Comércio Exterior
a) Resultados
A tímida recuperação nas exportações de produtos manufaturados em setembro, comparado com agosto, foi superada pelo forte aumento das importações no mês passado, o que levou o resultado do comércio exterior, no mês, a ser um dos piores do ano, um superávit de apenas US$ 1,33 bilhão, melhor apenas que o déficit de US$ 529 milhões em janeiro.
Um fator pontual, o desembarque de compras de petróleo, explica grande parte desse aumento de importações. Mas houve também grande importação de máquinas e equipamentos e de insumos industriais, reflexo de aumento na produção e investimentos no país.
O aumento na importação de bens de capital (máquinas e equipamentos industriais) é um bom sinal, comemorou o secretário de comércio exterior, Welber Barral. Ele reconheceu, porém, que o aumento nas compras de matérias-primas e outros insumos para a indústria é estimulado pela queda na cotação do dólar.
O mau desempenho de setembro levou o Ministério do Desenvolvimento a abandonar a meta de US$ 160 milhões neste ano, e a nova meta deverá ficar próxima a US$ 158 milhões, informou o secretário.
Para o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi), o resultado de setembro, quando comparado pela média diária de importações e exportações, é quase metade do registrado em agosto, e mostra que é generalizado o aumento nas importações, sinal de recuperação na economia, mas também de impacto do dólar desvalorizado, que se manifesta primeiro nas importações e só depois passa a prejudicar as vendas externas do país.
As importações de petróleo em setembro deram um salto em relação a agosto, de 78,5%, ou quase US$ 700 milhões. O aumento nas compras de bens de capital passou de 20% (US$ 467 milhões) e o de matérias-primas e bens intermediários chegou a 8%, ou US$ 444 milhões. Mas as compras de bens de consumo, sensíveis ao maior poder aquisitivo do real, subiram acima de 14%, quase US$ 260 milhões, principalmente nas compras de bens duráveis como automóveis e eletrodomésticos.
O que pesou mais sobre as importações foi o petróleo, só por uma questão de programação de embarques, comentou Barral, para quem as compras de combustível responderam, sozinhas, por 30% do aumento das importações.
Em comparação com setembro de 2008, é generalizada a queda nas exportações e importações. Ele preferiu chamar atenção para o fato de que o resultado das exportações, em setembro, foi o melhor do ano, com aumento puxado pelas vendas de bens industrializados.
Com o crescimento em relação a agosto nas exportações de produtos como aviões (75,6%), laminados planos (69,5%) e veículos de carga (47%), além de celulares (32%), os produtos manufaturados voltaram a ser maioria na pauta de exportações, invertendo a situação de agosto, quando, pela primeira vez em três décadas, os produtos básicos, como soja e minério de ferro ocuparam a maior fatia nas vendas externas brasileiras.
O aumento das vendas de manufaturados está relacionado à mudança na economia internacional, com a recuperação de mercados importantes para o Brasil, como a Argentina e outros países latino-americanos. Embora, ao serem comparadas com o resultado de setembro de 2008, as exportações apresentem queda para todos os mercados importantes, à exceção da China (que aumentou em 8,6% as compras do Brasil), o país conseguiu aumentar ligeiramente as vendas ao Mercosul (1,6%), principalmente para a Argentina, que importou, em média, por dia útil, quase 3% a mais em setembro que em agosto.
As vendas de produtos básicos caíram fortemente, quase 10% em comparação com agosto, índice influenciado pelo fim da safra da soja (com ajuste sazonal, a queda ficou em quase 6%, segundo cálculos do Iedi). Comparada às vendas de setembro de 2008, a queda foi de 22%. O recuo total das exportações em setembro foi de 27,4% em comparação ao mesmo mês do ano passado, mas, em relação a agosto, houve um pequeno aumento, de 0,3%.
O saldo positivo no comércio exterior, de janeiro a setembro, já soma US$ 21,3 bilhões, o que leva analistas, como os economistas do Iedi, a prever que, neste ano, o saldo da balança comercial poderá ficar acima dos 24,8 bilhões do ano passado, caso o resultado mantenha o ritmo médio do ano, compensando a queda brutal de setembro. A previsão das instituições financeiras consultadas pelo Banco Central é de US$ 25,3 bilhões. Em 12 meses, o saldo acumulado é de US$ 26,5 bilhões.
Barral comentou que a valorização do real em relação ao dólar não é o principal problema enfrentado pelos exportadores, que são desestimulados com a demora dos secretários da Fazenda estaduais em devolver os impostos recolhidos indevidamente nos insumos das mercadorias fabricadas. É preciso diminuir os custos de transação no Brasil, cobrou o secretário de comércio exterior, que anunciou o lançamento, neste mês, de um sistema simplificado de registro para exportadores de pequeno e médio porte interessados em se beneficiar do regime de drawback verde-amarelo, pelo qual se isentam dos impostos federais cobrados nas mercadorias usadas como insumo para exportação.
Neste ano, de janeiro a setembro, a China confirmou seu papel como principal apoio do comércio exterior brasileiro, com um aumento de 19% nas compras de produtos brasileiros, em média, por dia útil. A maior queda nas vendas, entre os principais mercados, ocorreu nas exportações para os Estados Unidos, país com quem o Brasil passou a ter um déficit comercial, que já soma quase US$ 3,5 bilhões.
b) Capital externo deve cobrir déficit maior em conta corrente
O crescimento maior do PIB esperado para o próximo ano combinado com elevação dos investimentos estrangeiros e aceleração das importações deve ampliar o déficit em transações correntes do Brasil. Neste ano, segundo projeções do Banco Central, o saldo em conta corrente deve ser negativo em US$ 18 bilhões, o equivalente a 1,2% do Produto Interno Bruto (PIB), mas, para 2010, as projeções dos analistas convergem para uma taxa maior, da ordem de 2% do PIB. A elevação do déficit, no entanto, não preocupa.
Para os analistas, a entrada de capital estrangeiro compensará com folga o déficit em conta corrente. Se pegarmos apenas a entrada de investimento direto, não é irrealista supor que o déficit será facilmente financiado, afirma Maurício Molan, economista do Santander. O banco prevê que os aportes de Investimento Estrangeiro Direto (IED) alcançarão US$ 25 bilhões neste ano, US$ 7 bilhões a mais que os US$ 18 bilhões de déficit em conta corrente esperados pelo BC.
Segundo Molan, a taxa de investimentos estrangeiros, alocados em projetos produtivos, será ainda maior no próximo ano - o BC calcula elevação de 52% do IED em 2010. Ou seja, o capital externo será capaz de cobrir o rombo nas transações correntes, mesmo que ele aumente.
