17 a 21 de março de 2008

Comércio Exterior

Resultados
Vendas crescem 27% no pólo de Manaus
ArcelorMittal duplicará usina em MG
Importação destinada à reexportação será facilitada
AL teme retração das commodities

Agronegócio

Exportadores brasileiros de maçãs procuram ampliar suas fronteiras
País exporta gado de reprodução para Angola
Venda de café segue acelerada no Brasil
Cotação do boi em dólar é a maior em 37 anos no país

Mercosul

Missão traz 120 empresários argentinos ao Brasil
Mercosul e UE podem retomar negociações

Organização Mundial do Comércio (OMC)

Acordo na OMC seria bom para o Brasil
OMC faz nova tentativa para fechar Doha antes das eleições nos EUA

Plano Internacional

Juros altos e fragilidade dos EUA sustentam queda do dólar



Comércio Exterior

a) Resultados

A balança comercial (exportações menos importações) registrou saldo positivo de US$ 527 milhões na segunda semana deste mês, segundo dados divulgados pelo Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Na última semana, as exportações chegaram a US$ 3,494 bilhões e as importações a US$ 2,967. Com o déficit comercial registrado na primeira semana do mês - US$ 159 milhões -, o mês de março acumula superávit comercial de US$ 368 milhões.

O saldo positivo de US$ 527 milhões da balança comercial na segunda semana de março foi influenciado principalmente pelo desempenho das exportações de produtos como óleo de soja e celulose, e itens básicos, como carnes suína e de frango, e café e milho em grãos. As exportações no período chegaram a US$ 3,494 bilhões, com aumento de 35,6% nos embarques de semimanufaturados (entre eles, óleo de soja, alumínio bruto e ferro fundido, e semimanufaturados de ferro e aço), de 13,2% nas vendas de milho em grão, farelo de soja, fumo em folhas e carnes de frango e suínos - classificados como produtos básicos -, e de 8,1% nas de manufaturas, em função de tratores, álcool etílico, calçados e motores.

Em relação às importações, que alcançaram US$ 2,967 bilhões, houve crescimento nas compras de produtos siderúrgicos, cereais e produtos de moagem, combustíveis e lubrificantes, veículos automotivos, adubos e fertilizantes, eletroeletrônicos e farmacêuticos.

No acumulado do ano, as exportações somam US$ 32,799 bilhões, valor maior do que o registrado em igual período do ano passado (US$ 25,206), e as importações chegaram a US$ 30,605 bilhões, resultado acima dos US$ 18,802 bilhões observados até a segunda semana de março de 2006. Devido ao crescimento das importações em ritmo maior do que as exportações, o saldo comercial acumulado deste ano chegou a US$ 2,194 bilhões, contra US$ 6,404 bilhões em igual período de 2006.

b) Vendas crescem 27% no pólo de Manaus

O pólo industrial de Manaus registrou faturamento recorde para um mês de janeiro em 2008. Foram US$ 2,171 bilhões neste ano, contra US$ 1,706 bilhão em janeiro de 2007. O resultado, 27,30% maior, faz parte dos indicadores de desempenho do PIM, divulgados na sexta-feira pela Superintendência da Zona Franca de Manaus (SUFRAMA).

As exportações também subiram e foram 31,75% maiores que em janeiro de 2008, passando de US$ 70,150 milhões para US$ 92,422 milhões. Com relação a geração de empregos, o pólo de Manaus continua mantendo aproximadamente 100 mil trabalhadores diretamente empregados nas linhas de produção, além de outros cerca de 400 mil de forma indireta.

Um dos destaques de janeiro foi o segmento de motocicletas. A produção de motos neste início de ano cresceu 29% - passou de 156.826 unidades em janeiro de 2007 para 202.423 unidades em janeiro de 2008. Também passaram a produzir mais os fabricantes de televisores com tela de cristal líquido (LCD) - 499,90% mais, alcançando a marca de 109.523 unidades em janeiro; de rádios e aparelhos reprodutores e gravadores de áudio (aumento de 347%); de auto-rádio e aparelhos reprodutores de áudio (crescimento de 133%); de CD (alta de 75%); telefone celular (mais 45%); os fabricantes de set-top box (produção 28% maior); de monitores com tela de LCD para uso em informática (mais 22,91%); relógios de pulso e bolso (crescimento de 19%); e de aparelhos de barbear (alta de 3%), sempre em relação a janeiro do ano passado.

c) ArcelorMittal duplicará usina em MG

O grupo Arcelor Mittal, líder mundial na produção de aço, vai ampliar a capacidade de produção da sua usina de aços longos em João Monlevade (MG) dos atuais 1,2 milhão de toneladas por ano para 2,7 milhões de toneladas por ano. A obra deverá estar concluída num prazo de até 30 meses.

O detalhamento do investimento foi apresentado em Belo Horizonte, onde está a sede da Arcelor Mittal Brasil.

O projeto para duplicação da usina de Monlevade é antigo e sofreu vários ajustes nos últimos anos. A ampliação foi finalmente aprovada pelo conselho de administração da Arcelor Mittal no fim do ano passado. Segundo o presidente da Arcelor Mittal Brasil, José Armando Campos, a forte demanda atual do mercado doméstico garante receita para as siderúrgicas e justifica investimentos apesar do câmbio desfavorável às exportações.

No Rio de Janeiro, onde participou na sexta feira da 14ª Conferência Mundial de Siderurgia, o executivo informou que a siderúrgica está exportando apenas 25% da sua produção, patamar inferior à sua média histórica. Se dependessem do mercado externo, analisou Campos, as siderúrgicas brasileiras estariam "liquidadas". "Exportando com o câmbio atual, estariam chorando."

De acordo com o executivo, o aumento da produção de aços longos em João Monlevade exigirá também expansão da produção de minério de ferro da Mina de Andrade. A mina, que abastece a siderúrgica, terá sua capacidade ampliada dos atuais 1,8 milhão de toneladas para 4 milhões de toneladas por ano.

