apresentou, na terceira semana, um déficit de US$ 318 milhões.
b) Crédito à exportação cresce 30% no BNDES
O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES) vai fechar este ano com desembolsos entre US$ 5 bilhões e US$ 5,5 bilhões no apoio às exportações das empresas brasileiras. O número ainda estará longe do recorde de 2006, de US$ 6,4 bilhões. Mas deverá ficar até 30% acima do volume registrado em 2007, quando o banco liberou US$ 4,2 bilhões em financiamentos à exportação. Para 2009, a previsão do banco é, no mínimo, repetir o desempenho de 2008.
Este ano as linhas de pré-embarque do BNDES, que financiam a produção do bem a ser exportado, deverão representar entre 60% e 70% das liberações totais do banco à exportação. Os outros 30% a 40% vão corresponder às linhas de pós-embarque, voltadas a financiar a comercialização de bens e serviços no exterior. De janeiro a outubro, o pré-embarque representou 70% das liberações e o pós, 30%. No período, o banco liberou US$ 4,5 bilhões para exportação com alta de 44% ante janeiro-outubro de 2007.
O maior peso relativo do pré-embarque este ano relaciona-se ao reforço orçamentário recebido pelo BNDES, em outubro, para fazer frente à crise de liquidez que secou linhas de crédito comerciais como o pré-pagamento e o ACC (Adiantamentos sobre Contratos de Câmbio). Na ocasião, o governo, por meio do Ministério da Fazenda, destinou R$ 5 bilhões para as linhas de pré-embarque do BNDES.
O dinheiro permitiu ao banco atender a demanda de empresas, sobretudo das que produzem bens de alto valor agregado, que encontravam dificuldade para obter capital de giro. O BNDES entrou cumprindo seu papel anticíclico, diz Luiz Antonio Araujo Dantas, superintendente do BNDES-Exim, área de comércio exterior do banco.
A demanda pelo pré-embarque, cujas condições de financiamento foram modificadas em outubro, foi grande. Dantas diz que foram apresentadas ao banco operações de pré-embarque de cerca de US$ 1 bilhão, sendo que metade já está contratada. As liberações devem começar esta semana. As operações envolvendo os outros US$ 500 milhões estão em tramitação no BNDES-Exim. O prazo médio entre a entrada do pedido de financiamento no banco e a contratação da operação é de 15 dias.
A expectativa de Dantas é que em dezembro sejam contratados mais US$ 200 milhões a US$ 300 milhões em operações de pré-embarque. Dessa forma, dos R$ 5 bilhões aportados pelo Tesouro para essas linhas, metade estaria comprometida ainda em 2008 e a diferença, de cerca de R$ 2,5 bilhões, ficaria para ser utilizada a partir de janeiro de 2009. A pergunta hoje é o que vai ocorrer com as linhas de pré-embarque do BNDES no ano que vem.
Se o mercado responder à demanda com linhas comerciais, tipo ACC e pré-pagamento, o BNDES poderá ficar em situação mais confortável para direcionar mais recursos para o pós-embarque, que inclui o financiamento à exportação de bens e serviços brasileiros para projetos de infra-estrutura no exterior, em especial na América do Sul. Em 2008, os desembolsos para esses projetos na região devem ficar entre US$ 500 milhões e US$ 600 milhões, bem acima dos US$ 433 milhões do ano passado.
Nas novas condições do pré-embarque, o banco eliminou a restrição de empréstimo para bens de capital, fixada em US$ 50 milhões por grupo econômico. Para bens de consumo, incluindo produtos como eletrônicos e alimentos, foi fixado limite de empréstimo de US$ 150 milhões por grupo. O Exim também passou a financiar 100% da operação. Antes da crise o banco financiava 60% do produto a ser exportado. O restante tinha de vir de outras fontes.
Os clientes passaram a ter duas opções de financiamento: taxa fixa de 15,35% ao ano pelo prazo do empréstimo, que é de 18 meses, ou 7,65% ao ano mais variação cambial (dólar). Na hora de escolher, as empresas se dividiram entre taxa fixa e dólar. Os setores que demandaram recursos do pré-embarque foram bens de capital, metalurgia e mineração, têxtil, alimentos, eletrônico e coureiro-calçadista. As restrições ao financiamento do pré-embarque, antes da crise, deviam-se ao fato de que o banco vinha registrando demanda acima do orçamento em todas as áreas.
c) Subsídios dobraram no país, aponta novo estudo da OCDE
O Brasil dobrou a concessão de subsídios ao setor agrícola no triênio 2005-2007 na comparação com o período entre 2002 e 2004, mostra novo relatório sobre a agricultura brasileira preparado pela Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Em parte, o aumento constatado serviu para atenuar o crônico endividamento dos produtores rurais do país. Mas ainda assim o volume de ajuda é pouco significativo se levadas em consideração as subvenções bilionárias concedidas pelos países industrializados a seus agricultores.
A agricultura brasileira cresceu rapidamente entre 2002 e 2007 e não cessa de inquietar os concorrentes. Pelos dados da OCDE, no país o setor representa 28% das exportações e apenas 5% das importações, sendo responsável por 97% do saldo da balança comercial consolidada brasileira.
A OCDE aponta que a área total para agricultura cresceu apenas 0,4% entre 1995 e 2006 no Brasil, mas que a produção aumentou 84%. A área de pastagens caiu 3%, para 172 milhões de hectares.
No mesmo período, o número de agricultores cresceu de 4,8 milhões para 5,2 milhões, levando a uma redução no tamanho médio das propriedades de 72 para 68 hectares, sempre conforme a OCDE. Isso reflete, segundo o órgão, a estrutura dual da agricultura brasileira, com grandes e pequenos produtores integrados aos mercados e convivendo com a agricultura de subsistência.
Espécie de clube dos países ricos, a OCDE monitora a agricultura brasileira desde 2003, quando as exportações de commodities do país começaram a incomodar mais os concorrentes dos países industrializados.
Em estudo para examinar até que ponto a produção agrícola seria subsidiada no país, a OCDE frustrou americanos e europeus ao constatar, em 2005, que o volume da ajuda governamental representou apenas 3% do valor da produção agrícola no triênio 2002-2004 - ante 37% na União Européia e 17% nos EUA. A versão atualizada do estudo indica que as subvenções pularam para 6% do valor da produção entre 2005 e 2007, ainda bem abaixo da média de 26% dos países da OCDE.
O Apoio Total Estimado (TSE, em inglês) para a agricultura no Brasil passou de uma média anual R$ 7,9 bilhões entre 2002 e 2004 para R$ 14,7 bilhões entre 2005 e 2007. Representou, no triênio mais recente, 0,6% do PIB. O TSE nos países ricos fica próximo dos US$ 300 bilhões, ou 1% do PIB. Os produtos que recebem mais ajuda governamental são arroz, algodão, milho e trigo, com sua parte no total da ajuda passando de 46%, em 2005, para 61% no ano passado.
O custo dos subsídios agrícolas para os consumidores brasileiros permanece mais ou menos estável. A transferência dos consumidores para o setor, mensurada quando estes pagam mais que os preços mundiais, foi de R$ 3,8 bilhões em 2007. A transferencia a partir dos contribuintes (Tesouro) foi de R$ 9,7 bilhões. O Brasil fornece relativamente um baixo nível de apoio e proteção à agricultura, refletindo sua posição como exportador competitivo e com política comercial relativamente aberta, afirma a OCDE.
Entre as medidas de apoio adotadas pelo governo, a entidade destaca a alta do crédito subsidiado disponível para os agricultores. O financiamento pelo Sistema Nacional de Crédito Rural subiu para R$ 50 bilhões, ou 25% da produção agrícola total. Com a queda na taxa básica de juros do Banco Central, a margem de preferência para os agricultores também diminuiu.
Mas, sobretudo, a OCDE vê crédito subsidiado nas sucessivas rolagens das dividas do setor. Calcula que um terço da divida total de R$ 88 bilhões do setor era de produtores que tinham deixado de honrar os pagamentos. Para o órgão, os pacotes de alivio beneficiam os produtores rurais no curto prazo, mas desencorajam o desenvolvimento de um mercado de crédito que funcione corretamente.
Em discussão na semana passada na OCDE, a situação brasileira não era isolada. China, India, África do Sul e outros emergentes também estão ajudando seus agricultores endividados. Os países desenvolvidos tampouco reclamaram, até porque na crise financeira atual também voltaram a dar subvenções também ao setor industrial, com impacto na concorrência no mercado global.