As outras entradas de capital estrangeiro servirão para rolar dívidas que estão vencendo ou para engordar as reservas constituídas pelo BC, que devem continuar crescendo no ano que vem, explica Molan. Os capitais que entram na conta financeira não terão como contrapartida um aumento da relação dívida/PIB, que deve apenas parar de diminuir, analisa.
Os investimentos financeiros, embora mais voláteis que os produtivos, registraram valores expressivos em julho e agosto. Isso reflete uma posição privilegiada do Brasil no cenário externo, demonstrando que o país crescerá a taxas mais elevadas que a média mundial, afirma Fernanda Feil, analista da Rosenberg & Associados. A entrada de dólares na conta de capital e financeira foi, apenas em agosto, de US$ 8,3 bilhões, sendo US$ 6,1 bilhões em ações e títulos públicos.
Para José Francisco de Lima Gonçalves, economista-chefe do banco Fator, o diferencial entre as taxas de juros internacionais e a taxa básica brasileira ainda é importante para atrair dólares. Enquanto for um diferencial absurdo, a Selic continuará relevante para o aplicador estrangeiro , diz.
O diferencial de juros ainda é grande, mas a Selic não tem mais aquele papel fundamental que tinha até dois anos atrás , analisa Fernanda. Para ela, mesmo os gastos anticíclicos promovidos pelo Estado para atenuar os efeitos da crise mundial estão sendo bem percebidos pelo mercado.
A balança comercial deve registrar resultado robusto neste ano, semelhante ao verificado no ano passado, o que, diante das circunstâncias excepcionais, é um ótimo resultado, afirma a economista. A comparação com 2008, no entanto, deixa transparecer queda na corrente de comércio produzida pelas turbulências mundiais.
Segundo dados do Santander, as importações mundiais caíram cerca de 35% no primeiro trimestre de 2009 sobre a média de 2008. Houve recuperação de 15% nos últimos seis meses, período em que o Brasil oscilou conforme a média mundial. As exportações tiveram queda semelhante, no Brasil e no mundo, nos primeiros meses de 2009, mas, enquanto a média mundial se recupera lentamente, o Brasil acelerou suas vendas ao exterior - 38% entre abril e agosto.
Na China, as importações aumentaram 48% após o tombo promovido pela crise. O Brasil se beneficiou desse movimento chinês, exportando mais para aquele mercado. As exportações brasileiras, no entanto, ficaram mais concentradas em commodities, canalizadas pela demanda chinesa.
É natural que assim seja. A China é o país que mais cresce no mundo e, assim, aumenta as importações de produtos brasileiros. Como os chineses demandam muito bens primários, é evidente que nossas exportações fiquem mais concentradas em commodities, explica o economista Marcio Garcia, professor da PUC-Rio.
O PIB deve crescer a taxas elevadas no próximo ano, sustentado pela crescente demanda interna que, por sua vez, aumentará o volume de importações e despesas como aluguel de máquinas, viagens internacionais e remessas de lucros de companhias multinacionais. Logo, a ampliação do déficit externo será consequência da retomada do crescimento. Por isso, para boa parte dos analistas, a elevação do déficit não assusta.
A tendência é aumentar as importações, não tem como escapar. O aumento está dado. Se o PIB cresce 5%, as importações vão crescer pelo menos três vezes esse valor, afirma Gonçalves, do Fator. O economista prevê um aumento da dívida privada em dólar, com elevação dos empréstimos internacionais e da participação acionária de estrangeiros em companhias nacionais. O setor privado vai ficar mais exposto, mas o governo continua ampliando o acúmulo de reservas, então não há problema de pagamentos.
Para Garcia, não há problema para o financiamento do déficit em conta corrente, embora fosse mais recomendável recorrer aos investimentos nacionais. Se pudéssemos crescer com poupança interna seria melhor, mas aparentemente nós não gostamos de poupar e o governo não está ajudando. Sem dúvida que é preferível crescer com poupança interna, mas se não podemos e a opção é não crescer, é mais lógico ficar com a poupança externa, afirma.
O aumento de investimentos estrangeiros deve compensar a ausência de uma taxa maior de investimento público, avalia o economista. Com todos esses projetos que se prenunciam, como o pré-sal, e uma taxa pequena de investimento público, é natural que a poupança externa aumente sua participação. O déficit de 2% do PIB na conta corrente deve ser ainda maior para poder sustentar a demanda de projetos, diz Garcia.
c) Renasce lobby contra insumo importado
As indústrias de fertilizantes com operações no Brasil solicitaram ao Ministério do Desenvolvimento a reabertura do processo antidumping contra as importações de nitrato de amônio originárias da Rússia e da Ucrânia.
Em novembro de 2008, os sete ministros da Câmara de Comércio Exterior (Camex) aprovaram a imposição de tarifas entre 2,4% e 36,3% sobre essa matéria-prima usada em fertilizantes, dependendo da companhia e do país de origem. Mas a decisão foi imediatamente suspensa em nome do interesse nacional, já que os preços dos fertilizantes haviam dobrado de preço em alguns casos. Para evitar impactos adicionais sobre os custos de produção da safra agrícola, o governo optou por rever a medida após um ano da recomendação positiva do Departamento de Defesa Comercial do MDIC.
A Fosfertil, maior fornecedora local de matérias-primas para fertilizantes fosfatados e nitrogenados, confirmou ao Valor a consulta formal feita ao MDIC pela reavaliação da imposição do direito antidumping, que impediria a importação a preços inferiores aos custos de produção nos países de origem.
Nos bastidores, fontes do governo informam que a Fosfertil já apresentou novos documentos para tentar provar o chamado nexo causal entre o dumping e os danos às indústrias locais. O governo avalia que um eventual direito antidumping provisório poderia ser adotado em até seis meses, já que o processo anterior garantiria instrução mais célere.
Em 2008, o Brasil importou 585,6 mil toneladas ao custo de US$ 244,3 milhões da Rússia e da Ucrânia. Neste ano, até agosto, foram gastos US$ 43,2 milhões para adquirir 242,1 mil toneladas dos dois fornecedores.
Parte do governo é contra a iniciativa da Fosfertil por entender que a medida elevaria os preços ao produtor e, por tabela, colocaria em risco as metas de inflação. Os preços dos fertilizantes caíram e os custos de produção baixaram nesta safra. Não é hora de colocar pressão sobre os produtores porque, em 2010, podem haver reflexos macroeconômicos severos, afirma uma fonte.
O governo entende haver um monopólio no Brasil que deve ser combatido com redução tarifária. As empresas defendem a tarifa alegando a existência de um cartel internacional de produtores da matéria-prima, o que deixa o país vulnerável a elevações de preços.
O direito antidumping contra o nitrato começou a ser aplicado em novembro de 2002, a pedido da Fosfertil. À época, o governo aprovou tarifa de 32,1% para importações da Rússia e de 19% a produtos da Ucrânia. Em junho de 2005, em um processo de revisão de meio-termo, a empresa russa Eurochem conseguiu isenção da sobretaxa.