"A mina do Andrade vai suportar a expansão de Monlevade", informou Campos. "Mesmo depois da expansão, a nossa relação de autoconsumo vai se manter, com 100% de produção própria para aços longos e 100% de minério de terceiros para aços planos." Atualmente, essa mina está arrendada à Vale do Rio Doce.

A expansão da usina em João Monlevade não é o único investimento do grupo no Brasil com foco no mercado doméstico. O grupo está investindo na instalação de uma linha de laminação a quente na ArcelorMittal Tubarão (CST), que elevará a produção da unidade para 4 milhões de toneladas por ano. Na Vega do Sul, em São Francisco do Sul (SC), será instalada uma segunda linha de galvanização para atender também o mercado interno.

A produção do grupo no país neste ano deverá somar 13,5 milhões de toneladas. Para 2012, a meta é de 20 milhões de toneladas.

d) Importação destinada à reexportação será facilitada

O governo quer mudar, neste ano, as regras para autorização de operações de drawback, a importação de produtos destinados à fabricação de mercadorias para exportação. "Vamos simplificar as operações de drawback, reduzir prazos e a papelada", diz o secretário de comércio exterior do Ministério do Desenvolvimento, Welber Barral. A medida, como outras decisões de simplificação do comércio exterior, será precedida de consultas públicas e fará parte da nova política industrial, informa ele.

O governo, ainda em abril, deverá iniciar o "DrawbackWeb", sistema pelo qual os pedidos de operações de drawback serão feitos pela Internet, e serão automaticamente comparados com as guias de exportação. Hoje, por motivos burocráticos, até grandes exportadoras deixam de informar ao governo que determinadas exportações usam componentes importados pelo sistema de drawback, o que gera processos e multas contra essas companhias. Há cerca de 20 mil desses processos no ministério, o que poderá acabar com as novas regras, acredita Barral.

O ministério abrirá uma consulta pública, no segundo semestre, para receber sugestões de mudança no sistema de autorização para operações de drawback, embora a última experiência de consulta aos interessados para decisões de política de comércio exterior tenha "frustrado" as autoridades do governo, pela apatia do setor privado.

Em fevereiro, o Ministério do Desenvolvimento abriu uma consulta pública para receber sugestões sobre outra medida em estudo, a modificação das regras para importação de bens usados, especialmente máquinas, partes e peças destinadas à produção.

"Faremos consultas públicas para todas as medidas nessa área", garante. No caso das importações de bens usados, está fora de questão, porém, mudanças para permitir a importação de bens de consumo de segunda mão.

Ele lembra que, como regra geral, é proibida a importação de material usado no Brasil, mas há exceções, para bens de capital (máquinas e equipamentos para a indústria) sem produção nacional, partes e peças, unidades fabris e contêineres. O governo quer regulamentar esse tipo de comércio, para atualizar a legislação brasileira, que é considerada ultrapassada, mas tem de levar em conta que o tema é alvo de negociações na Organização Mundial do Comércio (OMC), onde países como os Estados Unidos querem a liberação total desse tipo de importações, e nações como o Brasil defendem uma liberação seletiva.

Uma das principais mudanças, segundo Barral, será a maior "transparência" no processo de autorização para importações, que depende da manifestação dos fabricantes nacionais, para atestar que os bens importados não têm similar no país, condição obrigatória para que o governo permita o negócio. Já há sugestões informais para que o governo fixe prazos para a manifestação dos fabricantes nacionais, após os quais a ausência de manifestação seria considerada como a confirmação de inexistência de fabricação nacional.

Segundo o vice-presidente da Associação Brasileira de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Carlos Pastoriza, a importação de máquinas usadas sem similar nacional pode trazer benefícios ao país, por acrescentar ao parque produtivo tecnologias ainda não disponíveis. Ele alerta, contudo, para o aumento das pressões de diversos setores produtivos contra o governo, para liberalizar esse tipo de comércio de máquinas. Pastoriza identifica essas pressões principalmente nas áreas de mineração e petróleo e gás, por insatisfação com os prazos de entrega da produção nacional.

"O argumento de que a indústria nacional não tem capacidade de atender ao mercado local é falacioso", defende o executivo. O aumento das exportações do setor, em 20% no ano passado, é uma demonstração de que as empresas podem redirecionar a produção ao mercado interno se houver uma maior demanda no país.

O número de operações de compra de máquinas e equipamentos usados do exterior cresceu 23% no ano passado, mas a preferência por operações de grande porte (equipamentos de grande escala ou linhas completas de produção desmontadas e trazidas ao Brasil) fez com que o valor dessas importações crescesse quase 68%, de US$ 1,4 bilhão para pouco menos de US$ 2,4 bilhões. "Não se cogita reduzir essas importações; elas são importantes para aumentar a produção dos exportadores brasileiros", comenta Welber Barral.

e) AL teme retração das commodities

Com o agravamento da crise externa, um forte tombo dos preços das commodities é o maior risco enfrentado pelos países da América Latina, advertem analistas. Para o diretor do Departamento do Hemisfério Ocidental do Fundo Monetário Internacional (FMI), Anoop Singh, uma queda abrupta das cotações de commodities teria impactos negativos nas contas externas e fiscais dos países da região. "Em desacelerações globais anteriores, os preços desses produtos caíram 35% a 40%", ressaltou ele, lembrando que as exportações de commodities respondem por 10% do Produto Interno Bruto (PIB) e 40% das receitas de exportação da América Latina. "Esse é o maior risco para a região", disse Singh, que participou em São Paulo, da conferência "Euro: implicações globais e relevância para a América Latina".