A entidade avalia que a extensão do programa nacional de seguro rural, se bem sucedida, reduzirá a necessidade de intervenção do governo no longo prazo. Estima que o Brasil avança na integração de produtores pequenos e de subsistência. Mas levanta duvidas sobre o Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), por causa do impacto da crise financeira. Alerta, em todo caso, que investimentos em infra-estrutura são essenciais para a agricultura brasileira continuar a crescer.
d) Rentabilidade da exportação é a maior em quatro anos
Com a ajuda da recente desvalorização cambial, a rentabilidade das exportações brasileiras atingiu o patamar mais alto dos últimos quatro anos. O aumento na margem de lucro superou com folga os descontos concedidos aos clientes. Segundo a Fundação Centro de Estudos do Comércio Exterior (Funcex), a rentabilidade das exportações cresceu 16,5% entre setembro e outubro, graças à desvalorização do real. No mês passado, o dólar ficou, na média, em R$ 2,18, 17,5% acima do R$ 1,80 registrado em setembro. O aumento da margem de lucro das vendas externas superou com folga a alta de 1,7% nos custos e a queda de 1,9% nos preços. Em relação a outubro de 2007, a rentabilidade subiu 32%.
A dificuldade para os exportadores, agora, é encontrar comprador para os produtos, porque a demanda externa foi prejudicada pela crise global. O clima é mais otimista entre os fabricantes de bens semi-duráveis, como calçados e têxteis, cuja demanda é menos sensível à crise. Para os exportadores de bens de capital e bens duráveis, como automóveis, o cenário é mais complicado, porque essas vendas dependem de crédito e tendem a ser mais prejudicadas em tempos de insegurança na economia.
A mudança cambial trouxe ganho expressivo para o exportador, pois os preços dos produtos já estavam em patamares recordes, disse Fernando Ribeiro, economista da Funcex. A rentabilidade da exportação em outubro superou em 5,6% os níveis de 2004, quando o dólar médio estava em R$ 2,90, patamar mais favorável para as vendas que o atual. A diferença está nos preços de exportação, que em outubro estavam 90% acima dos observados em 2004.
Estamos saindo de uma economia virtual para entrar na economia real, comemorou Marlin Kohlraush, presidente da Bibi Calçados. Ele destacou que as exportações ainda não reagiram porque os compradores estão inseguros. Ele acredita, contudo, que vai ampliar as vendas porque o setor calçadista não é tão afetado pela crise. Para Domingos Rigoni, presidente da Movelar, as exportações devem se recuperar um pouco em 2009, graças ao câmbio, mas não será uma explosão se a demanda externa não melhorar. O câmbio ajuda e o mercado não ajuda.
Para a Lupo, fabricante de meias, cuecas e lingeries, o dólar acima de R$ 2 ajuda a tornar os produtos da empresa mais competitivos na disputa por mercado com os asiáticos, segundo o diretor comercial, Valquírio Ferreira Cabral. Respondendo por 6% do faturamento da empresa, as exportações devem crescer quase 40% neste ano e, mesmo com a crise global, podem aumentar algo como 25% a 30% em 2009, acredita ele. Com a desvalorização do câmbio, Cabral contou que conseguiu reduzir um pouco os preços em dólares dos novos produtos, sem que isso comprometesse todo o ganho de rentabilidade propiciado pela moeda americana mais cara.
Os preços cobrados pelos exportadores recuaram 1,9% em outubro em relação a setembro, segundo a Funcex. A queda foi de 3% para os produtos básicos, por conta da queda das commodities, e de 0,9% nos manufaturados. Para compensar o câmbio, os exportadores brasileiros concederam descontos. No acumulado do ano, os preços de exportação ainda sobem expressivos 29,7%, com alta de 47% para os básicos e 18% para manufaturados. A quantidade exportada pelo país caiu 1,7% de janeiro a outubro. Nos manufaturados, a perda chegou a 4,7%.
No setor de bens de capital, a margem de lucro também melhorou, mas o mercado continua parado e os empresários não estão otimistas. Mônica Vader, diretora da Máquinas Ferdinand Vaders (Feva), contou que perdeu duas vendas para o México e uma para a Colômbia, devido à falta de crédito e ao receio das clientes em investir num momento desfavorável. Em compensação, a Feva vendeu outras três máquinas para o Equador, cuja economia é dolarizada. Os clientes de lá resolveram aproveitar. Vendi três máquinas da noite para o dia. O mercado está muito estranho, disse Mônica.
O dólar mais caro também tem impactos negativos sobre as empresas. Na Lupo, que tem 30% de seus insumos atrelados à variação do câmbio, a alta da moeda implicou aumento de custos. Eles subiram 12% neste ano, disse Cabral, que elevou em 7% os preços dos produtos que serão entregues a partir de janeiro - no caso dos encomendados até outubro, e que chegarão aos clientes até dezembro, as cotações foram mantidas.
Alguns economistas têm uma visão menos otimista sobre as perspectivas para as exportações. Para o economista-chefe da MB Associados, Sérgio Vale, o câmbio mais desvalorizado poderá ajudar as empresas no curto prazo, num momento em que regiões como América Latina, Oriente Médio e Ásia ainda crescem a taxas razoáveis. No ano que vem, contudo, a situação será diferente, avalia ele.
Com a perspectiva de desaceleração generalizada da economia global, a demanda externa vai diminuir, tornando o impacto do câmbio bem menos relevante. Vale espera que os preços das exportações sigam em queda - assim como os das importações. Em outubro, aliás, as cotações das compras externas recuaram 4,2% em relação a setembro. No acumulado do ano, ainda sobem 23,8%. Já o volume importado continua a crescer. Aumentou 4,5% sobre setembro, elevando para 22,1% a alta no ano.
Agronegócio
a) Preços do cereal seguem com forte queda no país
Os preços do trigo no país seguem em queda e a tendência é que continuem sem sustentação nas próximas semanas, segundo a consultoria Safras&Mercado. São os menores patamares de preços desde abril de 2007, afirmou Élcio Bento, analista de trigo da Safras.
Na semana passada, a tonelada do trigo do Paraná fechou a R$ 470, recuo de 15% sobre igual período do ano passado. No Rio Grande do Sul, saiu a R$ 420 a tonelada, baixa de 7% sobre o mesmo período de 2007. As cotações estão sem referência. Entre março e abril deste ano, os preços chegaram a romper o patamar de R$ 800 por tonelada nessas mesma regiões produtoras.
Segundo levantamento da Safras, o cereal do Paraguai continua como alternativa competitiva aos moinhos do país. No Paraná, chega cotado a US$ 210 a tonelada. O trigo argentino também continua em queda e chega em São Paulo por volta de US$ 238 a tonelada.
Sem alternativas, os produtores, que estão em plena colheita, estão pressionando o mercado por conta da necessidade de fazer caixa. Os agricultores semearam o trigo na alta e estão colhendo com preços muito abaixo do esperado.
No dia 13, a Conab negociou 37 mil toneladas do cereal no leilão de Prêmio de Escoamento do Produto (PEP), ou 37% das 100 mil toneladas ofertadas, dos quais 50 mil do Rio Grande do Sul e 50 mil do Paraná. Os negócios se restringiram ao cereal do Rio Grande do Sul, enquanto o PEP para o produto do Paraná não teve negociações.
A safra será maior este ano no Brasil. Mas, segundo a Safras, a tendência é que haja grande volume de triguilho (cereal de qualidade inferior), sobretudo no Rio Grande do Sul, que foi afetado pelas chuvas entre outubro e novembro. A produção no país está estimada em cerca de 5,6 milhões de toneladas. O consumo está previsto em 10,1 milhões de toneladas.
Os gaúchos deverão colher 1,95 milhão de toneladas e o Paraná de 2,95 milhões. As importações podem chegar a 6,1 milhões de toneladas. Na Argentina, maior fornecedor para o Brasil, a produção está estimada em 10,5 milhões de toneladas, com um saldo exportável 4 milhões e 4,5 milhões de toneladas, o que levará o Brasil a buscar trigo de outros mercados.
b) Nova barreira deve afetar exportação de químicos a UE
O mês de dezembro chega com a ameaça de nova barreira para exportações do Brasil à Europa que vem preocupando as autoridades brasileiras. Na segunda-feira termina o prazo fixado pela União Européia (UE) para que as empresas interessadas em vender naquele mercado façam o pré-registro no sistema Reach (Registro, Avaliação, Autorização e Restrição de Químicos ), de controle da liberação de substâncias químicas por mercadorias vendidas na região. exportações brasileiras de até US$ 2 bilhões estão sujeitas a registro, calcula o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, que já prevê danos às vendas do país aos europeus.
Muitas empresas não se dão conta: quem estiver sujeito a registro e não fizer o pré-registro até 1º de dezembro não poderá mais exportar à União Européia, alerta o secretário de Comércio Exterior, Welber Barral. As empresas sem pré-registro só poderão voltar a exportar após concluído o processo normal de registro, que pode levar 11 anos e tem custos de até 2,8 milhões de euros por substância registrada. A exigência de registro no Reach atinge mais de 50 mil substâncias químicas e se estende a manufaturas que tenham essas substâncias na composição e as liberem no ambiente - brinquedos ou sandálias aromatizadas, por exemplo.