Em novembro de 2007, quando venceria a tarifa original, a Fosfertil pediu a prorrogação do antidumping. Teria, assim, mais um ano até a decisão final do governo sobre o pedido. Mas, por forte pressão do Ministério da Agricultura, o governo decidiu reduzir o antidumping até novembro de 2008. As empresas da Rússia passaram a pagar, desde dezembro de 2007, tarifa de 13,3% e as ucranianas, 6,9%.
Essa nova revisão do direito antidumping deve ser mais restrita para o governo. Fontes do setor informam que será difícil emplacar a suposição de que haveria dano causado pelo dumping.
É difícil provar que, se encerrasse o processo sem aplicação do direito, voltaria o dumping e causaria um dano á indústria daqui, diz uma fonte. Agora, ao contrário do ano passado, os dados devem mostrar concretamente ter havido importação, mas restará ao governo analisar se houve prejuízo.
Para isso, serão usados elementos de preços do mercado russo e ucraniano que serão comparados às vendas ao Brasil. Esse cotejo também deve levar em consideração o desempenho da indústria doméstica. Ou seja, ficará mais difícil supor que a retirada do antidumping provocaria um dano, porque há mais dados concretos para essa comparação. Além disso, essas compras ficaram quase um ano sob licenciamento não-automático, administrado pelo MDIC.
d) Multinacionais transferem fábricas do exterior para o Brasil
A crise global provocou um movimento de transferência de linhas de produção ou até de fábricas inteiras do exterior para o Brasil. Cerca de 50 empresas solicitaram ao governo autorização para trazer suas máquinas para o País, revela o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e comércio exterior.
Os pedidos de importação foram feitos por diversos setores como alimentos, têxtil, químico, móveis e mineração. A origem das linhas de produção também é variada: Estados Unidos, Canadá, França, Portugal, Alemanha, Reino Unido. Boa parte das solicitações veio dos fabricantes de autopeças - setor em que o desempenho do mercado brasileiro está muito melhor que o resto do mundo.
É a discrepância entre o Brasil, que já saiu da crise, e os países ricos que provoca as transferências. Com a queda da demanda nos EUA e na Europa, as multinacionais ficaram com capacidade ociosa lá fora. A crise também provocou uma quebradeira de empresas, criando oportunidades para companhias brasileiras comprarem máquinas usadas no exterior por uma fração do preço das novas.
A Coteminas realizou uma das maiores transferências de máquinas do exterior para o País. Depois de adquirir a americana Springs, a empresa, que pertence à família do vice-presidente José de Alencar, desativou nove fábricas nos Estados Unidos. As máquinas foram distribuídas pelas unidades de Minas Gerais, Santa Catarina, Paraná e Rio Grande do Norte.
É melhor produzir aqui e exportar para os EUA. E, com a crise, parte da produção que ia para os clientes americanos agora fica no Brasil, disse o vice-presidente industrial da Coteminas, Pedro Bastos. Entre as vantagens de trazer a produção para o País, estão a qualidade do algodão, o menor custo da mão de obra, e a proximidade com o grupo controlador. Ele conta que a crise tornou as transferências mais complicadas, porque significou perda de empregos para os americanos.
A lista de empresas que estão apostando no Brasil incluiu multinacionais como Nestlé e Motorola. A fabricante de celulares importou da unidade do México a tecnologia para fabricar em Jaguariúna (SP) equipamentos para banda larga sem fio. A produção começou em junho. De acordo com o vice-presidente da área de mobilidade, Eduardo Stefano, os incentivos fiscais e os altos custos de importação foram as razões para produzir localmente. Ele afirmou ainda que o Brasil é carente em tecnologia de banda larga.
A Nestlé trouxe do México uma linha completa para fabricação e envase de água mineral. O maquinário inclui desde a sopradora de garrafas até a empacotadora. A linha desembarcou no Brasil em julho e já está em operação. Com a ajuda das novas máquinas, a multinacional lançou no País a marca de água Nestlé Pureza Vital - a mais vendida do mundo. O objetivo é buscar a liderança no mercado de água mineral paulista, o maior do País com 30% das vendas.
Segundo o secretário de comércio exterior, Welber Barral, as empresas decidem as transferências de plantas cada vez mais rápido e o Brasil se tornou o alvo pelo bom desempenho na crise. Ele disse que o governo quer tornar ágil a entrada das linhas de produção no País. Como se tratam de máquinas usadas, o procedimento requer licenças de importação, que demoram de quatro a seis meses para serem liberadas. Queremos fazer em 30 dias.
A importação de fábricas é polêmica. O investimento é sempre bem-vindo, porque aumenta a produção e cria empregos. Mas ao autorizar a entrada de máquinas usadas, o governo pode desestimular o setor de bens de capital. O movimento de transferência de linhas de produção já provocou reclamações dos fabricantes de máquinas junto ao ministro do Desenvolvimento, Miguel Jorge. Corremos o risco de sucatear o parque industrial brasileiro. O setor de bens de capital ainda não saiu da crise, disse Nelson Deduque, diretor de mercado externo da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq).
As empresas argumentam que importar uma linha de produção usada pode reduzir em até 80% o custo do investimento. Isso permite que companhias de médio e pequeno portes também aumentem a produção. Saiu pela metade do preço. Gastamos US$ 500 mil em máquinas que valem US$ 1 milhão. Foi uma das principais razões da transferência, disse a coordenadora de comércio exterior das Linhas Bonfio, Rita de Cássia Pereira. A companhia trouxe, em maio, uma linha de produção de fios têxteis. As máquinas pertenciam a uma fábrica desativada no Canadá .
A Bio Springer, fabricante de extrato proteico, composto utilizado em alimentos como macarrão instantâneo, trouxe uma nova linha de produção para o País, que aumentou em 30% a capacidade de sua planta. Segundo Antonio Panzionoto, diretor industrial, a centrífuga veio da República Tcheca e as outras máquinas, da França. Eram máquinas do grupo. É mais barato do que comprar tudo de novo no Brasil.
Também há casos de empresas que não atuavam no País e estão chegando por meio de transferência de plantas. A fabricante de móveis portuguesa Iduna vai trazer uma unidade de Braga para Cotia, na Grande São Paulo. O potencial do mercado brasileiro é grande, mas para ser competitivo é preciso produzir aqui. Além disso, o impacto da crise foi mais violento na Europa, disse o proprietário da empresa, Alberto Araújo.
e) Brasil e México iniciam discussão de detalhes do acordo em novembro
México e Brasil começam, em novembro, a discutir o formato que terá o novo acordo comercial que os países deverão firmar, segundo orientação dos presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Felipe Calderón.