Um outro número dá a medida da importância das commodities para os países da região. Segundo Osvaldo Kacef, diretor da Comissão Econômica Para a América Latina e Caribe (Cepal), tirando o México, 72,9% das exportações latino-americanas são de produtos primários. Se os preços de commodities se mantiverem nos elevadíssimos níveis atuais, a região não vai enfrentar grandes problemas. A questão é que, para alguns analistas como o economista-chefe para a Europa do Deutsche Bank, Thomas Mayer, claramente há uma bolha especulativa nos mercados de commodities. Há uma queda forte dos preços de ativos em outros mercados, que tem levado os investidores a buscar outras opções, como os contratos desses produtos.

Para Singh, dada a importância das commodities para os países da região, um eventual recuo das cotações como registrado em desacelerações globais anteriores causaria estragos não apenas nas contas externas, mas também nas contas fiscais da América Latina. "Não é o momento para complacência", afirmou ele. Cautela na condução da política fiscal, com contenção do ritmo de crescimento dos gastos públicos, seria bem-vinda.

O secretário-geral-adjunto da Organização para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE), Pier Carlo Padoan, disse que a América Latina não ficará imune à crise. A fraqueza econômica dos países industrializados acabará por afetar a região, ainda que com alguma defasagem.

A grande vantagem da América Latina e do Brasil, ressaltada por todos os analistas, é que de fato os países da região parecem bem mais preparados para enfrentar as turbulências externas. Kacef destacou que os países têm hoje reservas muito mais elevadas, dívidas públicas menores e com uma composição mais positiva e superávits primários razoáveis.

O diretor-executivo do FMI, Paulo Nogueira Batista Jr., também aponta a situação externa ainda confortável como um dos principais trunfos do país neste momento de crise, mas disse que a situação externa tem se agravado bastante, o que aumenta o risco de que o país sofra com a turbulência no cenário internacional. Para ele, os maiores riscos são uma queda abrupta no mercado de commodities ou mesmo o contágio financeiro. Se aumentar a aversão global ao risco, os fluxos de capitais para o Brasil podem diminuir. "É por isso que é importante manter uma posição forte no balanço de pagamentos", afirmou. Num cenário de câmbio valorizado e crescimento robusto da atividade econômica, a balança comercial tem mostrado deterioração acentuada, o que deve levar o país a registrar em 2008 o primeiro déficit em conta corrente depois de cinco anos.

Agronegócio

a) Exportadores brasileiros de maçãs procuram ampliar suas fronteiras

As empresas brasileiras produtoras de maçã decidiram investir em novos mercados no exterior para a variedade gala. No primeiro bimestre, dados da Secex compilados pela Associação Brasileira de Produtores de Maçãs (ABPM) mostram que cresceram as vendas para Rússia, Oriente Médio, África e América Central, e que diminuiu, a partir dessa estratégia, a tradicional liderança da União Européia entre os principais destinos da fruta exportada pelo país.

"Com o estoque europeu de maçãs neste ano em um bom volume, era hora de testar outros lugares", diz Anderson Tholozan, gerente comercial da Rasip, de Vacaria (RS). Entre mercados menos maduros que a UE, a empresa passou a fazer vendas mais significativas inicialmente para o Oriente Médio. Já havia feito embarques experimentais para os Emirados Árabes Unidos, mas nesta safra, além de reforçar as ações neste destino, também está embarcando para a Arábia Saudita, prospectando Omã, Barein e mirando a Rússia.

"São mercados com bom potencial, mas só teremos uma avaliação sólida após três ou quatro temporadas vendendo para lá", afirma Tholozan. O Oriente Médio deve representar 5% das exportações da Rasip em 2008, ante quase nada em 2007. A companhia deverá exportar 15% da produção que processou na safra 2007/08 (42 mil toneladas, mesmo volume da temporada anterior).

A atual conjuntura do segmento colabora para a diversificação. Na avaliação do presidente da ABPM, Pierre Nicolas, a migração para novos países tem dois motivos principais: o tamanho menor da fruta colhida nesta safra e o câmbio, que vem forçando reajustes em dólar para que a exportação seja rentável. A maçã da safra 2007/08, embora tenha qualidade de coloração, bom teor de açúcar e boa pressão - segundo as empresas, está bastante crocante, permitindo um bom período de armazenamento - , está menor do que na temporada anterior, o que dificulta a venda aos europeus, que preferem maçãs graúdas.

Além disso, em alguns dos novos mercados as empresas brasileiras conseguem negociações mais favoráveis, obtendo melhor rentabilidade do que na venda para a UE. Conforme a ABPM, enquanto o preço médio das vendas para a UE foi de US$ 0,66 o quilo no primeiro bimestre, Barbados, na América Central, por exemplo, pagou US$ 0,71. Para o Sudão, o preço, na média, ficou em US$ 1,14 o quilo. Em volume, a Ásia chamou a atenção no período, com a compra de 1,27 mil toneladas, ante 744 em igual intervalo de 2007. Na comparação, o Oriente Médio comprou 1,08 mil toneladas, ante 233.

Ao mesmo tempo em que essas regiões apresentaram crescimento, houve queda das exportações para a UE, que mesmo assim manteve a liderança. As vendas para o bloco saíram de 14,8 mil toneladas, nos primeiros dois meses do ano passado, para 11,7 mil. Para a Holanda, principal porta de entrada das maçãs brasileiras na Europa, o tombo foi de 6,7 mil para 3,5 mil toneladas. Assim, no total exportado, houve retração: 15,1 mil toneladas, contra 16,1 mil no primeiro bimestre de 2007.