Exportadores de pedras preciosas descobriram que terão de fazer registro das resinas usadas para a comercialização das pedras, calçadistas terão de registrar a cola usada nos sapatos, metais formalmente estão livres disso, mas ligas metálicas são obrigadas ao registro. Os especialistas avaliam que a nova barreira deve afetar principalmente as exportações de pequenas e médias empresas, já que grandes companhias, como a Vale, vêm se preparando para cadastrar os produtos e manter as vendas aos europeus. O Brasil exporta anualmente cerca de US$ 23,9 bilhões em produtos químicos, a maioria, porém, isenta das exigências criadas pelos europeus, ou com sistemas de controle específicos.
Algumas empresas menores falam em deixar de exportar à Europa, disse, em depoimento a parlamentares, o vice-presidente executivo da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim), Nélson Pereira dos Reis. Produtores de manufaturas exportadas aos europeus podem ser obrigados a trocar fornecedores locais por europeus, para não perder o mercado. A decisão européia não pode, por enquanto ser acusada de protecionista, já que as exigências se aplicam a todas as empresas, inclusive as locais, mas pode fechar mercados ao Brasil, para exportadores de substâncias que servem como matéria-prima em outros países na produção de mercadorias a serem exportadas à Europa. Se não registrarem suas substâncias, esses exportadores também poderão ser trocados por outros, com registro.
A Agência Européia de Químicos (Echa, da sigla em inglês), criada pelos europeus para coordenar o Reach, deve divulgar, em janeiro, a lista das substâncias pré-registradas. Na página da agência na internet, a lista preliminar de substâncias pré-registradas chegou, até o começo do mês, a 51,3 mil produtos, mas nem os europeus nem o governo brasileiro sabem exatamente quantas empresas estão envolvidas no processo. Algumas pré-registram suas substâncias sozinhas, outras se associam para fazer fazer o pré-registro.
A Abiquim, principal associação engajada nos esclarecimentos sobre o Reach no Brasil, fez uma pesquisa com as quase 770 empresas catalogadas pelo Guia da Indústria Química no Brasil e constatou que pelo menos 30 delas não pretendem pré-registrar os produtos no Reach - 14% das 215 empresas que responderam à enquete.
Não há dúvida de que esse processo vai afetar as empresas descapitalizadas, comenta Rinaldo Mancin, diretor do Instituto Brasileiro de Mineração. Só o registro de uma substância como o níquel pode chegar a custar 3 milhões de euros, sem incluir gastos com a estrutura fixa a ser montada, diz. O Reach inverte o ônus da prova para o uso das substâncias químicas: em lugar de investigações feitas pelo governo para testar a periculosidade das substâncias, é o setor privado quem tem de fazer esses estudos, e, pelo que prevê o sistema recém-criado, tem de manter representante legal exclusivo na Europa, para se responsabilizar pelo registro e por eventuais problemas causados pela substância registrada.
Por enquanto, a contratação desse representante é o único custo imposto à empresa que deseja fazer o pré-registro, processo informatizado, e acessível pela página da Echa na internet. Após essa fase, as empresas terão um prazo para registrar suas substâncias, de no mínimo 3,5 anos, que varia conforme o grau de periculosidade da substância e o volume comercializado na União Européia.
O primeiro passo das empresas é fazer um inventário das substâncias usadas na produção e ver quais vale a pena exportar, recomenda a assessora da vice-presidência da Abiquim, Maria Elisa Curcio, especialista no novo sistema europeu. É necessário confrontar os custos de se manter o representante na Europa e financiar os testes das substâncias com a expectativa de vendas da substância ao mercado europeu, explica ela. É uma decisão para a alta administração da empresa, porque é muito custoso e tem a ver com a estratégia da companhia.
A UE permite que as empresas diluam os custos formando consórcios, e produtores de substâncias como silicone, etanol, fragrâncias, alumínio já formaram os seus. A decisão européia traz complicações para as estratégias das empresas, já que as empresas terão de trocar com os concorrentes informações sobre seus produtos, para o registro e monitoramento.
c) País negocia cota de etanol com tarifa mais baixa
O Brasil quer assegurar um volume substancial de exportação de etanol para União Européia (UE) e Estados Unidos com tarifa mais baixa, como condição para aceitar nas próximas semanas um acordo pelo qual os dois gigantes criariam novas cotas agrícolas, que limitam a quantidade de produtos que podem entrar em seus mercados.
Fonte próxima de Bruxelas indicou ontem que a UE e o Brasil poderiam conduzir as negociações para um volume de cota representando 6% do consumo europeu. Mas diplomatas brasileiros negaram que o tema já tenha sido tratado e insistiram que as cifras devem ser bem diferentes. O que deve, de fato, balizar a barganha são as cifras que estavam na mesa em agosto, quando fracassou a negociação ministerial de Genebra, e que podem resultar em negócios de várias centenas de milhões de dólares por ano.
A UE tinha proposto ao Brasil um plano escalonado pelo qual a cota para o etanol começaria com 4% do consumo domestico europeu e, sete anos depois, chegaria a 10%. Isso significa volume de 200 mil toneladas no primeiro ano, até alcançar 1,4 milhão de toneladas sete anos mais tarde, representando um negócio de US$ 1 bilhão, de acordo com a cotação de ontem.
A Unica, entidade que representa os produtores brasileiros, reagiu, porque o consumo na UE é baixo atualmente. Considera que a cota deveria começar com 11% do consumo europeu (5% por causa de acordo sobre cotas ainda da Rodada Uruguai e 6% pela criação de novas cotas).
A discussão com os europeus sempre esteve mais avançada do que com os EUA. Mas as cifras para etanol no mercado americano são substancialmente maiores. Se a cota nos EUA começar com 4% do consumo doméstico, representará 1,7 milhão de toneladas de exportação. Chegando a 10% sete anos depois, o volume de exportação estará em 6,8 milhões de toneladas, o que representa pouco mais de US$ 4 bilhões por ano.
Atualmente, países importadores já impõem várias cotas, limitando a entrada de produtos agrícolas em seus mercados. Agora, querem criar novas cotas, mas precisam compensar os exportadores. O problema é o Japão, maior importador liquido de alimentos, que resiste a pagar a fatura.
Parece claro para certos negociadores, em todo caso, que o Japão terá de abrir volume com tarifa menor para o açúcar, podendo beneficiar o Brasil. A Noruega pode também abrir cota para carne bovina, o que favorece o Mercosul.
Até sexta-feira, os países na Organização Mundial do Comércio (OMC) devem sinalizar alguma flexibilidade sobre salvaguarda exigida pela Índia, China e outros países em desenvolvimento com agricultura frágil, para frear importações. E também sobre o número de produtos sensíveis, que países desenvolvidos querem relacionar para sofrerem cortes tarifários menores.
d) Venda de adubo tomba em outubro
A demanda dos agricultores por fertilizantes confirmaram a tendência de queda iniciada em setembro e registraram forte retração em outubro, de acordo com levantamento da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda). Na segunda-feira o Ministério da Agricultura já havia sinalizado o novo recuo, mas sem detalhar o balanço de oferta e demanda do segmento.
Conforme a Anda, as entregas das empresas misturadoras (que fabricam o produto final) às revendas espalhadas por todo o país somaram 2,032 milhões de toneladas no mês passado, 7,8% abaixo do volume de setembro e 35,5% menos que em outubro de 2007. Com o resultado, parece definitivamente comprometido o recorde anual previsto no início de 2008.
Ainda que a Anda não corroborasse projeções que sinalizavam entregas de até 27 milhões de toneladas este ano, que o recorde de 2007 (24,609 milhões) seria quebrado era considerado barbada em janeiro. Com os problemas de crédito que se tornaram agudos no setor a partir de setembro, contudo, humores e expectativas mudaram muito.
Nos primeiros dez meses de 2008, as entregas totalizaram 20,245 milhões de toneladas, 2% menos que em igual intervalo do ano passado. Hoje, no segmento, poucos crêem em reversão de tendência em novembro e dezembro, tendo em vista que o plantio da safra de verão 2008/09 está avançado e as compras para o plantio da safra de inverno de 2009 ainda estão praticamente paradas, ao contrário do cenário no fim de 2007.
Com a redução das entregas, voltaram a cair no mês passado a produção nacional (18,3% em relação a outubro de 2007) e as importações de fertilizantes (39,9%). Com isso, nos dez primeiros meses deste ano a produção nacional alcançou somou 8,046 milhões de toneladas, 1,9% menos que no mesmo período do ano passado, e as importações alcançaram 14,682 milhões de toneladas, ainda uma alta de 1,6%.