No fim de semana, uma missão do governo brasileiro, comandada pelo secretário de Comércio Exterior, Welber Barral, e pelo diretor do Departamento de Aladi e Integração Regional do Itamaraty, Paulo França, reuniu-se com autoridades mexicanas para sondar a disposição para um acordo.
Com a receptividade dos mexicanos, pretendem fazer consultas com o setor privado brasileiro, para definir uma proposta de acordo ao México.
Fomos muito bem recebidos, tivemos uma fase exploratória muito positiva, definiu França, ao falar das conversas no México. Em novembro, teremos uma ideia mais clara do escopo que terá o acordo com os mexicanos, quantos itens serão agregados, se irá além da liberalização comercial, disse Barral. Quero saber primeiro quais as demandas do setor privado brasileiro, avisou. Nos próximos dias, o governo deverá convidar representantes do setor privado para discutir o futuro acordo.
Na conversa com os mexicanos, ficou claro que ainda há sensibilidade para a abertura do mercado a certos itens. França e Barral preferem não comentar sobre os setores onde os mexicanos veem dificuldades de liberalização, mas se sabe, por negociações anteriores, que uma das principais resistências ao acordo, no México, está na agricultura e na indústria de alimentos, e em setores como siderurgia. No Brasil, o setor petroquímico também resiste a um acordo mais amplo, e o Ministério do Desenvolvimento Agrário já anunciou, na Câmara de Comércio Exterior, que quer proteção para a agricultura familiar numa eventual abertura de mercado aos mexicanos.
Os exportadores brasileiros reunidos na Coalizão Empresarial, grupo comandado pelas maiores empresas do país, com ativa participação nas negociações internacionais, já obteve apoio da confederação de indústrias mexicana para iniciar negociações de ampliação do atual acordo de redução tarifária existente entre os dois países, hoje restrito a cerca de 7.800 produtos (um outro acordo, mais relevante, garante liberação e redução tarifária de automóveis, partes e peças). Os brasileiros, desde 2007, defendem uma proposta de acordo de livre comércio que estabeleceria três cestas de produtos, com cronogramas diferentes de eliminação de tarifas, e proteção para produtos sensíveis, a serem negociados entre os dois países.
Na segunda-feira, o governo deverá fazer uma reunião entre os ministérios interessados para estabelecer as consultas ao setor privado e unificar a linguagem oficial sobre as perspectivas de acordo com os mexicanos.
No fim de semana, Paulo França e Welber Barral chegaram a conversar com os mexicanos sobre detalhes dos acordos firmados pelo México com mais de 45 países, para conhecer melhor as implicações dos compromissos daquele país com seus parceiros comerciais e os precedentes para a futura negociação com o Brasil.
No ano passado, chegamos a tentar iniciar negociações, mas não progrediram, agora a disposição do México mudou muito, garante Barral, entusiasmado.
f) Embraer disputa encomenda dos EUA
A Embraer participa do processo de seleção aberto pela Força Aérea dos Estados Unidos (USAF), no fim de julho, para a compra de 100 aeronaves turboélice de ataque leve, na categoria do Super Tucano. A Embraer é apontada por especialistas do setor como a grande favorita da competição, tendo em vista que o Super Tucano é o único modelo no mundo com operação comprovada em missões anti-guerrilha, na Colômbia, que opera 25 aeronaves do modelo.
Se concretizada, essa seria a maior venda de Super Tucano já realizada pela Embraer desde o seu lançamento. Em 2008 o modelo foi responsável por mais da metade das exportações da área de defesa da fabricante brasileira, que totalizaram US$ 504 milhões. Este ano o Super Tucano recebeu oito encomendas da República Dominicana e 24 do Equador. A Força Aérea Brasileira (FAB) comprou 99 e já recebeu cerca de 72 unidades.
O processo de seleção ainda encontra-se na fase de pedido de informações, através da emissão de um RFI (Request For Information), que as empresas interessadas responderam no fim do mês de agosto. A oficialização do processo de concorrência se dá com a publicação de um pedido de proposta, conhecido no jargão militar como RFP (sigla em inglês), o que ainda não aconteceu.
Entre os prováveis competidores do Super Tucano nessa concorrência estão o modelo suíço Pilatus PC-9 e o americano T-6, fabricado pela Beechcraft. A aeronave americana, segundo apurou o Valor, está em desvantagem em relação ao Super Tucano porque a sua nova versão, o AT-6B, ainda encontra-se em fase de desenvolvimento.
O Super Tucano já foi produzido, certificado e operado com sucesso e em combate, não só no Brasil, mas também na Colômbia, disse uma fonte. Outro ponto a favor do Super Tucano é a sua capacidade para carregar armamentos. O AT-6B tem capacidade para transportar 500 quilos de carga paga enquanto o Super Tucano pode carregar até 1,5 toneladas e equipamentos de missão.
A versão básica do Super Tucano custa entre US$ 10 milhões e US$ 15 milhões. Segundo uma fonte ligada à Embraer, o governo de Angola comprou em maio deste ano seis Super Tucano. É a primeira vez que a empresa realiza a venda de uma aeronave de defesa no continente africano.
No pedido de informações emitido pela USAF existe uma previsão de que as entregas iniciais das aeronaves aconteçam a partir de 2012 e que o primeiro esquadrão esteja operacional no ano seguinte. Por enquanto só existe um pedido de informações para as empresas, o que não implica em nenhuma obrigação contratual por parte do governo dos Estados Unidos.
Caso a Embraer consiga concretiza a venda de 100 Super Tucano para a USAF, a empresa teria que, pela legislação americana, instalar uma linha de fabricação das aeronaves nos Estados Unidos. Essa não seria uma dificuldade para a Embraer, tendo em vista que a empresa brasileira já está montando uma nova instalação em Melbourne, na Flórida, para atender a operação de aviação executiva.
Além da Força Aérea dos Estados Unidos, a Marinha deste país também estuda a possibilidade de adquirir aeronaves Super Tucano. O modelo já vem sendo testado há mais de um ano pela Marinha americana para provar conceito como aeronave de apoio aéreo próximo, destinado as forças de operações especiais em conflitos.
O primeiro Super Tucano vendidos para os EUA, como avião demonstrador de conceito, foi recebido pela US Navy através de operação de leasing, feita pela EP Aviation, do conhecido grupo americano de segurança privada Blackwater.
Agronegócio
a) Produtividade, o combustível para exportações agrícolas sustentáveis
Protagonista do recente salto das exportações mundiais do agronegócio, motivado sobretudo pela maior demanda de emergentes como a China, o Brasil é o país que reúne melhores condições para manter as elevadas taxas de incremento verificadas desde meados dos anos 90 e agregar valor aos embarques do setor nas próximas décadas.