Em 2007/08, a produção brasileira de maçãs deverá atingir 840 mil toneladas, 80 mil das quais para exportação, segundo Nicolas. O presidente da Sociedade Brasileira de Fruticultura, José Luiz Petri, espera colheita de 800 mil a 850 mil toneladas e as mesmas 80 mil para exportação. Em 2006/07, a safra nacional rendeu 993,2 mil toneladas, de acordo com a ABPM. A expectativa dos produtores é que a menor oferta nesta safra eleve os preços de comercialização.

b) País exporta gado de reprodução para Angola

Cerca de 30 anos de guerra civil em Angola dizimaram não só dezenas de milhares de vidas humanas - os rebanhos de animais de criação do país também foram praticamente exterminados. Agora, quando o país africano de língua portuguesa vive um período de reconstrução, o Brasil ajuda a repovoar seus plantéis de gado bovino.

A Muguidjana Agropecuária, que no ano passado exportou 3.300 bovinos para o país, todos animais de reprodução, manda esta semana outro navio para Angola. Desta vez , serão 1.600 bovinos, sendo 34 touros e o restante novilhas, que sairão do porto paulista de São Sebastião.

De acordo com o gerente técnico e comercial da Muguidjana Frederico Alberto Rosseto, os animais, de reprodução, terão como destino duas fazendas do grupo em Angola, uma na província de Kuanza Sul e outra em Malange. O objetivo é repovoar o rebanho angolano.

"A guerra praticamente dizimou o rebanho do país. Estamos ajudando a repovoar o plantel", disse o executivo da Muguidjana, que pertence à holding de capital português Thanda Vantu SGPS, com atuação também em Moçambique, na África, e está no Brasil desde 2002. "Esses animais servirão de base para o rebanho", acrescentou Rosseto.

Os bovinos que irão Angola são provenientes da fazenda do grupo em Glicério, no interior de São Paulo, onde se faz melhoramento genético. Em sua maioria, são animais da raça Nelore, mas há também bovinos das raças Brahman, Guzerá e Tabapuã.

Segundo Rosseto, o Nelore se adapta ao clima de Angola, que é parecido com o do Brasil.

Em Angola, o rebanho bovino é da raça conhecida como gentio, que se caracteriza pelos chifres grandes. Outro efeito da guerra, diz Rosseto, é que Angola tem de importar quase toda carne bovina que consome - a maior parte é proveniente da África do Sul.

O plano da Muguidjana Agropecuária é fazer mais três embarques no segundo semestre deste ano, o que somaria outros 4.800 animais. O projeto da empresa é, segundo Rosseto, atingir a exportação de 10 mil animais por ano para Angola e um total de 50 mil bovinos em cinco anos.

Num segundo momento, afirma, a intenção é atuar em Angola também na engorda de gado comercial para corte. No Brasil, a Muguidjana tem quatro fazendas onde produz gado bovino para abate (no Mato Grosso e no Mato Grosso do Sul), além da unidade de melhoramento genético em Glicério.

De acordo com o gerente técnico e comercial, 83 caminhões estão saindo da fazenda em Glicério rumo ao porto de São Sebastião, e a viagem até Angola deve durar 13 dias.

Júlio César Spegiorin, coordenador de território Merial Saúde Animal, responsável pelo planejamento sanitário da Muguidjana, afirma que todos os animais que irão para Angola receberam certificação de sanidade para exportação. Antes da viagem, foram submetidos a uma quarentena, na qual houve manejos sanitários preventivos para garantir a saúde, a adaptação na África e eliminar a probabilidade de doenças.

c) Venda de café segue acelerada no Brasil

Os cafeicultores brasileiros comercializaram 83% da safra 2007/08 até o final de fevereiro, segundo levantamento feito pela consultoria Safras&Mercado. O ritmo de negociação está mais acelerado que no mesmo período do ciclo passado, quando 72% do total tinha sido escoado.

A Safras estima que a colheita de café deve ficar em 37,1 milhões de sacas de 60 quilos. Os números estão acima dos volumes projetados pela Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), de 33,7 milhões de sacas.

No mês de fevereiro, as negociações ganharam maior ritmo, com a forte movimentação dos produtores para fixar os preços. A recuperação das cotações do grão na bolsa de Nova York estimulou essas operações. A menor oferta, por conta da bianualidade da safra, também colaborou para o maior escoamento da produção de café.

Entre janeiro e fevereiro, o volume de exportações também foi aquecido, o que também justifica o maior escoamento da produção. Os exportadores estimavam uma queda expressiva nos embarques, por conta do ano de menor colheita, mas os embarques neste primeiro bimestre ficaram em 4,353 milhões de sacas, ligeira queda de 2,7%, de acordo com o CeCafé (Conselho dos exportadores de Café do Brasil). Os exportadores foram compradores neste início de ano para garantir o produto para futuros embarques.

Para a colheita 2008/09, o mercado estima safra de quase 50 milhões de sacas. A Conab, contudo, prevê uma produção e entre 41,3 milhões e 44,2 milhões de sacas.

d) Cotação do boi em dólar é a maior em 37 anos no país

Já foi o tempo em que se falava em arroba do boi gordo na casa dos US$ 20 no Brasil. Este mês, o boi alcançou US$ 45,34 em São Paulo, mercado de referência no país, segundo a Scot Consultoria. O valor, nominal, é o maior desde 1970, quando teve início a série histórica da Scot, que tem também dados do Instituto de Economia Agrícola (IEA).

Para chegar ao valor em dólar, a consultoria considerou o preço médio do boi gordo em março (até dia 17), de R$ 76,45 e um dólar médio no mês de R$ 1,686.

De acordo com Fabiano Tito Rosa, analista da Scot, a forte valorização da arroba em reais - por causa da mudança no ciclo de produção do boi, que reduziu a oferta - e a queda do dólar em relação ao real explicam o novo quadro. Nos últimos 12 meses até ontem, o dólar se desvalorizou 18,7% ante a moeda brasileira, conforme o Valor Data.

O preço maior do boi em dólar afeta principalmente os exportadores de carne, já que a matéria-prima responde por 80% dos custos de produção dos frigoríficos, observa Tito Rosa. "O boi está subindo em dólar, mas a carne exportada não sobe com a mesma intensidade".