Para as grandes empresas que atuam no segmento, a reversão não chega a ser o fim do mundo. Isso porque, graças as boas vendas do primeiro semestre e aos elevados preços praticados, em linha com o mercado internacional, seus resultados nos três primeiros trimestres do ano foram polpudos, como já demonstraram os balanços de empresas como Fosfertil (maior fabricante de matérias-primas para adubos do país) e Heringer (terceira no ranking de vendas de produtos finais), que têm ações negociadas na BM&FBovespa.
Antes de o mercado começar a acelerar em marcha a ré, previa-se que as vendas de adubos poderiam gerar receita de até R$ 40 bilhões em 2008, ante R$ 17 bilhões em 2007. O salto não será mais tão grande, mas fontes do segmento ainda esperam algo próximo de R$ 30 bilhões.
O levantamento da Anda deixa claro o motivo que levou à paradeira das entregas após o apagão do crédito. Praticamente todos os principais produtos agrícolas não acompanharam os fortes aumentos de preços do insumo, o que significa que é preciso um maior volume de produto para comprar a mesma quantidade de adubo. Em relação a 2007, o raciocínio vale para algodão, arroz, batata, café, cana, laranja, milho, soja e trigo. Só o feijão sai ganhando.
e) Oferta de cana crescerá pouco na safra 2009/10
As usinas do Centro-Sul do país deverão processar na próxima safra, a 2009/10, 520 milhões de toneladas de cana. Se confirmadas as estimativas, será um crescimento de 8,3% sobre o ciclo anterior, de 480 milhões de toneladas, de acordo com a consultoria Datagro, em sua primeira previsão de safra para o próximo ciclo. No Brasil, a moagem em 2009/10 deverá ser de 588 milhões de toneladas, alta de 7,6%.
Segundo Plínio Nastari, presidente da Datagro, a moagem poderia ser ainda maior, uma vez que há maior disponibilidade de matéria-prima nos canaviais. No entanto, cerca de 40 milhões de toneladas de cana deverão ficar em pé em 2009/10, o mesmo volume previsto para este atual ciclo, 2008/09. Se não fosse o atual cenário [de crise financeira global], a produção de cana para 2009/10 superaria os 600 milhões de toneladas, disse.
Das 35 novas unidades previstas para entrar em operação nessa safra, sete adiaram os planos para 2009. Em 2009, havia uma previsão de que 43 novas usinas começariam a moagem. No entanto, de acordo com a Datagro, apenas 25 plantas devem começar suas operações no próximo ano, incluindo as sete unidades que começariam em 2008.
Para 2009/10, a produção de açúcar no Brasil será de 32,9 milhões de toneladas, alta de 8,4% sobre o ciclo anterior. As exportações ficarão em 21,3 milhões de toneladas, aumento de 13,1%. Para o álcool, a oferta nacional está estimada em 27,721 bilhões de litros, aumento de 5,8%. Os embarques deverão recuar 25%, para 3,45 bilhões de litros. A queda tem como reflexo o recuo dos embarques para os Estados Unidos. Os estoques de passagem também deverão se manter apertados ainda na próxima safra, em 262 milhões de litros, suficientes para apenas cinco dias. Os preços do álcool estarão firmes durante a entressafra, afirmou.
O consumo mensal de álcool combustível deverá ultrapassar a marca de 2 bilhões de litros a partir de janeiro do próximo ano.
Levantamento da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica) mostra que até a primeira quinzena de novembro o volume de cana esmagada atingiu 438,45 milhões de toneladas, 10,57% acima do acumulado no mesmo período de 2007. Até o dia 15, 14 usinas já tinham encerrado a safra, ante 47 do mesmo período do ano passado.
As vendas de etanol no mercado interno continuam aquecidas. Entre 1º de abril a 15 de novembro, foram comercializados 12,84 bilhões de litros. As exportações no mesmo período somaram 3,6 bilhões de litros. A Unica mantém a expectativa das exportações da região Centro-Sul em 4,2 bilhões de litros até o fim de março de 2009.
f)
Europa voltará a comprar carne bovina do MS
O Ministério da Agricultura informou que a União Européia oficializou a medida que permitirá ao Mato Grosso do Sul voltar a exportar carne bovina in natura ao bloco. Segundo comunicado do ministério, a partir de 1º de dezembro próximo, bovinos de Mato Grosso do Sul e de todo o Estado de Minas Gerais e Mato Grosso poderão ser abatidos para exportação à UE.
Ainda conforme o ministério, a habilitação dessas áreas pela UE representa aproximadamente 40 milhões de bovinos adicionais que poderão ter como destino o mercado europeu, desde que sejam procedentes de Estabelecimentos Rurais Aprovados no Sisbov (Eras).
Com a medida, pode crescer o número de propriedades certificadas para fornecer animais para exportação de carne in natura para a UE. Hoje são 608 propriedades, localizadas no Espírito Santo, Goiás, Paraná, Rio Grande do Sul, São Paulo, Minas Gerais e Mato Grosso.
A decisão tomada em outubro pela UE habilita as regiões norte e sul do Mato Grosso, 287 municípios mineiros e o Mato Grosso do Sul, com exceção de faixa de vigilância de 15 km no território brasileiro ao longo da fronteira com o Paraguai, segundo o ministério.
Mercosul
a) Cristina anuncia pacote que encarece produto importado
A presidente Cristina Kirchner deve anunciar uma série de medidas para tentar aumentar a competitividade do setor industrial argentino. O pacote de medidas produziria o efeito para a indústria de uma elevação da cotação da moeda americana dos atuais 3,33 pesos para 4 pesos, mas não se trata de uma desvalorização do peso. Com as medidas, o governo pretende acalmar os empresários, que ao longo das últimas quatro semanas insistiram na necessidade de desvalorizar a moeda, de forma a obter mais competitividade, especialmente perante uma suposta e iminente "invasão" de produtos Made in Brazil, um clássico dos pesadelos empresariais argentinos.
Segundo informações extra-oficiais, entre as medidas que a presidente Cristina deve anunciar hoje deve constar a elevação da taxa de estatística (tarifa cobrada aos importadores) dos atuais 0,5% para 3%. Essa proporção tornaria mais caros os produtos brasileiros (e também os de outros países) no mercado argentino.
Além disso, a presidente deve anunciar a eliminação de impostos sobre as exportações agroindustriais, que atualmente chegam a 5%. Cristina também deve anunciar os reembolsos dos impostos indiretos dos 6% aos 12%, além de reduções de alguns custos trabalhistas. Estas medidas foram recomendadas ao governo pela União Industrial Argentina (UIA).
As lideranças da UIA - perante 700 empresários reunidos - insistiram nos apelos à liberação do câmbio, principalmente depois que o Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec) anunciou que o crescimento industrial de outubro foi de apenas 2,5%.
Segundo a UIA, o setor industrial, pressionado pela inflação e o esfriamento do mercado interno, só poderá sobreviver à crise com uma desvalorização. A saída encontrada pelo governo, para evitar uma desvalorização convencional (que poderia gerar uma corrida para o dólar e mais inflação) foi a deste pacote de medidas.
O Ministro da Economia, Carlos Fernández, em discurso no evento da UIA, sustentou que a Argentina "não será afetada pela crise internacional, embora não terá um crescimento tão alto como nos últimos anos". Fernández disse que o governo percebeu a contração da produção industrial e do consumo nas grandes economias mundiais, e que por isso, "está preparando medidas".
O Instituto Nacional de Estatísticas e Censos (Indec) confirmou o pessimismo dos empresários ao anunciar que a indústria somente cresceu 2,5% em outubro em relação ao mesmo mês do ano anterior. Em relação a setembro a queda foi de 1,9%.
Os argentinos estão de olho no Brasil. Os empresários estão preocupados pelos efeitos da crise internacional no maior sócio do Mercosul. Um relatório da consultoria Ecolatina indica que o desaquecimento da economia brasileira poderia provocar uma queda de US$ 3,3 bilhões nas vendas da Argentina para o Brasil. Isso equivale a 27,5% do superávit comercial previsto pelo governo para 2009, de US$ 12 bilhões.
As estimativas indicam que em 2009, o crescimento das exportações para o Brasil seria de apenas 12%. Neste ano, o crescimento estimado é de 35% em relação a 2007.
b) Argentina enfrenta escassez de dólar
Com a queda dos preços das commodities agrícolas em função da crise internacional, a Argentina poderá ter problemas para pagar os US$ 20 bilhões em juros e amortizações de sua dívida que vencem em 2009. Recursos em caixa não faltam. O que falta são dólares, alerta o economista Mario Brodersohn, ex-secretário da Fazenda no governo Raúl Alfonsin.
Sem acesso ao mercado internacional de crédito desde a moratória da dívida, em 2002, a Argentina tem poucas alternativas para adquirir dólares. O comércio e as reservas internacionais são as fontes de divisas mais importantes. As reservas bateram um recorde de US$ 50 bilhões este ano para logo baixarem a US$ 47 bilhões (última posição registrada pelo BC), depois que parte foi usada para segurar a cotação do peso.