Esta é a principal conclusão do estudo Brasil Sustentável - Perspectivas do Brasil na agroindústria, elaborado por Ernst & Young e FGV Projetos e apresentado a jornalistas em São Paulo. Ainda que o cenário traçado não seja novo para quem acompanha a escalada do agronegócio brasileiro nos últimos anos, o estudo corrobora projeções oficiais e reforça o alerta quanto à importância da sustentabilidade das atividades.
Os autores do estudo atentam, ainda, para a tendência de fortalecimento também dos biocombustíveis e da demanda doméstica, outros bons sinais para agroindústrias e produtores rurais radicados no país, e para questões como política agrícola e o papel da agricultura familiar em meio a um flagrante movimento de concentração ao longo de todos os elos das cadeias do setor, com destaque para as áreas de carnes e açúcar e etanol.
Os dados apresentados mostram que, em 1995, a participação do país nas exportações agrícolas mundiais foi de 2,8%. Em 2005, após uma década de crescimento médio de 10,2% ao ano dos embarques - maior taxa entre os 20 principais países do ranking -, a fatia chegou a 4,8%.
Apesar do crescimento, o Brasil manteve a quarta posição entre os maiores exportadores, atrás de Estados Unidos (10,2%), França (7,4%) e Holanda (6,8%), mas a diferença caiu e continua diminuindo. Em 2008, a fatia brasileira chegou a 5,5%, bem próxima do desempenho da Holanda, que é grande importadora agrícola mas reexporta produtos processados para outros mercados da Europa.
Segundo Fernando Garcia, da FGV Projetos e coordenador técnico do projeto, a evolução decorreu, em grande medida, de ganhos de produtividade. Ainda que a guinada cambial de 1999 tenha sido vital para a competitividade dos produtos brasileiros no exterior naquele momento, o estudo aponta que, em média, a produtividade agropecuária do país cresceu, em média, 2% ao ano entre 1960, aurora da Revolução Verde, e 2005, superando outros emergentes como China (1,8%) e Índia (1,5%) e nações desenvolvidas como os EUA (0,8%), o líder das exportações. Até 2030, a taxa anual de incremento foi estimada em 1,3%.
Esse ganho de competitividade coincidiu com a maior abertura econômica do país, disse Garcia. Essa maior abertura também explica, segundo ele, o crescimento das importações agrícolas do Brasil, outra tendência que deve perdurar, sem provocar estragos ao gordo superávit comercial do setor como um todo. Dependente do trigo fornecido por países como Argentina e EUA, o Brasil importou US$ 42,3 milhões em alimentos e US$ 14,2 milhões em matérias-primas agrícolas para outros fins em 2007, segundo o estudo.
Com o resultado, o país ficou em 13º lugar no ranking liderado por EUA (US$ 537,4 bilhões em alimentos e US$ 169,1 em matérias-primas), Japão (US$ 475,1 milhões e US$ 91,1 milhões, respectivamente). Em 2030, a projeção aponta que o Brasil deve subir para a 12ª posição entre os importadores, com compras de US$ 67 milhões em alimentos e US$ 22,6 milhões em matérias-primas. EUA e Japão seguirão na liderança das importações de alimentos no horizonte apresentado, e a China será ainda mais importante nas importações das duas frentes, consolidando-se como segundo principal destino das exportações brasileira, ainda atrás dos EUA.
O crescimento mundial será menor até 2030 do que foi nas últimas décadas; mas, como terá um novo perfil maior peso dos emergentes, a demanda por alimentos aumentará mais, prevê Garcia. Isso sem contar o papel mais relevante das fontes renováveis de energia em meio à obrigação de se ter uma produção agropecuária sustentável.
O especialista está convencido que a sustentabilidade da produção brasileira estará garantida se os ganhos de produtividade continuarem aumentando. Segundo ele, o Brasil ainda tem um grande espaço mal aproveitado, e isso tende a melhorar com mecanização e um uso mais intensivo da terra, especialmente na pecuária de corte. Além disso, há universidades e empresas, a Embrapa entre elas, que movem essa evolução no campo.
A entrada de novos players em determinados segmentos também traz uma nova cultura, inclusive em pesquisas. O Brasil é muito novo nessa gestão. E a melhora da infraestrutura também vai colaborar, afirma Renato Gennaro, diretor-executivo da Ernst & Young. Das áreas relacionadas ao agronegócio, o que mais investe em pesquisa e desenvolvimento e inovação é o de celulose. Em 2005, 5,5% do faturamento do segmento foi destinada a esses trabalhos.
b) Barreiras sanitárias detêm embarques de carne suína
O Brasil poderia triplicar as exportações de carne suína até 2015 se as barreiras sanitárias contra o produto nacional fossem gradualmente desmanteladas. As exportações alcançam este ano US$ 1,2 bilhão. O total estimado em 2015 é de vendas de 1,920 milhão de toneladas, levando o Brasil a abocanhar 35% do mercado mundial, num salto em relação aos 11% atuais.
A estimativa foi apresentada por Pedro de Carmargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne suína (Abipecs), em entrevista à imprensa internacional, à margem de uma reunião na Organização Mundial do Comércio (OMC).
A derrubada de barreiras sanitárias é mais importante do que corte de tarifas na Rodada Doha, disse ele, conclamando o governo brasileiro a ser mais incisivo não combate a novas medidas protecionistas no comércio agrícola internacional e a OMC a estabelecer claros limites no tempo para se resolver problemas envolvendo barreiras sanitárias e fitossanitárias.
Barreiras desse tipo são justificadas pelas regras da OMC para proteger a saúde humana, vegetal e animal. Mas Camargo Neto avalia que o Brasil não tem acesso a muitos mercados por causa de medidas impostas sem embasamento científico sobre eventuais riscos.
A dificuldade de acesso é quase generalizada. Os EUA enviaram uma missão veterinária a Santa Catarina em abril de 2008, fizeram um relatório positivo e abriram uma consulta pública para depois decidir se permitirão a importação de carne suína brasileira. A União Europeia enviará uma missão ao Brasil no próximo mês, mas para exportar para a Europa os produtores devem seguir as exigências impostas pela ciência europeia, ponto final.
A Coreia do Sul, terceiro maior importador de carne suína do mundo, começou lentamente a discutir com o Brasil, num progresso em relação a anos anteriores, quando não queria nem falar na possibilidade de importação do produto brasileiro.
O México, o quarto maior mercado, tem ainda mais dificuldades para discutir essa questão com o Brasil. Depois de pressões diplomáticas, os mexicanos aceitaram uma discussão técnica em julho na Cidade do México. Foi só um encontro, nenhum progresso, afirmou o executivo. Nessa morosidade, o mercado fica fechado. Esses exemplos serão apresentados hoje por Carmargo Neto num debate na OMC.