Em relação a março de 2007 - quando o valor da arroba estava em US$ 27,15 - a alta do boi foi de 67%. Entre fevereiro de 2007 e o mesmo mês deste ano, porém, a carne bovina in natura exportada pelo Brasil subiu 37%, saindo de US$ 1.871,95, em média, para US$ 2.561,25 por tonelada (equivalente carcaça), informa a Scot. Os meses de comparação são diferentes porque os dados de fevereiro são os últimos disponíveis para as exportações de carne bovina.

Historicamente, a arroba do boi ficava entre US$ 20 e US$ 25, mas já atingiu US$ 31,60 ano passado, segundo a AgriPoint Consultoria. Nos atuais US$ 45,34, já figura entre as mais caras do mundo, à frente de Argentina (US$ 33,31), Uruguai (US$ 39,00), Paraguai (US$ 38,70) e Austrália (US$ 36,30), conforme a Scot. Ainda está bem atrás dos US$ 60,57 da arroba do boi nos EUA, preço médio apurado em fevereiro pelo Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA). Mas diante da oferta apertada e dólar fraco, Tito Rosa avalia que que o preço em dólar no Brasil "pode encostar nos US$ 60".

Miguel da Rocha Cavalcanti, da AgriPoint, observa que até o ano passado o preço da arroba no Brasil era inferior, em dólar, ao do Uruguai e não era muito diferente do valor na Argentina. Acontece que por aqui o ajuste na pecuária e a desvalorização do real têm sido mais fortes que nesses países.

Para se ter uma idéia do tamanho do ajuste - provocado pelo descarte de matrizes nos últimos anos - , em janeiro passado, o abate de bovinos certificado pelo SIF - Serviço de Inspeção Federal, caiu 19% sobre o mesmo mês de 2007, para cerca de 1,8 milhão de cabeças, informa Cavalcanti. "Os frigoríficos se expandiram, a demanda cresceu, mas a oferta [de gado] diminuiu", comentou.

Mercosul

a) Missão traz 120 empresários argentinos ao Brasil

Uma missão de 120 empresários argentinos desembarca na próxima semana em São Paulo para um encontro com empresários brasileiros na sede da Federação das Indústrias do Estado (Fiesp). No programa, um seminário - no qual serão debatidos temas da conjuntura econômica - apresentação de "cases" de sucesso e, ao final, uma rodada de negócios que, estima-se, envolverá quase 800 reuniões. Também deverá ser assinado um acordo para o desenvolvimento conjunto de softwares.

É uma das maiores missões empresariais em quantidade de participantes procedente da Argentina para o Brasil, e a primeira iniciativa de uma política comum de coordenação de comércio, acertada pelos dois governos, durante a última visita do presidente Luiz Inácio Lula da Silva à presidente Cristina Fernández de Kirchner, em fevereiro. O acordo entre Lula e Cristina, prevê ainda uma estratégia conjunta para a importação de terceiros mercados e de defesa comercial, segundo informou o Secretário Executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho.

A missão empresarial é organizada por autoridades da província (Estado) de Buenos Aires, mas inclui participantes de outras províncias, entre elas Mendoza, Córdoba, Santa Fé e Rio Negro. Os setores com maior representatividade serão os de alimentos (23,7% das empresas), cosméticos e artigos de limpeza (11,25%). A importância da missão pode ser avaliada pela "comissão de frente", liderada pelo ministro das Relações Exteriores, Jorge Taiana e pelo governador da província, Daniel Scioli, que faz sua primeira viagem oficial ao exterior desde que se elegeu para o cargo em outubro do ano passado.

Scioli terá um almoço na quarta-feira com o governador de São Paulo, José Serra, no Palácio dos Bandeirantes, no qual devem discutir acordos de cooperação, adiantou ao Valor o subsecretário de Promoção de Investimentos, exportações e Cooperação Internacional da Província de Buenos Aires, Alfredo Atanasof.

Com o crescimento econômico dos dois países, o comércio bilateral está batendo todos os recordes. Em 2007, a corrente de comércio (soma das exportações e importações) atingiu US$ 25 bilhões, US$ 5 bilhões acima do projetado por ambos os governos no início do ano, e 25,4% superior ao registrado em 2006. Para 2008, a estimativa é ultrapassar os US$ 30 bilhões.

"O Brasil é o principal destino das exportações argentinas e também da província", disse Atanasof. Para ele, mais do que o "fortalecimento de vínculos comerciais", a visita tem um forte "caráter institucional", com a presença das autoridades dos dois níveis de governo.

A missão também tem o objetivo de começar a reverter a desvantagem da Argentina no comércio com o Brasil. Em 2007, a Argentina exportou para o Brasil um total de US$ 10,4 bilhões e importou US$ 14 bilhões. Ou seja, o comércio bilateral é amplamente favorável ao Brasil, que registrou superávit de US$ 4 bilhões, US$ 321 milhões acima de 2006. Do total exportado para o Brasil, quase 80% são gerados na capital e na província de Buenos Aires.

A vantagem brasileira tem preocupado os argentinos que, ao mesmo tempo em que compram mais do Brasil, vêem diminuir seu espaço de vendas no mercado brasileiro para os chineses. Além disso, a Argentina compra muito mais produtos industrializados (95,9% da pauta) do que vende (72,3%). Os cinco produtos que o Brasil mais vende à Argentina são automóveis de passageiros, autopeças, aparelhos transmissores e receptores, veículos de carga e petroquímicos.

No topo da lista de produtos adquiridos dos argentinos estão trigo e combustíveis, embora as vendas de automóveis, autopeças e veículos de carga tenham crescido significativamente. "Queremos equilibrar a balança comercial com o Brasil", afirmou Atanasof.