Usar este dinheiro que está em casa deixaria o pais vulnerável, diz assessor econômico Raul Ochoa, especialista em comércio internacional e ex-assessor da subsecretaria de Comércio Exterior do Ministério de Economia (1990-1991). Afinal, a conta a pagar consumiria praticamente metade das reservas.
No comércio, uma forte queda dos preços dos principais produtos exportados pela Argentina (soja, milho, trigo) nos últimos meses, se somou a um grande volume de remessas de dólares de pessoas físicas (cerca de US$ 25 bilhões) e dividendos de pessoas jurídicas. O resultado foi que o saldo em conta corrente do país caiu (veja gráficos) e deve cair ainda mais. Segundo uma pesquisa feita pelo BC no mercado, a expectativa é que o saldo em conta corrente da balança de pagamentos vá fechar 2008 em US$ 6,5 bilhões, abaixo dos US$ 7,1 bilhões de 2007, e despencar para US$ 2,7 bilhões em 2009.
Uma alternativa são os depósitos dos argentinos no exterior que o governo pretende atrair de volta através de um programa de incentivos anunciado esta semana. A Casa Rosada sabe que não conseguirá trazer todos os estimados US$ 150 bilhões exilados em bancos nos Estados Unidos e na Europa, mas funcionários disseram à imprensa local que o governo se dará por satisfeito se conseguir atrair uma parte, algo como US$ 10 bilhões a 15 bilhões.
Outra saída para ter acesso a dólares, dizem Ochoa e Brodersohn, seria obter crédito dos organismos multilaterais como FMI, Banco Mundial e Banco Interamericano de Desenvolvimento. Mas para acessar estes recursos, o governo argentino teria que se submeter às auditorias do Fundo, o que os Kirchner se recusam a fazer.
É verdade que esta recusa deixou de ser um dogma este ano depois que o cenário externo mudou e o único país com que a Argentina podia contar para tomar dólares emprestados, a Venezuela, começou a cobrar muito caro pelo dinheiro (15% ao ano no último empréstimo feito em julho).
A presidente Cristina Kirchner tem se esforçado por abrir o caminho para aquelas fontes: já anunciou sua disposição de reabrir as negociações para o pagamento da dívida com o Clube de Paris e com os holdouts, investidores detentores de bônus da dívida argentina que não aceitaram entrar no programa de renegociação de 2005 e agora mantém uma batalha judicial contra o governo argentino nos fóruns internacionais.
Negociar com esses credores é um passo fundamental, dizem os especialistas. Eles crêem que, com essa disposição, a Argentina poderá ganhar a ajuda do novo presidente dos EUA, Barack Obama, para reaproximar-se do FMI de forma politicamente mais palatável.
c) Argentina expõe divisão no Mercosul
O Mercosul está rachado e deixa isso claro à comunidade internacional. A Argentina abriu fogo contra o Brasil e disse que a posição do Itamaraty nas negociações da Organização Mundial do Comércio (OMC) pode ameaçar o Mercosul e causar dano ao bloco. Sozinho, o país apresentou um documento ontem aos 150 países da OMC, no qual diz que não vai aceitar liberalização comercial nem seguirá a recomendação dos líderes mundiais de abrir os mercados por causa da crise.
A posição contrasta com a do Brasil, disposto a fazer cortes mais profundos nas tarifas para produtos industrializados dos países ricos. Na avaliação do Itamaraty, as concessões terão de ser feitas para haver um acordo final. "O Mercosul precisa chegar a uma posição comum", diz o embaixador Nestor Stancanelli, negociador-chefe da Argentina na OMC.
Pelas regras, o Mercosul precisa apresentar uma proposta comum de cortes de tarifas na OMC. Mas o bloco está distante de um entendimento. "Não estamos propondo isso em nome de todos. Mas é o que a Argentina acredita ser o melhor para o Brasil", afirmou Stancanelli.
Diplomatas confirmam que o alerta da Argentina é de que a posição do Itamaraty nas negociações pode pôr em risco a tarifa comum do bloco. "A união aduaneira é prioridade para a Argentina", disse Stancanelli.
Buenos Aires, porém, enviou a nova proposta aos demais países sem um acordo dos membros do Mercosul. No documento, o governo da Argentina pede para "manter certos níveis tarifários e preservar espaço para implementar políticas com a meta de expandir a base produtiva, aumentar empregos e garantir estabilidade social". Segundo o governo argentino, seu déficit na balança comercial não pode continuar crescendo, pois poderia ter "impacto na estabilidade social" do país.
Por isso, os argentinos querem que um acordo final na OMC corte em apenas 42% suas tarifas consolidadas de importação. Também querem proteções para 16% do comércio e 8% ficariam completamente isentas de qualquer liberalização.
Organização Mundial do Comércio (OMC)
a) Rússia e Brasil, juntos também na OMC
A feliz chegada do presidente da Rússia, Dmitri Medvedev, ao Brasil representa oportunidade para maior aproximação entre os dois países. Embora as diferenças sejam maiores do que as semelhanças, ambos têm o desejo de atuar juntos nos grandes desafios que atravessam o mundo.
Os temas tratados serão diversos, da energia nuclear à tecnologia aeroespacial, passando também pelo comércio. Certamente, terão prioridade os esforços da Rússia para acessão à Organização Mundial do Comércio (OMC), bem como os do Brasil de passar a ser membro permanente do Conselho de Segurança da Organização das Nações Unidas.
O Brasil tornou-se, na última década, grande produtor e exportador de carnes bovina, suína e de aves. A Rússia passou ano a ano a importar mais do Brasil, tornando-se importantíssimo cliente do setor nacional. É o maior destino para as carnes bovina e suína - esta última representa cerca de 40% das exportações, o que cria clara dependência daquele mercado. De janeiro a outubro deste ano, as vendas brasileiras de carne suína ao mercado russo totalizaram 203,7 mil toneladas e US$ 676,4 milhões, um declínio de 6,78% em volume em relação a igual período do ano passado.
A Rússia iniciou sua negociação para acessão na OMC há cerca de oito anos. Apresentou, em Genebra, proposta com cotas e tarifas intra e extracotas. Dividiu as cotas entre os países fornecedores daquela época. O Brasil, praticamente ausente, não foi contemplado com um contingente individual, disputando o mercado por meio das cotas designadas para os demais países. Não se trata de reclamar agora que a Rússia não nos teria privilegiado com cotas próprias, pois naquela época não éramos mesmo fornecedores significativos.
Em 2005, por ocasião da viagem do presidente Lula a Moscou, o Brasil apoiou formalmente a entrada da Rússia na OMC. Para a questão do comércio de carnes, que representa mais da metade das exportações brasileiras, ficou o compromisso de a gestão do sistema de cotas garantir a estabilidade do comércio existente entre os dois países.
Em 2005, na proposta da Rússia vinculada à negociação para o seu ingresso na OMC, ao Brasil não era oferecida cota de carne suína, ao contrário da União Européia e do Paraguai, que foram contemplados. Na ocasião, a União Européia-25 recebeu 227,3 mil toneladas; os EUA, 42,2 mil; e o Paraguai, mil toneladas. A cota dos "outros países" era de 179,5 mil toneladas. Com relação à importação efetiva pela Rússia, o que se nota é que o Brasil reduziu suas exportações para aquele mercado a partir de 2005, enquanto a União Européia aumentou seus embarques de tal forma que preencheu sua cota. O Brasil exportou, em 2005, 397,8 mil toneladas de carne suína para a Rússia, volume que caiu para 233 mil toneladas em 2006 e 282,1 mil em 2007.
Os volumes exportados pelo Brasil para o mercado russo resultaram de utilização das cotas da categoria "outros países" e de cotas adicionais redistribuídas, além de extracota.
Em 2005, foi considerado impossível corrigir formalmente a discriminação contra o Brasil, que permaneceria sem cotas próprias. Essa gestão de cotas tem frustrado o Brasil, que viu o volume de comércio se reduzir. Dificuldades criadas por outros países - não o nosso -, que entenderam que a proposta da Rússia era insuficiente, atrasaram sua entrada na OMC.
Agora, a Rússia voltou a negociar os termos de acesso à OMC, criando oportunidade para corrigirmos a discriminação existente. Um sistema de cotas, caso seja mantido, precisa reconhecer a realidade do comércio nos últimos anos, garantindo o espaço que conquistamos. Seria inaceitável a Rússia entrar na OMC, com o apoio do Brasil, cristalizando uma estrutura de cotas discriminatória e que prejudica a nossa competitividade.