Para Antonio Donizeti Beraldo, diretor de Políticas e Comércio do Instituto Intermaericano de Cooperação para a Agricultura, com sede na Costa Rica, outro desafio é a volta da questão da multifuncionalidade, com setores protecionistas argumentando com a necessidade de segurança alimentar, bem-estar animal etc. Isso tudo parece estar voltando com força, mas não vejo oposição entre abertura comercial e segurança alimentar, afirmou.
O especialista Saulo Nogueira, do instituto Icone, nota que o comércio agrícola com a União Europeia tem como principal obstáculo justamente medidas sanitárias e fitossanitárias.
c) Brasil volta a exportar mais açúcar para a EU
O Brasil está podendo exportar 550 mil toneladas de açúcar dentro de cotas para a União Europeia (UE), por um acordo bilateral para compensar Brasília pelas perdas que as exportações brasileiras tiveram com a entrada da Bulgária e Romênia no bloco em 2007.
A expectativa é de que o país terá ganho adicional de US$ 200 milhões em exportações de açúcar e carnes para a UE. No caso do açúcar, a UE colocou em vigor uma uma cota exclusiva para o Brasil exportar 300 mil toneladas, a ser preenchida por usineiros do Nordeste. A tarifa será de US$ 98 por tonelada, abaixo da alíquota extra-cota.
Há uma segunda cota, de 250 mil toneladas, na base de Nação Mais Favorecida (MNF). Significa que a cota é aberta a todos os exportadores, mas a expectativa é de que esse volume seja ocupado em boa parte pelo Brasil, por sua competitividade.
Na área de carnes, o Brasil poderá exportar mais 5 mil toneladas da carne bovina de alta qualidade, a cota Hilton, dobrando o volume do que pode vender com tarifa de 20%. Na venda fora da cota, a taxa é de 12,5% mais US$ 3.042 por tonelada. Com tarifa menor, o exportador pode obter prêmio de US$ 3 mil por tonelada. O país poderá exportar ainda carne de búfalo.
A UE abre ainda uma cota de 9 mil toneladas de carne bovina congelada, com tarifa de 20%, teoricamente para todos os exportadores, mas na prática procurando atender ao Brasil. A cota adicional de frango é de 2.500 toneladas, livre de alíquota. Uma nova cota entrou em vigor para a exportação de 2.500 toneladas de peru, também livre de taxa.
Mercosul
a) Para chegar à Venezuela, fábrica vai produzir na Argentina
As barreiras comerciais impostas pelo governo de Hugo Chavez dificultaram as exportações de calçados brasileiros à Venezuela. Segundo dados do Sindifranca, de janeiro a agosto, Franca exportou US$ 4,4 milhões em sapatos à Venezuela. Em 2008, no mesmo período, foram US$ 10,3 milhões.
Por causa das barreiras, em Franca um empresário negocia a terceirização de parte de sua produção para uma empresa da Argentina, cujo acesso à Venezuela é mais fácil.
A Venezuela era um dos nossos principais países de destino, mas a exportação ficou muito complicada. Estou negociando com uma empresa da Argentina, vou começar a fazer o calçado lá mesmo e exportar para a Venezuela, disse José Rosa Jacomete, diretor da Bordallo Calçados, que deve produzir aproximadamente 50 mil pares no país vizinho.
Segundo José Carlos Brigagão do Couto, presidente do Sindifranca, esse pode ser o primeiro sinal de uma tendência perigosa. É um absurdo, novos casos podem surgir: é a indústria de Franca sendo obrigada a se mudar para outros centros. É tirar emprego do Brasil e transferir para a Argentina.
De acordo com Brigagão, o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Miguel Jorge, já marcou reunião com Hugo Chavez para discutir as barreiras comerciais entre os dois países.
A Venezuela fez um acordo para importar dois milhões de pares da Argentina. O ministro vai se sentar com o Hugo Chavez em novembro, esperamos uma solução, disse.
O preço médio do calçado de Franca sofreu uma queda de 7,2% entre o ano passado e 2009, passando de US$ 27,80 para US$ 25,80.
b) Tasso apresenta parecer contrário à entrada da Venezuela no MERCOSUL
O senador Tasso Jereissati (PSDB-CE) apresentou à Comissão de Relações Exteriores e Defesa Nacional relatório com voto contrário à adesão da Venezuela ao Mercosul. Em seu parecer, Tasso faz duras críticas ao processo institucional na Venezuela e justifica sua proposta de veto à estratégia de destruição da democracia e implantação de regime autoritário do presidente venezuelano Hugo Chávez.
O parecer será lido na comissão, mas a votação deve ser adiada para a próxima semana. Os governistas devem pedir vista coletiva para tentar articular a derrubada do parecer. O projeto que trata do protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul tem de ser votado em plenário.
Responsável no Senado pela relatoria do projeto de decreto legislativo 430/08, Tasso analisa que o debate político sobre a entrada da Venezuela no bloco é mais importante do que o aspecto econômico. Em todo o texto do parecer de 31 páginas, o senador ressalta que a parceria com a Venezuela é uma decisão política e, por isso, mostra-se contrário. É um grave erro priorizar os aspectos econômicos em detrimento dos políticos, quando se negocia com estados onde os princípios democráticos foram subordinados ao império da vontade de seus governantes, escreveu Tasso.
Sob pressão de empresários, Tasso cogitou apresentar um parecer favorável, mas com restrições. O relatório apresentado, no entanto, não só defende o veto ao país no Mercosul como traz duras críticas à parceria. Foram se acumulando ações do presidente Chávez que me assustaram, como a articulação dele em Honduras e o fechamento de canal de televisão. Há um projeto anti-democrático na Venezuela, disse. Corremos o risco de o Mercosul transformar-se em um barril de pólvora.
As críticas à entrada da Venezuela no bloco somam-se a ataques feitos pelo relator ao Mercosul. Na análise do senador, o Mercosul não avança em termos de livre comércio e em termos de tarifa externa comum. Ele citou retrocessos na relação comercial, como na parceria com a Argentina, e alega a falta de segurança jurídica no bloco.
No Congresso, o PSDB, como partido, é o principal opositor à entrada da Venezuela no Mercosul, mas há governistas importantes também contra a permissão, como o presidente do Senado, José Sarney, e o presidente da Comissão de Infraestrutura, Fernando Collor, ambos ex-presidentes da República. Na Câmara, o PSDB foi o único partido que votou em bloco pela rejeição da adesão. O partido comanda no Senado a Comissão de Relações Exteriores, com Eduardo Azeredo (MG), e deu a relatoria a Tasso, suplente na comissão. O partido sempre foi crítico a esse tema, explicou Azeredo. Não é um debate só partidário, considerou Azeredo. Mas não pode ser observado só do ponto de vista econômico, disse.