Do lado brasileiro, o encontro na Fiesp será conduzido por Roberto Giannetti da Fonseca, diretor titular do Departamento de Relações Internacionais e Comércio Exterior da Fiesp, por Benjamim Steinbruch, 1º vice-presidente da entidade.

b) Mercosul e UE podem retomar negociações

As negociações para a criação de um acordo bilateral entre o Mercosul e a União Européia poderão ser retomadas em Lima, em encontro ministerial no dia 16 de maio. Essa é a expectativa de Fabian Delcros, conselheiro e chefe da seção para assuntos comerciais da União Européia, e de Evandro Didonet, diretor do Departamento de Relações Internacionais do Ministério de Relações Exteriores. Os dois participaram em seminário sobre o euro em São Paulo.

"Temos interesse em chegar a um acordo com o Mercosul e vamos relançar o debate em Lima", disse o representante da UE. Ele disse que com a crise atual, a garantia de acesso a mercados de commodities de grande tamanho, como da zona do euro, é fundamental ao Brasil. Ele disse estar pessimista com as rodadas de negociação da Organização Mundial do Comércio (OMC).

Ele acrescentou que o debate com o Mercosul pode fluir se o Brasil realmente mostrar sua liderança. Outra condição para o debate é que fique claro que a UE não pode fazer tantas concessões em um acordo bilateral quando faria em um acordo mais amplo, multilateral. O presidente da Confederação Nacional da Indústria, Armando Queiroz Monteiro, disse que a vontade da indústria é que um acordo de livre comércio entre o Mercosul e a União Européia seja fechado o quanto antes, para criar um ambiente mais propício aos negócios.

Organização Mundial do Comércio (OMC)           

a) Acordo na OMC seria bom para o Brasil

Uma reunião entre ministros de Comércio, em maio, poderá ser a última chance para se chegar a um acordo, ainda este ano, na Rodada de Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). Faço parte do time que torce pelo fechamento do acordo, embora, neste momento, a probabilidade de ele sair seja menor do que seu adiamento. Para o Brasil o adiamento não é uma boa solução.

Sem julgar as escolhas feitas pelo governo, o fato é que a negociação multilateral da OMC emperrou a política comercial do Brasil. O governo atual deixou claro que as ações de política comercial com foco em acordos bilaterais só terão vez quando a negociação da OMC acabar. Não fechar um acordo nos próximos meses significa adiar, no mínimo, até o final do mandato do presidente Lula, ações mais agressivas em negociações bilaterais.

Os defensores do adiamento se apegam à negociação de produtos industriais. O argumento é que a redução das tarifas vai trazer prejuízos para certos setores da indústria brasileira. Perdas para certos setores acontecem em negociações internacionais. No entanto, desde que o balanço de ganhos para sociedade brasileira seja positivo e equilibrado, maior competição internacional em certos setores não é razão suficiente para trabalharmos pelo adiamento do acordo.

Uma das formas de avaliar se a negociação está equilibrada é comparar os resultados em agricultura, setor em que o Brasil é ganhador líquido, e em produtos industriais, em que estão os poucos setores defensivos e os não dispostos a ver seu mercado ameaçado por novos competidores. Aqui, mais uma vez, não há razões para buscarmos um adiamento na conclusão da rodada.

Mesmo reconhecendo que o chamado "nível de ambição" - que no jargão dos diplomatas significa a profundidade da abertura comercial - da negociação agrícola foi reduzido de forma significativa, o acordo ainda trará ganhos importantes para o comércio agrícola mundial e para o setor agrícola brasileiro. Paralelamente, e é preciso reconhecer que o Itamaraty está atuando muito bem nesse campo, o nível de ambição da negociação de abertura dos produtos industriais também já foi reduzido significativamente. Isso quer dizer que as concessões na indústria, assumindo argumento de que uma maior abertura não é necessariamente boa para certos setores, serão condizentes com os ganhos agrícolas.

Um acordo balanceado entre agricultura e indústria é apenas uma das razões que me colocam no time dos torcedores pelo acordo. Há razões relacionadas ao mercado de produtos agrícolas que são ainda mais importantes. A negociação agrícola está baseada em dois pilares: aperfeiçoamento das disciplinas e abertura de mercados. Os mais importantes ganhos dessa rodada virão no aperfeiçoamento das disciplinas.

Aperfeiçoar as disciplinas significa reduzir a liberdade dos países de usarem subsídios que afetam negativamente o comércio mundial, provocando queda nos preços ou deslocando exportadores. Distorções dessa natureza são regra nos produtos agrícolas. A União Européia ainda exporta carnes de frango e bovina fazendo uso de subsídios às exportações. A Índia dá subsídios às exportações de seus produtores de açúcar. Um acordo na Rodada de Doha levará à eliminação desse tipo de subsídios.

Políticas internas também distorcem o mercado mundial. Os campeões nesse assunto são os EUA, que garantem um certo nível de preço aos seus produtores quando os preços mundiais estão muito baixos. Um produtor de soja norte-americano não precisa se preocupar com os preços porque, quando a soja está cotada abaixo de US$ 230/tonelada, o governo garante o equivalente a esse valor ao produtor. É claro que nestes tempos de soja com preços acima de US$ 400/tonelada tendemos a esquecer que entre 1999 e 2002, quando os preços estavam muito baixos, a área plantada nos EUA crescia, derrubando ainda mais os preços.

Infelizmente, a Rodada de Doha ainda não trará a boa notícia da eliminação desse tipo de subsídio, mas criará uma importante disciplina: um teto por produto. Em 2000, ano recorde de subsídios para soja nos EUA, enquanto os preços mundiais estavam em US$ 180/tonelada, os produtores norte-americanos chegaram a receber mais de US$ 230/tonelada, ou seja, US$ 50 em subsídios. Após a rodada, o valor máximo será de US$ 25. No caso do algodão, o teto por produto vai praticamente eliminar os subsídios. É por causa do algodão que os EUA têm afirmado que não é preciso ter pressa para fechar a rodada.