Por ser competitivo, o Brasil venderá em 2008 mais de 250 mil toneladas dentro da cota definida para o ano. No acordo pelo qual o Brasil apoiou a entrada da Rússia na OMC, uma das cláusulas deixava claro que, apesar de o País estar na categoria "outros países", seu fluxo de venda de carnes deveria ser mantido. Isso não ocorreu e tem havido queda de participação brasileira nas importações realizadas pela Rússia. A União Européia, em 2005, exportou para o mercado russo 106,7 mil toneladas de carne suína, volume que cresceu para 241,9 mil toneladas em 2006 e 242,3 mil em 2007. Os EUA, que venderam para os russos 29,7 mil toneladas de carne suína em 2005, embarcaram 68,4 mil em 2006 e 75,1 mil em 2007.
Existem diversas maneiras de a Rússia estruturar tarifas e cotas para suas importações de carnes. O Brasil, parceiro da Rússia em tantos projetos, não pode, porém, ser prejudicado justamente na questão do comércio, realidade tão importante no fortalecimento econômico. O pleito é o fim dos privilégios aos nossos principais concorrentes. Caso existam cotas, estas devem ser distribuídas com a regra que no jargão da OMC se chama nação mais favorecida, isto é, sem privilégios.
A liderança comercial brasileira é ainda muito recente. Enfrentamos esta dificuldade em inúmeros mercados que consolidaram suas barreiras comerciais durante a Rodada Uruguai, do Gatt. Somos obrigados a conviver com sistemas de cotas tarifárias que quase sempre ignoram a nossa recente competitividade. Eventual melhora no decorrer da Rodada Doha será pequena, caso algum dia terminem as negociações.
A Rússia, que esperamos entre agora no órgão multilateral de comércio, precisa, ao entrar, não congelar um passado em que o Brasil, muitas vezes, nem sequer aparecia. A aliança Brasil-Rússia é voltada para o futuro. É com esta visão que esperamos que sejam negociadas as futuras regras para o comércio de carne suína.
b) OMC prepara nova reunião em dezembro
Com o aumento da pressão política devido à crise, a OMC (Organização Mundial do Comércio) prepara nova reunião de ministros em dezembro. O objetivo é definir o núcleo de um acordo da Rodada Doha, após sete anos de negociações.
Ainda há, no entanto, muita resistência. Um dos países que não escondem a insatisfação é a Argentina, que hoje apresentará nova proposta na área industrial. Se os argentinos mantiverem a resistência, será uma repetição da falta de sintonia com o Brasil ocorrida na última reunião ministerial, em julho.
O diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, reuniu cerca de 30 embaixadores na sede da entidade, em Genebra, para discutir a possibilidade do encontro em dezembro. A idéia é fortemente apoiada pelo Brasil.
A impressão geral é a de que a reunião acontecerá, embora ninguém aponte progressos desde julho, quando uma maratona de nove dias de negociações terminou em impasse. O processo, porém, ganhou nova dinâmica depois que a cúpula do G20, reunida em Washington, determinou que seja feito esforço renovado para que haja um desfecho até o fim do ano.
Segundo um alto funcionário da OMC, a pressão política é sem precedentes. O impulso para concluir em dezembro as bases de um acordo global de comércio foi reforçado ontem pelos 21 líderes do fórum da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec), no Peru.
No encontro dos embaixadores com Lamy, Alberto Dumont, representante da Argentina, não escondeu seu ceticismo. Para ele, um acordo em dezembro sobre modalidades em agricultura e indústria "é totalmente inalcançável". O país resiste a abrir sua indústria e exige cortes menores nas taxas de importação para protegê-la.
Em julho, quando o Brasil aceitou o pacote de Lamy, uma das possibilidades levantadas para dobrar a resistência da Argentina foi a de uma solução interna do Mercosul. O Brasil poderia até ceder aos argentinos parte de seu direito de proteger setores sensíveis. Agora, o Itamaraty já pensa em ressuscitar a idéia, para tentar salvar Doha -e a paz e a união no Mercosul.
c) Suco leva Brasil à OMC contra Estados Unidos
O governo brasileiro solicitou à Organização Mundial do Comércio (OMC), em Genebra, a abertura de consultas bilaterais com os EUA por causa de medidas antidumping contra a importação de suco de laranja nacional. O pedido, que será analisado sob as regras do mecanismo de solução de controvérsias da OMC, questiona os cálculos usados pelo país para estabelecer a suposta margem de dumping de até 4,81% feita por indústrias brasileiras.
O Brasil argumenta que a revisão administrativa do Departamento de Comércio dos EUA, concluída em agosto, foi inflada por ter excluído do cálculo da margem de dumping as exportações com valor superior à cotação do produto no mercado doméstico (valor normal). Essa forma de cálculo, conhecida como zeroing, impediria que essas operações compensassem as exportações eventualmente realizadas com preços abaixo do valor normal. A revisão incluiu o período de agosto de 2005 a fevereiro de 2007, informou o Ministério das Relações Exteriores.
O embaixador do Brasil na OMC, Roberto Azevedo, afirmou que a indústria de suco e o governo decidiram acionar o mecanismo de solução de controvérsias por duas preocupações. Primeiro, pelo impacto comercial para o Brasil de uma sobretaxa que não deveria existir sobre o produto brasileiro. Depois, pelo que ele classifica de completa inobservância dos EUA com as regras da OMC, com impacto sistêmico.
A suspeita é de que os americanos sabem que agiram de forma ilegal para chegar ao dumping contra o suco brasileiro, admitem que perderão em disputa na OMC, mas arrastam um desfecho até o ultimo momento para implementar as decisões que foram adotadas na OMC sobre o caso. Com isso, sua indústria teria tempo para se beneficiar das protelações, já que a exportação brasileira ficará de algum modo mais cara.
O zeroing é um método para calcular a extensão de dumping usado com frequência pelos EUA, mesmo sob constantes reclamações. Esse mecanismo funciona assim: uma autoridade de investigação dos EUA, usando o zeroing, aplica valor zero para uma transação em que o produto é vendido a US$ 100 no mercado doméstico e exportado a US$ 130. Mas aplica o valor 20 para outra transação na qual o produto é vendido no mercado doméstico por US$ 100 e exportado por US$ 80.
Agregando as transações, as autoridades ignoram o valor real da primeira operação, usando a metodologia de zeroing para calcular margem de dumping de 20%. Infla-se, assim, o cálculo para fixar a margem de dumping e, em consequência, da sobretaxa que será aplicada.
O mecanismo do zeroing já foi muito questionado por empresas da União Européia, Japão e México na OMC. O Japão tem, inclusive, um painel de implementação em que cobra dos EUA alterações no sistema de cálculo da margem de dumping.
Embora questionados, os EUA não alteraram, até aqui, seus procedimentos internos e continuam a fazer uso do zeroing no cálculo das margens de dumping em revisões administrativas. O pedido de consultas compreende, ainda, o questionamento quanto à legalidade das normas americanas que prevêem o uso do mecanismo nessas revisões.
A decisão do Brasil reflete, ainda, a percepção de que, além de incompatível com as normas multilaterais de comércio, o zeroing causa grande incerteza e sérios prejuízos para as empresas exportadoras afetadas, diz o Itamaraty. O órgão de solução de controvérsias já condenou outros casos, mas não houve alterações nas revisões administrativas pelos EUA, apenas nas originais, disse o coordenador-geral de Contenciosos do Itamaraty, Luciano Mazza de Andrade.
d) OMC ratifica derrota da UE em contencioso da banana
A Organização Mundial do Comércio (OMC) afirmou que as tarifas de importação de bananas da União Européia ferem as regras de comércio global, colocando países da América Latina em posição desfavorável em relação às colônias francesas e britânicas.
A decisão do Painel de Controversas da OMC confirma a decisão de abril deste ano e poderá fazer com que os exportadores da fruta latino-americanos peçam ao órgão internacional permissão para aplicar tarifas punitivas sobre produtos europeus, como retaliação.
A ação foi movida pelo Equador, que acusou a UE de provocar prejuízo econômico ao país como resultado da política do bloco que dá condições preferenciais a produtores de banana de ex-colônias da África e do Caribe. A disputa em questão durou mais de 10 anos.
O porta-voz da União Européia, Peter Power, afirmou que o bloco de 27 países aceita a determinação do painel da OMC e que procurará resolver a disputa das bananas de uma vez por todas, na ocasião da nova rodada de liberalização comercial de Doha, no próximo mês.
O Ministério das Relações Exteriores equatoriano informou que não aceitará qualquer acordo agrícola nas negociações internacionais de Doha se os europeus não resolverem a disputa até lá - e com uma solução de longo prazo. Nosso país não aceitará nenhum consenso para a agricultura se o caso da banana não estiver resolvido até lá, informou a chancelaria.
Plano Internacional
a) Brasil e Equador enfrentam crise diplomática inédita
A decisão do governo equatoriano de recorrer à Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional, com o objetivo de suspender o pagamento de uma dívida de US$ 243 milhões junto ao BNDES, criou incidente diplomático grave e inédito nas relações entre o Brasil e o Equador. Na sexta-feira, o chanceler Celso Amorim, numa demonstração clara da intensidade do problema, chamou o embaixador brasileiro naquele país, Antonino Marques Porto, de volta a Brasília.
O que mais surpreendeu o Ministério das Relações Exteriores foi o fato de o governo equatoriano ter anunciado a decisão num evento público, em Quito. O presidente Rafael Correa não tomou sequer o cuidado de informar previamente Brasília. O governo brasileiro considera que a natureza e a forma de adoção das medidas tomadas pelo governo equatoriano não se coadunam com o espírito de diálogo, de amizade e de cooperação que caracteriza as relações entre o Brasil e o Equador, criticou o Itamaraty em nota oficial.
Em entrevista ao jornal Folha de S. Paulo, Jorge Glass, porta-voz do governo do Equador para assuntos relacionados à dívida externa, disse que Quito estuda a possibilidade de suspender o pagamento da dívida, ou seja, antes mesmo de uma decisão da corte internacional. O governo quer anular o contrato de crédito alegando violações legais e constitucionais, informou Glass, deixando claro que Rafael Correa não preza o diálogo com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Os problemas com o Equador começaram em junho passado, quando a hidrelétrica de San Francisco, responsável por 12% do fornecimento de energia do país, parou de funcionar graças ao desabamento de parte do túnel de distribuição de água e ao desgaste de turbinas. O governo equatoriano responsabilizou a construtora Odebrecht pelo problema. A empresa brasileira atribuiu o acidente à erupção de um vulcão na região, mas concordou em fazer os reparos para que a usina voltasse a funcionar. Demonstrando que estava disposto a explorar politicamente o episódio, o presidente Rafael Correa expulsou a Odebrecht do país e cancelou quatro projetos que vinham sendo tocados pela empreiteira. No mesmo ato, expulsou também a estatal Furnas, encarregada da fiscalização da obra.
No início dos incidentes, Brasília contemporizou por acreditar que se tratava de um problema entre o governo equatoriano e uma empresa privada brasileira, criado na circunstância de atuação voltada para o público interno. Depois, percebeu que Correa, a exemplo do que fez o presidente da Bolívia, Evo Morales, em relação aos investimentos da Petrobras naquele país, não estava disposto a dialogar. Num ato de represália à animosidade perpetrada pelo líder equatoriano, o governo Lula cancelou a missão que negociaria a participação brasileira em projetos de infra-estrutura no Equador. Entre as obras previstas estava a construção da rodovia que ligaria Manaus ao porto de Manta, no Pacífico.
Autoridades equatorianas tentaram vender a idéia de que não há razão para crise diplomática. Afinal, alegam, trata-se de um tema puramente jurídico. A diplomacia brasileira, depois de um início hesitante, não concorda com isso. Há razões objetivas para aumentar o tom nessa disputa. Um possível calote do Equador rebaterá no Tesouro, via fundo garantidor para operações de exportação, e não no mecanismo conhecido por Convênio de Pagamentos de Créditos Recíprocos. O CCR é uma câmara de compensação criada no âmbito da Associação Latino Americana de Integração (Aladi). Ele existe para que os bancos centrais realizem, a cada quatro meses, a compensação de créditos e débitos entre os países signatários. Não se trata, portanto, de um seguro anticalote. Se o Equador não honrar o que deve ao BNDES, o banco acionará o fundo garantidor do Tesouro e o prejuízo, portanto, será do contribuinte brasileiro.
O episódio prova que o Brasil corre riscos ao estreitar laços com os governos populistas da América do Sul. As agressões do Equador atingem em cheio a política externa do governo Lula para a região, na medida em que fragilizam justamente o principal instrumento dessa política, que é o uso do BNDES para financiar obras de infra-estrutura nos países vizinhos.
b) Brasil faz acordo de defesa com a Rússia
Sem alarde, o Brasil fechou o contrato de compra de 12 helicópteros de ataque MI-35 fabricados pela Rússia, a um custo estimado em cerca de US$ 300 milhões. A compra põe fim a uma negociação de quase dois anos, equipará as Forças Armadas com verdadeiros tanques blindados aéreos que se destinarão à vigilância da Amazônia e é um exemplo do que não prevê o acordo de cooperação em matéria de defesa que os dois governos também assinarão durante a visita do presidente russo ao Brasil, Dmitri Medvedev, nesta semana. O governo quer mais, quer fabricar armamentos com a Rússia.
E não só com a Rússia. Em dezembro, chega ao país o presidente da França, Nicolas Sarkozy, com quem também será assinado acordo de cooperação em matéria de defesa. Como informou ao Valor o ministro de Assuntos Estratégicos, Roberto Mangabeira Unger, as negociações com os franceses estão até mais avançadas do que as com os russos.
Sarkozy entendeu que o Brasil não quer acordos de compra e venda de mercadorias, mas de aliança para fabricação de armamentos e pesquisas tecnológicas. A Marinha brasileira discute com os franceses planos conjuntos na construção de submarinos, e o Exército negocia projetos de cooperação para tecnologias do chamado combatente do futuro das tropas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan), com uso de sofisticados sistemas de informática e posicionamento por satélite para auxiliar o deslocamento, identificação e mobilização de soldados em campo de batalha.
A compra dos helicópteros russos é considerada, no governo, um negócio atípico e excepcional em relação ao que se pretende com a nova estratégia de alianças no setor de defesa. Os brasileiros negociaram a instalação de centros completos de manutenção para os novos helicópteros, para evitar os problemas já identificados na vizinha Venezuela, onde o abastecimento de peças depende de estoques limitados e encomendas a Moscou. Mas a compra é uma operação estritamente comercial, sem o chamado offset, compensações comerciais concedidas pelo fornecedor de equipamentos.
O objetivo declarado das conversas com Paris e Moscou - explicitado por Mangabeira Unger em recente ronda pela Europa - é evitar a excessiva dependência de fornecedores de alguma parte do globo e buscar aproveitar a reestruturação das Forças Armadas para incentivar o desenvolvimento tecnológico do setor de armamentos no país. Essa foi a razão, segundo explicou o governo brasileiro ao russo, pela qual os jatos Sukhoi foram excluídos da licitação para o projeto FX de compra de novos jatos para a Força Aérea Brasileira. Os russos foram os únicos a não oferecer transferência de tecnologia no pacote de venda.
Além do anúncio da compra dos helicópteros, está prevista para a visita de Medvedev a assinatura de um dos três acordos que pautarão a cooperação dos dois países em matéria de defesa. Em agosto já havia sido assinado outro, pelo gabinete de Segurança Institucional da Presidência, do ministro general Jorge Félix, com a ex-KGB russa, de proteção de informações confidenciais. O acordo desta semana é de cooperação técnico-militar e prevê troca e intercâmbio de pessoal, aquisição de equipamentos, transferência de tecnologia e até co-produção.
Há um terceiro acordo em fase de finalização, sobre propriedade intelectual. As autoridades brasileiras esperam que o acordo permita às indústrias dos dois países conhecer melhor o que é produzido e comercializado nos dois mercados, abrindo caminho para que as empresas brasileiras façam contatos e encontrem oportunidades de negócios com os russos. Não é fácil, a Rússia, especialmente na esfera militar, ainda tem a arrogância de grande potência, mas há forte interesse da indústria bélica brasileira, em campos como a fabricação de blindados, por exemplo.
Toda essa movimentação é vista com mau humor por tradicionais exportadores brasileiros, como os de carne, que lamentam a falta de resultados do governo brasileiro nos esforços para abrir ao Brasil maior espaço nas cotas de importação russas, grande parte delas reservadas a exportadores europeus e americanos. Na semana passada reuniu-se em Brasília a comissão intergovernamental Brasil-Rússia de cooperação econômica, comercial, científica e tecnológica, em preparação à visita de Medvedev. E a discussão sobre agricultura levou apenas a queixas da parte brasileira pela falta de empenho dos russos em avançar no tema de cooperação agrícola.
A visita de Medvedev será acompanhada dos anúncios pomposos dessas ocasiões, como a meta de elevar o comércio bilateral dos US$ 5 bilhões de 2007 para US$ 10 bilhões em 2010. Mas a crise financeira mundial, que chegou pesadamente à Rússia, obscurece as perspectivas comerciais com o país - a queda nos preços do petróleo já fez Medvedev adiar anúncios de investimentos que faria nesta semana, na Venezuela, e praticamente concentrou as expectativas nos negócios do campo militar.
As reservas internacionais da Rússia, de quase US$ 600 bilhões em agosto, caíram para pouco mais de US$ 450 bilhões e continuam caindo no ritmo de mais de US$ 20 bilhões por semana, o crédito secou, começaram as demissões nos setor automotivo e o governo já anunciou pacotes bilionários de salvamento, como no Ocidente. Tudo isso reduz a atratividade da cooperação econômica com o país, mas não afetou, até agora, os planos em matéria de defesa.
As autoridades brasileiras dizem considerar normal a aproximação entre Rússia e Venezuela, que farão exercícios militares juntos, no Caribe, nesta semana. Enquanto Chávez apresenta a aliança como uma resposta ao Império americano, os próprios russos minimizam essa volta às Américas, que insistem em classificar como um ressurgimento do interesse puramente econômico na região. Combinado com a decisão dos países sul-americanos de, pela primeira vez, estabelecerem um Conselho de Defesa que exclui a grande potência ao Norte, esse movimento tem, porém, forte implicações geopolíticas. Mesmo que os presidentes Lula e Medvedev digam o contrário.
c) Líderes apostam no comércio
Reunidos no Peru, os líderes das 21 economias que formam o Fórum da Cooperação Econômica da Ásia-Pacífico (Apec) firmaram posição conjunta contra a crise financeira internacional. O grupo, responsável por quase 60% do Produto Interno Bruto (PIB) do mundo, apontou como vital a necessidade de recapitalizar e fortalecer as instituições financeiras. Para a Apec, as grandes potências e os países emergentes devem evitar ao máximo a adoção de políticas protecionistas e retomar o quanto antes as negociações a fim de finalizar a Rodada de Doha para o destravamento do comércio.
O presidente peruano, Alan García, anfitrião da cúpula encerrada afirmou que a Apec trabalhará para integrar mais nações ao fórum. Já o presidente do México, Felipe Calderón, disse que o futuro do sistema financeiro global dependerá da forma como o novo presidente dos Estados Unidos vai assumir sua liderança. Na declaração final da cúpula, o representantes de Austrália, Brunei, Canadá, Coréia do Sul, Chile, China, Estados Unidos, Filipinas, Hong Kong, Indonésia, Japão, Malásia, México, Nova Zelândia, Papua Nova Guiné, Peru, Rússia, Cingapura, Tailândia, Taiwan e Vietnã concordaram que é preciso agir “com rapidez e decisão? para reverter a desaceleração da economia mundial. Em outro comunicado, emitido à parte, a Apec informou que as turbulências nos mercados poderão ser superadas em 18 meses.
Todos os chefes de Estado, incluído o presidente dos Estados Unidos, George W. Bush, foram unânimes em afirmar que o atual momento é “um dos mais sérios desafios econômicos? já enfrentados. O encontro da Apec serviu para que as lideranças endossassem as declarações feitas neste mês pelo G-20, em Washington, nos Estados Unidos. Vestindo um poncho marrom, o presidente americano cobrou dos líderes presentes ao encontro trabalho coordenado para resolver a crise e pediu que ricos e pobres rechacem toda forma de protecionismo. “Uma das lições mais duráveis da Grande Depressão é que o protecionismo é a senha para a ruína econômica?, disse Bush.
Aproveitando o clima de cooperação, Bush e García reafirmaram o compromisso de iniciar a implementação do tratado de livre-comércio entre EUA e Peru, a partir de janeiro de 2009. “Os negociadores, tanto do lado americano quanto do peruano, têm uma firme decisão da parte de seus presidentes de terminar o processo para começar a implementar o tratado?, reforçou o secretário-adjunto para Assuntos do Hemisfério Ocidental do governo dos EUA, Thomas Shannon. Peru e EUA firmaram o acordo de livre-comércio em 2006 e o Congresso americano ratificou o pacto em dezembro do ano passado.
d) Banco Mundial reduz previsão para PIB chinês
O Banco Mundial reduziu sua previsão de crescimento para a China no próximo ano de 9,2% para 7,5%, por causa do impacto da crise global e da desaceleração da economia provocada por fatores domésticos. Se confirmado, será o menor índice de expansão do país em 18 anos.
A última vez que a China cresceu abaixo de 7,5% foi em 1990, sob o impacto da repressão aos protestos de estudantes na Praça da Paz Celestial em 1989, quando o processo de reforma foi interrompido e os investimentos estrangeiros no país suspensos. Naquele ano, a expansão do PIB foi de 3,8%.
"As recessões coordenadas nos Estados Unidos, Europa e Japão criam um cenário muito difícil para as economias emergentes, mas a China vai conseguir manter um crescimento saudável em 2009 graças ao pacote de estímulo anunciado pelo governo", disse ontem o diretor e chefe da missão do Banco Mundial na China, David Dollar, ao divulgar a revisão quadrimestral da entidade para o país. A previsão de aumento do PIB chinês em 2008 passou de 9,8% para 9,4%.
Apesar de classificar a expansão como "saudável", Dollar ressaltou que o menor ritmo de crescimento terá impacto direto sobre capacidade do país de criar empregos em 2009, um dos elementos centrais na obsessão dos dirigentes de Pequim com a estabilidade social.
O Banco Mundial não faz estimativas sobre cifras de desemprego na China, mas o economista-chefe da entidade, Louis Kuijs, previu queda na criação de empregos urbanos no próximo ano em relação a 2008. Dollar observou ainda que pode haver "alguns problemas" sociais no campo caso um grande número de migrantes comece a retornar a suas vilas por não encontrar emprego nas cidades.
A China tem cerca de 150 milhões de migrantes rurais, que deixaram de cultivar a terra nas últimas décadas para trabalhar na construção civil e nas indústrias do sul do país, de têxteis, calçados e brinquedos, que sofrem com a retração do mercado internacional.
O pacote de estímulo de US$ 586 bilhões anunciado em 9 de novembro será crucial para garantir a expansão em 7,5% no próximo ano, mas a crise internacional terá forte impacto negativo sobre a economia do país no primeiro semestre, avalia Kuijs.
Se a situação global se estabilizar, as coisas começarão a melhorar na China a partir da metade do ano, quando o pacote começará a produzir efeitos. O Banco Mundial espera que os gastos do governo respondam por 4 pontos porcentuais do crescimento do PIB no próximo ano, o que será 1,5 ponto porcentual acima da contribuição em 2007.
Com expansão doméstica e retração mundial, as importações chinesas deverão crescer 6,5% em 2009, acima dos 3,5% previstos para as exportações. Apesar disso, a China continuará a ter superávits comerciais por causa da queda nos preços das commodities. A previsão da entidade é que o resultado das transações da China com o restante do mundo passe de US$ 386 bilhões para US$ 427 bilhões. Mesmo com o aumento em números absolutos, o superávit em conta corrente vai cair de 9,3% para 8,9% do PIB.
e) Contra déficit, Equador taxa 940 itens importados
O governo do Equador vai elevar tarifas de importação de 940 produtos, numa tentativa de reduzir o déficit na balança comercial e estimular a produção da indústria local. Entre os itens estão materiais de construção, matérias-primas para a indústria e para a agricultura e equipamentos para o setor de transportes, disseram ontem jornais equatorianos. Celulares e alguns alimentos também terão suas tarifas agravadas. No geral, os reajustes serão de 5% a 20%.
A preocupação seria muito mais com bens de consumo, cujas importações aumentaram quase 40% entre janeiro e setembro. Do total das importações do Equador no período - US$ 12,7 bilhões - 21,5% foram em bens de consumo.
A decisão da elevar as taxas - que passam a atingir no teto estipulado pela Organização Mundial do Comércio - é do Conselho de Comércio Exterior e Investimentos (Comexi). O órgão disse que a resolução detalhando as mudanças deve ser publicada no início da próxima semana. Ontem, porém, a imprensa equatoriana já publicava o que seria a lista dos produtos. Somente este ano, o governo já aumentou pelo menos duas vezes tarifas de importação.
A medida deve incidir sobre alguns itens importados do Brasil. Telefones celulares, por exemplo, deixa de ser isento de passará a ter uma tarifa de 15%, segundo lista publicada pelo jornal El Comercio. Lâminas de aço, outro item exportado pelo Brasil, passará a ter tarifa de 30%, ante os 25% atuais.
Entre janeiro e outubro deste ano, o Brasil exportou US$ 707,7 bilhões para o país e importou meros US$ 36,9 bilhões, segundo dados do Ministério de Desenvolvimento Indústria e Comércio.
O Equador também tem um déficit elevado com a Colômbia, de US$ 651,9 milhões. Mas diferentemente do Brasil, os colombianos exportam muitos bens de consumo, que, em tese, poderiam ser substituídos por equatorianos. Quito espera arrecadar mais US$ 85,5 milhões com as novas tarifas.
O Equador tem um saldo positivo na balança comercial de US$ 2,7 bilhões. Mas se não incluir as exportações de petróleo - que representam algo em torno de 70% da receita de exportação - o país tem um déficit de US$ 5,2 bilhões.
Mas as novas tarifas poderão levar empresários a procurar outros países com quem o Equador tem tratados comerciais em vez de buscar fornecedores locais. Outro risco aparente é o do encarecimento dos produtos no país.