Na comissão o governo poderá ter dificuldade para rejeitar o relatório: dos 19 integrantes, cinco são do PT. Os sete do PSDB e DEM devem votar com Tasso. O senador Fernando Collor (PTB-AL) já se mostrou contrário à adesão da Venezuela. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), tem desavenças antigas com Chávez e poderá orientar os cinco integrantes do bloco PMDB/PP na comissão a resistirem - e, posteriormente, na votação em plenário. A bancada do PMDB é a maior da Casa. O DEM também tem restrições.
Tasso escolheu um momento estratégico para apresentar o relatório, quando o Brasil negocia com Honduras a permanência do ex-presidente Manuel Zelaya na embaixada brasileira em Tegicigalpa - ação política comandada pelo presidente venezuelano e alvo de críticas. O episódio citado, segundo o relator, é mais um exemplo dos problemas criados por Chávez.
O parecer de Tasso gerou críticas do governo e o PT vai associar a decisão a perdas econômicas ao país. Para a líder do governo no Congresso, senadora Ideli Salvatti (PT-SC), o PSDB se desgastará. Economicamente a adesão da Venezuela é uma proposta irrecusável, disse Ideli. Queremos ver o PSDB defender que não vale a pena o acordo comercial. Vendemos muito para a Venezuela e compramos pouco deles. É superávit comercial. Se eles ideologizarem, vão se prejudicar.
O comércio Brasil-Venezuela cresceu 885% nos últimos dez anos e o comércio com o país foi o que mais contribuiu para o superávit primário em 2008: 18% do saldo brasileiro vêm das exportações para o país vizinho. O PIB da Venezuela é de US$ 300 bilhões e seu potencial econômico atrai um conjunto expressivo de empresas brasileiras, em especial na área de construção pesada. Os dados foram citados pelo relator, mas ele ressalta que as divergências com Chávez impedem o estreitamento das relações comerciais. (Chávez) tem demonstrado pouca consideração a acordos e contratos, e costuma pautar suas relações internacionais entre amigos e inimigos, as empresas, investidores e o próprio governo brasileiro poderão encontrar, no futuro, situações difíceis e complicadas, assinalou.
O protocolo de adesão da Venezuela ao Mercosul foi firmado em 2006, em Caracas, e precisa ser aprovado pelos Parlamentos dos países integrantes do Mercosul. Argentina e Uruguai já aprovaram a adesão da Venezuela ao bloco. No Paraguai a resistência foi grande e o governo retirou de pauta o projeto, com receio de que fosse rejeitado.
c) Empresas do Brasil e da UE pedem pressa em acordo
Empresas do Brasil e da União Europeia (UE) pressionam os governos a voltar à mesa de negociações para concluir o acordo de livre comércio UE-Mercosul o mais rapidamente possível, argumentando que a crise global criou mais necessidade de liberalização do comércio e de investimentos entre as economias dos dois blocos. No Encontro Empresarial Brasil-UE, marcado para terça-feira em Estocolmo (Suécia) à margem da cúpula dos dois blocos, os empresários vão insistir que companhias brasileiras e europeias estão profundamente preocupadas com o impasse, ainda mais no cenário atual, conforme esboço de comunicado obtido pelo Valor.
O comércio bilateral Brasil-UE cresceu 15% em 2008 e o total do fluxo de investimentos chegou a € 17 bilhões em 2007. Mas as empresas consideram crucial reforçar as relações econômicas, notando que o Brasil cresce menos de 1% este ano e a economia europeia sofre contração de 3,9%.
Negociadores do Mercosul e da UE já têm prevista uma reunião para o começo de novembro. Vão avaliar se dá para retomar a negociação birregional para realmente fechar um acordo possível no ano que vem, ao mesmo tempo em que a Rodada Doha de negociação global parece ser empurrada para 2011 ou 2012, no mínimo.
Em Estocolmo, empresários brasileiros e europeus querem criar um Conselho de Investimentos e Impostos, para examinar, ou pressionar, em conjunto pela redução do custo dos investimentos. Europeus notam que isso interessa tanto às multinacionais europeias, como também a companhias brasileiras que se internacionalizam e controlam já empresas no Velho Continente.
Em paralelo a um acordo birregional, brasileiros e europeus pedem aos governos para remover barreiras existentes no investimento e não criar novos obstáculos no comércio em resposta a dificuldades econômicas. Os europeus apontam barreiras e restrições para investimentos estrangeiros no Brasil em setores de seguros, transporte marítimo, telecomunicações, produtos agrícolas, equipamentos médicos e brinquedos. Por sua vez, os brasileiros se queixam de regulações excessivas sobre produtos químicos e padrões sanitários e fitossanitários que dificultam seu cumprimento pelos exportadores.
Os empresários querem ampliar um diálogo setorial, para facilitar resultados para as empresas. A parceria estratégica Brasil-UE estabeleceu esse mecanismo para os setores de metais não ferrosos, minerais, produtos florestais, aço, têxteis e vestuários. Agora, a ideia é amplia-lo para questões aduaneiras e direitos de propriedade intelectual.
Para os empresários, um acordo ambicioso na Rodada Doha seria a maior contribuição comercial para a recuperação econômica. Eles veem sobretudo oportunidade de avanço na negociação birregional UE-Mercosul, que está bloqueada há bastante tempo por causa das divergências na abertura agrícola, mas também industrial.
A negociação birregional está na prática paralisada há cinco anos. A última rodada de barganhas foi em 2004. Depois, houve contatos esporádicos. Este ano, os dois blocos retomaram o diálogo com uma discreta reunião em Lisboa. Desde então, os governos examinam com o setor privado qual o tipo de acordo possível poderia ser concluído. A reunião de novembro não tem ainda local definido, mas Bruxelas e Brasília querem que ocorra com bastante discrição.
Certos negociadores do próprio Mercosul, porém, são céticos e não veem espaço no momento para a UE reduzir proteção agrícola e facilitar o acesso para os países mais competitivos no setor. Além disso, há o próprio estado de calamidade do Mercosul. O Mercosul precisa de pausa para ser repensado, diz o senador e ex-ministro de Relações Exteriores do Uruguai, Sergio Abreu. Não somos sequer união aduaneira, com a tarifa dupla cobrada sobre produtos procedentes de fora do Mercosul quando passam de um membro a outro.
No entanto, empresas da UE e do Brasil, representadas na cúpula da semana que vem na Suécia, veem oportunidade de um acordo durante a presidência espanhola da Europa no ano que vem. Também a reeleição do português José Manuel Barroso, defensor do acordo birregional, pode ajudar um entendimento possível, julgam certos diplomatas.