É no pilar de acesso a mercados que o nível de ambição está mais comprometido. Diversos produtos terão suas tarifas reduzidas por cortes muito baixos, porque serão selecionados como itens sensíveis. Nesses produtos, a abertura de mercado se dará por meio de cotas, o que interessa pouco ao Brasil. Esse é o nosso contencioso com os europeus, que relutam em aumentar suas cotas de carnes (bovina, suína e de aves), mesmo sabendo que a produção doméstica está caindo. Não devemos esquecer que parte dos produtos industriais também pode ser selecionada como sensível. Neste caso, um país em desenvolvimento pode isentar de redução até 10% do número total de tarifas.

Do lado dos países em desenvolvimento, nossa maior preocupação é com o novo mecanismo de salvaguardas. Brasil e outros exportadores cometeram o deslize de aceitar, no lançamento da rodada, em 2001, a criação dessas salvaguardas. O objetivo agora é garantir que elas não acarretem aumento do nível de proteção. Garantido isso, teremos conseguido administrar o erro cometido lá atrás.

Se temos menos a ganhar do que o esperado em agricultura, temos pouco a perder na indústria. Adiar a conclusão da rodada vai ajudar os países que querem reduzir ainda mais o seu nível de ambição. Destravar a agenda comercial brasileira e pôr em prática novas disciplinas sobre subsídios são razões suficientes para se fechar um acordo ainda este ano.

b) OMC faz nova tentativa para fechar Doha antes das eleições nos EUA

O embaixador Roberto Azevedo, subsecretário-geral de assuntos econômicos do Itamaraty e principal negociador comercial do Brasil, perdeu a conta das viagens e articulações para reativar a Rodada Doha nos últimos tempos. Mas agora começa a ver uma "nesga de luz" para os países tentarem fechar um acordo agrícola e industrial, no mês que vem, na Organização Mundial do Comércio (OMC).

A tendência é de um acordo ser estruturado na área industrial, por exemplo, como um "cardápio, onde cada um escolhe seu prato", com a abertura do mercado adaptada a sua estrutura tarifária. Definido o tamanho dos cortes de tarifas e de subsídios, prazos para implementação dos compromissos, flexibilidades e exceções, os países partiriam para o calendário sobre cada alíquota no segundo semestre, além de tentar concluir os outros temas - serviços, regras (antidumping, subsídios), indicações geográficas, propriedade intelectual (Trips e biodiversidade).

Para Azevedo, se houver um acordo, o Brasil ganhará na negociação agrícola mais fatias para carnes, açúcar, soja, algodão, milho e outras commodities. Na área industrial, de um lado terá de fazer cortes em quase metade das tarifas de importação aplicadas, "mas cortes modestos e que podem ser absorvidos". De outro, terá flexibilidade adicional para proteger setores sensíveis, como automotivo, calçados, brinquedos e têxteis.

Em Genebra, persiste muita prudência. De um lado, por causa dos repetidos fiascos da negociação. Depois, os governos estão concentrados na crise financeira global. E as resistências continuam fortes em vários países. Os franceses aumentam o tom, contrariados com concessões que a União Européia (UE) estaria disposta a fazer para fechar um acordo.

Azevedo reconhece esse cenário, mas aponta duas mudanças na negociação desde fevereiro. Diz que "pela primeira vez" os EUA se comportam como quem quer encontrar um acordo em abril, para concluir a rodada antes que o presidente Bush deixe a Casa Branca, em janeiro de 2009. "Desde julho do ano passado era só discurso, mas agora o interesse americano é perceptível na mesa negociadora, apesar de ter seus limites", afirma.

Além disso, cresce o sentimento entre outros parceiros de que "estamos muito mais perto da hora da verdade". Há interesse em não deixar a rodada para mais tarde, e não correr o risco de um novo governo dos EUA tentar reabrir barganhas já negociadas. "Ao contrário da percepção popular, está havendo uma enxurrada de atividades entre os principais países para concluir um acordo", constata Martin Khor, um dos principais opositores da negociação global.

As delegações se concentraram, nas últimas semanas, em barganhas envolvendo duas questões prioritárias imediatas: a expansão de cotas agrícolas para produtos considerados sensíveis, e flexibilidades para os emergentes protegerem suas indústrias. Haverá cerca de 40 produtos agrícolas sensíveis. O corte tarifário desses produtos será apenas um terço do previsto pela fórmula que for aprovada. Se a redução na alíquota para carne bovina na UE for de 70%, sua redução fica em 23,3% como sensível. Mas a UE terá de compensar o exportador com cota (determinada quantidade com tarifa menor) ao produto.

A expansão da cota deve ser entre 4% a 6% do consumo doméstico do importador. A briga é como calcular essa expansão. Azevedo ilustra a dificuldade com o açúcar. A UE consome 17,4 milhões de toneladas por ano. Ocorre que o açúcar tem dezenas de linhas tarifárias - tem açúcar de cana, da beterraba, açúcar com cor, misturado com cacau, de confeitaria etc. Japão e Suíça, sobretudo, querem contabilizar só algumas linhas tarifárias. Alegam que açúcar usado em produto para exportação deve ficar fora do cálculo. Assim, a expansão da cota na UE seria calculada apenas pela metade das 17,4 milhões de toneladas. Para o Brasil, isso não tem o menor sentido.

O resultado é que cada produto sensível terá sua regra para a expansão da cota. Os países tentam definir o que é o produto básico, depois as linhas tarifárias de açúcar processado. Só então decidirão até onde o produto passou a ser chocolate, biscoito, alimentação para bebês. O cálculo pode ter impacto de milhões de dólares nos negócios. E se repete em todos os produtos.

Na área industrial, Azevedo nota que EUA e UE, durante meses, se recusaram a discutir flexibilidades adicionais para o Mercosul. Só quando o mediador industrial, Don Stephenson, apresentou novo texto industrial, com várias opções de cortes e flexibilidades adicionais para proteção industrial, por exigência dos emergentes, é que os americanos e europeus finalmente se dispuseram a negociar.

Na estrutura de "cardápio", o Brasil vai optar por mais linhas tarifárias protegidas. Isso implica corte cheio nas alíquotas em geral, mas apenas 50% desse corte para um maior número de setores industriais. Se o corte for de 50% para os produtos em geral, o país reduz em 25% em automotivo, calçados, brinquedos, têxteis etc.

A Índia tem posição diferente e vai optar por não fazer corte nenhum em 5% de suas tarifas industriais. O México, que faz 80% de seu comércio com um só país, os EUA, prefere outra combinação. Não quer flexibilidade adicional, e não ter de arbitrar quais indústrias se beneficiariam com a proteção. Prefere cortar menos em geral, e toda a indústria vai pagar igual a fatura da abertura. "O certo é que sem barganha entre indústria e agricultura, não podemos assumir maior esforço", reiterou Azevedo. Ele reuniu representantes do agronegócio e da indústria, na semana passada, em Brasília, e diz que a conclusão foi positiva.

Se houver entendimentos nos textos industrial e agrícola revisados no começo de abril, e o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, considerar que os textos tem apoio suficiente dos países, convocará ministros para a barganha final em meados do mês. Os ministros deverão permanecer em Genebra uma semana, pelo menos, na tentativa de evitar o fiasco total da rodada.

Plano Internacional

a) Juros altos e fragilidade dos EUA sustentam queda do dólar

A crise no mercado imobiliário americano, agravada na última semana com o risco de quebra do fundo Carlyle e os problemas de liquidez do Bear Stearns, garantiram uma pequena recuperação do dólar. A moeda encerrou a semana passada em alta de 0,63%, negociada a R$ 1,714. No entanto, nem mesmo a piora externa ou o pacote cambial anunciado pelo governo, conseguem alterar as previsões de queda do dólar no curto prazo.

As explicações para o movimento contínuo de desvalorização da moeda são inúmeras. Globalmente, o dólar perde valor como reflexo de problemas estruturais da economia americana, com sucessivos déficits em conta corrente e perdendo espaço mundialmente. No Brasil, a fraqueza diante do real é fruto, principalmente, dos juros elevados que estimulam o ingresso de capital especulativo.

Fatores estruturais também colaboram para fazer do Brasil um porto seguro - e rentável - para os estrangeiros. O país nos últimos anos registrou recordes de abertura de capital das empresas, graças ao amadurecimento do mercado de ações. Os indicadores de solvência do país, como as reservas internacionais elevadas, nunca foram tão bons. A estabilidade macroeconômica pós-real e as exportações fortes, se beneficiando do preço das commodities, também colaboram para atrair os dólares. O Brasil garante ganhos elevados ao estrangeiro de forma segura, sem os solavancos que marcavam a economia do país pré-real. Neste ano, o sexto seguido de depreciação do dólar, a queda acumulada chega a 4%.

- Nos primeiros meses deste ano, a desvalorização da moeda americana só não foi maior por conta da instabilidade global - diz Nathan Blanche, especialista em câmbio e sócio da Tendências Consultoria.

Enquanto no Brasil um investidor em renda fixa - risco baixo - ganha algo próximo da Selic, em 11,25% ao ano, nos Estados Unidos a taxa básica está em 3% e deve cair novamente na reunião do Fed marcada para amanhã.

Muitas vezes o ingresso de recursos no país ocorre via operações chamadas de carry trade - o investidor toma emprestado no Japão, por exemplo, a 0,50% e aplica a 11,25% no Brasil. O juro real brasileiro, a 6,70% ao ano, é o maior do mundo e tende a se distanciar ainda mais da taxa americana, referência no mercado financeiro global. Além de a expectativa ser de mais cortes na taxa dos Estados Unidos, a ata do último Copom alerta para o risco de uma elevação na Selic. Com a tendência de distanciamento das taxas, a enxurrada de dólares para o país não deve secar.

Sobe qualquer ângulo analisado, a tendência de baixa do dólar no curto prazo deve se manter.
- Se fizermos um exercício, deixando a economia parada com uma Selic a 11,25% e o BC não comprar o excesso de dólar, a moeda cai a R$ 1,40 em seis meses - estima Paulo Tenani, chefe de pesquisa do UBS Wealth Management. As medidas recentes do governo, acabando com a cobertura cambial e criando um IOF de 1,5% sobre aplicações de estrangeiros em títulos de renda fixa, não surtirão efeito. - Isso não terá reflexo no câmbio, talvez apenas eleve o juro pago no mercado de renda fixa local. As duas melhores soluções são, pela ordem, o BC cortar a Selic a 9% ou continuar a intervir no mercado cambial.

A queda do dólar frente ao real também é estimulada por um movimento global de depreciação da moeda americana. Nas últimas semanas, o dólar tem batido recordes históricos de baixa frente ao euro e ao iene. Se por um lado a perda de valor da moeda reflete a desconfiança em relação à economia americana, com os chamados déficits gêmeos - comercial e fiscal - por outro pode ajudar a corrigir a rota do país. No ano passado, o déficit em conta corrente chegou a 6% do PIB americano, nível considerado inaceitável. Em 2001, era de 2,5%.

Segundo a Austin Rating, a participação dos emergentes no PIB mundial saltou de 14,7% nos anos 1980, para 19,8% entre 2001 e 2007. O crescimento da presença do Bric - Brasil, Rússia, Índia e China - é ainda mais expressivo, com 10,4% de participação nos anos 2000, o dobro do registrado na década de 1980.

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