Em Estocolmo, estarão representadas empresas como Basf, Volvo, Ericsson, Telefônica, Telecom Italia, Saab, Stora Enso, Embraer, Odebrecht, além da Confederação Nacional da Indústria (CNI).
Plano Internacional
a) OCDE e China negociam eliminar tarifas sobre produtos verdes
A União Europeia (UE) e os EUA estão mantendo negociações sobre um acordo a ser firmado com os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) e a China para eliminar tarifas de importação sobre produtos verdes, como parte dos incentivos estendidos a Pequim num potencial acordo global sobre o clima.
Diplomatas da UE disseram à Reuters que, pelo plano que está sendo discutido em Bruxelas e Washington, os 30 países-membros da OCDE e a China concordariam em firmar um pacto global para eliminar progressivamente as tarifas de importação que incidem sobre produtos como turbinas eólicas, fontes de energia renovável e tecnologias ecológicas. Mas é improvável que qualquer acordo inclua carros híbridos que poluem menos o ambiente, disseram os diplomatas.
As negociações estão entrando num estágio avançado. Bruxelas e Washington esperam que este possa ser um dos incentivos necessários para trazer a China para o nosso lado nos preparativos que antecedem as negociações sobre mudança climática em Copenhague, disse um diplomata.
Índia e Brasil também estão sendo cortejados pela UE e Washington antes das conversações mundiais sobre o clima que acontecerão em Copenhague em dezembro, mas acredita-se ser improvável que tomem parte na iniciativa. Brasil e Índia não são considerados parte do pacto, já que a redução das suas tarifas de importação não os beneficiaria. Eles podem optar por se associar, mas estima-se que prefiram se desassociar, disse o diplomata.
Uma porta-voz do escritório do representante do Comércio dos EUA (USTR) disse que os EUA e a UE têm feito gestões internas na Rodada Doha de negociações sobre o comércio mundial desde novembro de 2007 para obter um acordo de redução de tarifas em produtos ambientais e para continuar trabalhando estreitamente para pressionar por progresso concreto.
Continuamos ansiosos para prosseguir nas negociações para eliminar barreiras tarifárias que incidem sobre tecnologias benéficas ao clima e para estimular a dinâmica em torno de um pacote maior da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC) sobre produtos e serviços ambientais, disse a porta-voz do USTR, Carol Guthrie. Companhias dos EUA que estão frustradas com o ritmo lento da rodada Doha, instaram o governo Obama a considerar rotas alternativas para chegar a um acordo para impulsionar o comércio em bens e serviços ecológicos.
Esta é uma oportunidade para acelerar a política comercial dos EUA e ao mesmo tempo ajudar as negociações globais sobre o clima, disse Jake Colvin, vice-presidente para política de comércio global no Conselho Nacional de Comércio Exterior, uma entidade patronal dos EUA. A China está na iminência de se tornar a maior produtora de turbinas eólicas do mundo neste ano e é uma importante fabricante de produtos solares.
A potência asiática - a maior poluidora do mundo - enfrenta pressão da Europa e dos Estados Unidos para reduzir suas emissões de dióxido de carbono (CO2) como parte das negociações em torno de um novo tratado global sobre o clima que deverá ser o sucessor do Protocolo de Kyoto, cujo prazo de validade expira no fim de 2012. Em troca, Pequim quer bilhões de dólares em dinheiro vivo da UE e dos EUA para ajudá-la a aproveitar novas tecnologias mais ecológicas para a sua economia movida pelas exportações.
Os ministros do Comércio da UE deram luz verde no começo deste mês ao presidente da Suécia e à Comissão Europeia - que supervisiona a política comercial do bloco - para prosseguir as negociações com os EUA. Os países-membros receberão um relatório completo em 6 de outubro na Suécia e, se for aprovado, negociações formais poderão começar com a OCDE e a China antes de Copenhague, segundo um diplomata europeu.
Qualquer negociação poderia ser realizada entre embaixadores na OMC em Genebra, mas qualquer acordo seria acertado formalmente fora do órgão que monitora o comércio global, disseram os diplomatas.
Países produtores de fármacos que respondem por aproximadamente 90% da produção global, incluindo os Estados Unidos, UE e China, concordaram com tarifas zero por zero para produtos farmacêuticos e especiarias químicas usadas na produção de produtos farmacêuticos.
b) UE propõe fundo para financiar projetos de infraestrutura na AL
A União Europeia propôs o lançamento de um mecanismo de financiamento para projetos de infraestrutura na América Latina, em áreas como energia renovável, eficiência energética, transportes e ambiente. Com orçamento modesto da UE, de € 100 milhões até 2013, a ideia é que o instrumento sirva de estímulo para que instituições financeiras coloquem um volume mais expressivo de recursos para financiar as iniciativas.
A medida foi anunciada pela comissária europeia de Relações Externas, Benita Ferrero-Waldner, que destacou também a parceria estratégica especial entre UE e Brasil, além de ressaltar o interesse mútuo na questão dos biocombustíveis.
A pouco mais de dois meses da Cúpula do Clima, marcada para dezembro, em Copenhague, a proposta deixa claro o interesse da UE em estimular projetos ambientalmente sustentáveis na América Latina. O assunto, aliás, tende a ganhar espaço nas conversas entre europeus e latino-americanos. No dia 6, na reunião de cúpula entre Brasil e UE, em Estocolmo, as propostas sobre o tema devem certamente aparecer nas discussões.
Chamado de Facilidade de Investimento para a América Latina, o instrumento sugerido pelo órgão executivo da UE é inspirado num mecanismo já existente, voltado para os países vizinhos da UE. Segundo Benita, em 2008 os € 71 milhões destinados pela UE para esse objetivo financiaram iniciativas que, no total, totalizavam € 2, 7 bilhões. Em resumo, a ideia é que um aporte modesto de recursos da EU mobilize outras instituições a colocar quantias muito maiores.
A iniciativa foi anunciada no ano em que se completa uma década do lançamento da parceria estratégica entre a UE e a América Latina, ressaltou Benita. A intenção da Comissão Europeia é que o mecanismo seja efetivamente lançado em maio do ano que vem, quando haverá em Madri uma cúpula entre UE e América Latina.
Ao falar sobre o Brasil, Benita disse que a UE tem uma relação bastante positiva com o país, ressaltando a questão dos biocombustíveis. Ela lembrou a visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a Bruxelas, em meados de 2007, para participar de uma reunião sobre o tema. É algo de grande interesse para o Brasil, observou Benita, afirmando que o assunto também interessa muito à União Europeia.
O documento divulgado pela Comissão Europeia diz que o prosseguimento das negociações comerciais com o Mercosul é uma das prioridades da UE na sua política para a América Latina, mas Benita lembrou que o assunto tem ficado em segundo plano, dada a prioridade conferida à Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC).