Comércio Exterior
a) EUA renovam programa que reduz tarifas para o Brasil
O Congresso dos Estados Unidos renovou os benefícios do Sistema Geral de Preferências (SGP), sem restrições, até o dia 31 de dezembro de 2009. Os empresários brasileiros, no entanto, já estão preocupados com a próxima etapa, pois o governo americano prometeu uma ampla reforma de seus sistemas de preferência de comércio para países pobres no próximo ano.
O programa, que reduz as tarifas de importação para alguns produtos, beneficiou quase 14% das exportações brasileiras para os EUA em 2007, o equivalente a US$ 3,4 bilhões. A importância do SGP para o país já foi maior. Em 1997, 23% dos embarques brasileiros para o maior mercado do mundo usufruíram dos benefícios, conforme dados da United States International Trade Comission (USITC).
Também foi aprovado pelo Congresso dos Estados Unidos a renovação dos programas de preferências tarifárias para os países andinos. Para Colômbia e Peru, o benefício foi estendido por mais um ano. Para Bolívia e Equador, apenas por seis meses. Os EUA ameaçam retirar os dois países do programa, por conta de atritos políticos.
A Bolívia, presidida por Evo Morales, expulsou o embaixador americano. Já o Equador teve problemas com petroleiras dos EUA. Apesar da renovação por seis meses, a ameaça não diminuiu. O governo dos EUA abriu uma audiência pública para avaliar a exclusão da Bolívia. O programa de preferências tarifárias para os países andinos é mais abrangente que o SGP, mas também exige contrapartidas mais rígidas, incluindo o controle do tráfico de drogas.
Uma das exigências do senador republicano de Iowa, Charles Grassley, que é líder da minoria do poderoso Comitê de Finanças do Senado dos EUA, foi um acordo com os democratas, que garante a discussão de uma ampla reforma do SGP em 2009. Para Grassley, o programa perdeu o sentido, porque não beneficia os produtos dos países pobres, mas apenas os grandes emergentes como Brasil e Índia.
Segundo Diego Bonomo, diretor-executivo do Brazil Information Center (BIEC), em Washington, o Congresso americano já possui uma base técnica consistente para um ampla reforma. "Se fizermos um trabalho de lobby intenso, como aconteceu nos últimos dois anos, podemos manter os benefícios, mas talvez nossa lista seja reduzida."
A rapidez dessa renovação do SGP surpreendeu positivamente os brasileiros, que acreditavam que só haveria alguma decisão depois das eleições. Para os empresários, a mudança de postura do Brasil na Rodada Doha, da Organização Mundial de Comércio (OMC), deixou os americanos mais simpáticos ao país.
b) Semp Toshiba suspende venda por alta do dólar
A Semp Toshiba suspendeu ontem a venda de seus produtos para os fornecedores no Brasil. A decisão foi tomada pela alta volatilidade do mercado, principalmente da cotação do dólar, disse o vice-presidente de Marketing e Vendas, Caio Ortiz.
"Temos hoje um dólar 40% maior que em menos de 30 dias. Tínhamos a projeção de que o dólar terminaria o ano abaixo de R$ 1,90. Com a cotação a R$ 2,20, temos que refazer nossas contas."
Como mais de 90% dos produtos da Semp Toshiba contam com componentes importados, a empresa terá que avaliar de que forma vai repassar os custos elevados pela alta do dólar. "A minha expectativa é que ainda nesta semana voltaremos a vender os produtos, mas com um reajuste significativo de preços", diz Ortiz.
Para ele, o aumento de preços dos produtos, somado a uma conjuntura de restrição ao crédito e juros elevados, deve obrigar a Semp Toshiba a reduzir sua projeção de crescimento para este ano -de 10%. "O setor de eletroeletrônicos vai sofrer mais com essa crise que outros que operam com produtos mais nacionais."
c) Dólar tem maior alta em quase dez anos
Com a intensificação do movimento de fuga de capitais observado no mercado financeiro brasileiro há algumas semanas, o dólar comercial chegou a R$ 2,198, na sua maior valorização em um único dia desde 29 de janeiro de 1999: 7,42%.
À saída dos estrangeiros, que tiram seus recursos do país tanto para cobrir perdas sofridas com a crise em outras partes quanto para colocá-los em ativos mais seguros, somou-se a aposta, por parte de alguns bancos e corretoras, em uma alta ainda maior da moeda americana.
"A cada dia surgem novos problemas em outros países, o que gera uma insegurança generalizada e uma grande aversão ao risco", afirma Mário Paiva, analista de câmbio da corretora Liquidez.
Na cotação máxima do dia, o dólar chegou a R$ 2,202, e o valor de fechamento é o maior desde 22 de setembro de 2006.
A realização, pelo Banco Central, de um leilão de "swap" cambial não foi suficiente para acalmar os ânimos. A operação, que havia dois anos e meio não era vista, equivale a uma venda de dólares no mercado futuro. Consiste na oferta de contratos que protegem contra a variação cambial em determinado período -no caso, até 3 de novembro, quando os papéis vencem- em troca dos quais os compradores pagam ao BC a variação dos juros.
Foram colocados à disposição dos bancos US$ 2,1 bilhões em 41,6 mil contratos. No entanto, somente 29,5 mil, totalizando US$ 1,468 bilhão, foram vendidos.
Embora o mercado estivesse faminto pela moeda americana, a oferta não foi totalmente absorvida por causa da dificuldade em prever mesmo o cenário de curto prazo. Com medo de assumir compromissos, os bancos simplesmente preferiram não comprar os contratos e analisar melhor as perspectivas, acreditando que o BC deve continuar intervindo para garantir liquidez ao mercado de câmbio. Uma outra parte dos bancos pediu uma proteção exagerada, e então o negócio simplesmente não foi fechado.
"A única forma de resolver a situação definitivamente é restabelecer a confiança dos investidores e agentes no sistema financeiro internacional. Enquanto isso, o governo brasileiro vai ter de ser mais rápido em tomar medidas para equilibrar o mercado, oferecendo linhas de crédito para os exportadores", afirma Miriam Tavares, diretora de câmbio da corretora AGK.
"Uma outra providência interessante seria mandar operadores do próprio BC às mesas dos bancos para conversar com o pessoal, tentar entender o que está acontecendo e fornecer a solução adequada."
O giro financeiro no câmbio à vista ficou perto dos US$ 2 bilhões usuais. "Somente as empresas que precisavam, por vencimento, quitar alguma obrigação ontem o fizeram", diz João Medeiros, diretor da corretora de câmbio Pioneer. "As negociações ficaram paralisadas. A taxa subiu tanto que quem precisa comprar não compra e quem tem dólares para vender resolve esperar para ver se consegue um valor melhor", afirma Francisco Gimenez Neto, diretor operacional da corretora NGO.
O anúncio de que o BC vai ajudar os exportadores utilizando dinheiro do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) e das reservas internacionais saiu praticamente no final do dia, sem tempo hábil para repercutir. A medida deve ajudar a reduzir a pressão, mas as expectativas para os próximos dias ainda é de nervosismo. "Os fundamentos da economia brasileira seguem bons, então vamos esperar que o bom senso prevaleça", diz Tavares.
d) BC usará reservas para financiar exportadores
Na tentativa de acalmar os mercados num dia de perdas recordes na Bovespa, o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e o presidente do Banco Central, Henrique Meirelles, fizeram um pronunciamento às pressas para mostrar aquilo que chamaram de "solidez" da economia brasileira e anunciar medidas de apoio às exportações.
Esse apoio ocorrerá de duas maneiras. Uma delas será feita por meio do BC, que irá repassar parte dos recursos das reservas internacionais do país para bancos que financiem o comércio exterior brasileiro. A outra será determinar ao BNDES que libere mais R$ 5 bilhões para linhas de crédito voltados a empresas exportadoras.
No caso do BC, a novidade será a maneira como a medida será implementada: por meio de leilões, o BC irá conceder empréstimos a bancos que financiam exportações no Brasil. Em troca, esses bancos deverão entregar, como garantia, um valor equivalente ao do empréstimo em títulos negociados no mercado internacional.
Só poderão participar desse leilão bancos que operem com comércio exterior. Nem Mantega nem Meirelles disseram o valor a ser repassado aos bancos ou a data dos leilões. "Vai ser na medida do necessário", disse Meirelles. As reservas internacionais do Brasil estão em cerca de US$ 206 bilhões.
Meirelles também não soube dizer quais títulos serão aceitos como garantia: se limitou a informar que papéis emitidos pelo governo brasileiro no exterior estarão entre os papéis a serem incluídos na transação e prometeu mais detalhes.
Em relação ao BNDES, os R$ 5 bilhões ao financiamento de exportações fazem parte de um pacote de R$ 15 bilhões que o Tesouro Nacional já havia prometido injetar no banco estatal. O dinheiro será aplicado nas linhas do BNDES chamadas de "pré-embarque", que atendem a todas as empresas que operam no país, mas dão preferência às micro e pequenas. Por meio dessas linhas, o banco concede empréstimos aos exportadores do embarque da mercadoria vendida.
Quando a entrevista foi anunciada a Bovespa registrava queda de 12%, e o "circuit breaker", mecanismo que interrompe o pregão em caso de variação muito brusca, já havia sido acionado duas vezes.
Nem Meirelles nem Mantega responderam a perguntas dos jornalistas, e boa parte do pronunciamento consistiu numa tentativa de transmitir tranqüilidade. "O Brasil não está imune. É uma crise global, que atinge mais os países mais fragilizados e menos os mais sólidos, como o Brasil", disse Mantega. "Sairemos dessa fase aguda, embora a crise vá continuar. Talvez a maior desde 1929. Na fase aguda, fica tudo pior. Com a desconfiança total, o mercado cai na irracionalidade e no comportamento de manada."
O ministro disse ainda que espera que a oferta de financiamentos para o Brasil deva se normalizar, embora com juros mais altos do que os praticados antes da crise.
"Quando os governos todos tomarem as providências necessárias, haverá reconstituição das linhas de crédito que secaram. Isso se dará em um patamar de menos crédito e com taxas mais elevadas."
Meirelles seguiu a mesma linha: "É a grande vantagem de o Brasil ter adotado uma política conservadora, prudente: neste momento, temos recursos suficientes para enfrentar uma crise que afeta a todos. Temos recursos suficientes para enfrentá-la com serenidade".
Ele também citou as medidas tomadas pelo BC nas últimas semanas para combater os efeitos da crise no Brasil como sinal de que o governo está atento ao agravamento da situação. Entre as iniciativas citadas, estavam as mudanças nas regras do recolhimento compulsório dos bancos e os leilões de dólares feitos pelo BC no mercado de câmbio.
e) Amorim defende ampliação de comércio com AL e Caribe
O ministro das Relações Exteriores Celso Amorim defendeu a ampliação do comércio do Brasil com a América Latina e com o Caribe como forma de diminuir os efeitos da crise financeira mundial. De acordo com Amorim, nenhum país vai conseguir se blindar contra a crise econômica, mas pode diminuir o impacto dos problemas. Para isso, no caso brasileiro, ele sugere a expansão do mercado interno e das relações comerciais, principalmente, com a América Central, por exemplo.
Hoje temos que fazer isso (expandir), não só com o mercado interno, mas também com a América Latina e com o Caribe, a América do Sul em primeiro lugar. Vamos enfrentar a crise, porém vamos sofrer muito menos do que sofreríamos em outras situações, disse.
Amorim lembrou que há cinco anos o Brasil foi criticado ao defender a diversificação da balança de exportações. À época, os Estados Unidos eram o principal comprador do Brasil e atualmente o país recebe menos de 15% das exportações brasileiras. Quando dizemos que tínhamos uma estratégia de diversificar o mercado brasileiro, isso era visto com desprezo, ceticismo. Agora estamos colhendo os benefícios, afirmou.
Segundo Celso Amorim, América Latina e Caribe importam 26% dos produtos exportados pelo país, sendo 90% deles industrializados. O chanceler formalizou a entrada do Brasil como membro observador do Sistema de Integração Centro-América (Sica), equivalente ao Mercosul da América Central. Com o acordo, o Brasil pretende não só fortalecer parcerias econômicas, mas também trocar tecnologia e ações de combate à fome e à pobreza
f) BNDES prevê crédito normal em 3 meses
O presidente do BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), Luciano Coutinho, afirmou que espera a normalização do crédito para o setor exportador em até três meses. O banco detalhou as condições da linha de financiamento para pré-embarque, que receberá recursos adicionais de R$ 5 bilhões para tentar suprir a escassez de crédito.
Coutinho destacou que o papel do banco no suporte às exportações é complementar. Uma parcela expressiva do mercado é regida por adiantamentos de contratos de câmbio (os chamados ACCs), mecanismo em que as instituições financeiras adiantam recursos ao exportador e ele se compromete a entregar divisas à instituição após o embarque da mercadoria.
O banco triplicou para US$ 150 milhões o limite de tomada de crédito para o setor de bens de consumo. O teto foi definido para evitar que uma só empresa obtenha a maior parte do montante disponível. Há também recursos para o setor de bens de capital e fabricação de caminhões e tratores.
De janeiro a agosto deste ano, o banco desembolsou cerca de US$ 3,5 bilhões para exportações. Segundo Coutinho, com a injeção extra de recursos, a estimativa para os desembolsos nessa área em 2008 passa de US$ 6 bilhões para um valor em torno de US$ 8 bilhões.
Apesar da oferta maior de recursos para o setor, o banco está oferecendo empréstimos com juros mais altos. Segundo Coutinho, é um reflexo do aumento do custo para o "funding" do banco. De modo geral, o exportador pode optar entre financiamentos em real, com taxa de 15% mais "spread" (diferença entre a taxa que o banco paga para captar recursos e a que repassa ao cliente) do agente financeiro ou uma taxa de cerca de 8% mais "spread" do agente para operações em dólar.
Na segunda opção, o tomador fica sujeito ao risco de variação da moeda americana.
O banco manteve a TJLP (Taxa de Juros de Longo Prazo) para os empréstimos de exportações a setores de equipamentos industrias, infra-estrutura e equipamentos aeronáuticos.
Mesmo após a forte alta do dólar, que fechou cotado a R$ 2,31, Coutinho afirmou que o câmbio não se sustenta no patamar atual.
"O câmbio atual está refletindo um momento de grande tensão no sistema de crédito mundial. Esse momento não pode perdurar indefinidamente, senão pode quebrar a economia mundial toda. Isso é um processo de alta tensão que em algum momento vai se resolver. A pressão está muito forte na Europa. Até o novo governo tomar posse nos Estados Unidos e ter capacidade de implementar uma política mais ampla para atacar a questão da crise financeira, ainda teremos um período de tensão financeira grande, mas não nesse patamar de gravidade", disse.
Segundo Coutinho, os pedidos de financiamento no banco ainda não foram afetados pela crise. Segundo Coutinho, é necessário ainda avaliar a eficácia das medidas anunciadas pelo Banco Central na segunda-feira para evitar um processo de contaminação da economia.
Coutinho ressalta ainda que é preciso considerar os efeitos de uma recessão nos países desenvolvidos, a intensidade dela e as conseqüências para o comércio internacional.
"O que parece hoje bastante realista é que, dada a gravidade da crise nos países desenvolvidos, a recuperação do sistema bancário financeiro nas economias desenvolvidas tenderá a ser um processo lento", disse.
g) Disparada do dólar paralisa negócios entre empresas
A abrupta desvalorização do real provocou paralisação nos negócios entre fornecedores de matérias-primas, indústrias e comércio e atingiu as exportações, as importações e as vendas no mercado interno.
Fabricantes de produtos eletroeletrônicos, como TVs, DVDs e computadores, de bens de capital e de alimentos estão com dificuldades para definir preços por conta da forte variação da taxa de câmbio -nas últimas três semanas, a desvalorização do real em relação ao dólar chegou a 21%.
"Ninguém consegue fazer preço neste momento, e o setor vive uma espécie de estagnação. A desvalorização do real foi muito violenta, e fica difícil estabelecer preços de venda", afirma Lourival Kiçula, presidente da Eletros, associação da indústria eletroeletrônica.
A atitude da Semp Toshiba de parar temporariamente de vender seus produtos, segundo Kiçula, foi sensata. "É preciso parar para reavaliar os negócios. Vale ou não a pena importar tal produto ou tal componente? É isso que as empresas avaliam neste momento", diz.
Humberto Barbato, presidente da Abinee, associação da indústria elétrica e eletrônica, diz que, além de ter dificuldade para estabelecer preços de venda para o mercado interno, as empresas não conseguem exportar porque não sabem que taxa de câmbio devem utilizar.
E quem quer exportar tem dificuldade para enviar os produtos para o exterior por conta da restrição de linhas de crédito para realizar os chamados ACCs (Adiantamentos de Contrato de Câmbio).
"As linhas de crédito secaram. Quem tem dinheiro para continuar operando está bem.
Quem não tem pode ter de parar a produção", afirma José Augusto de Castro, vice-presidente da AEB (Associação de Comércio Exterior do Brasil).
Os produtos manufaturados, segundo Castro, são os que mais sofrem neste momento com a variação da taxa de câmbio. "Estamos próximos do Natal, um período em que as exportações de manufaturados se intensificam", afirma.
O presidente da Abinee diz que as empresas só estão vendendo neste momento o que já está produzido. "Os novos negócios estão paralisados. Os empresários não sabem que taxa de câmbio devem utilizar."
A Marcopolo, multinacional fabricante de carrocerias de ônibus, é uma das empresas que enfrentam dificuldades agora para definir preços.
"A taxa de câmbio é um problema para a formação de preço de qualquer produto que se compra ou que se vende neste momento", afirma Ruben De la Rosa, diretor-presidente da Marcopolo. Para ele, a desvalorização do real favorece o exportador, mas não quando ocorre de forma tão brusca.
"A primeira preocupação é a de que evidentemente qualquer flutuação do câmbio exagerada, para cima ou para baixo, deixa aquele que lida com câmbio tonto. Tudo fica desmontado com uma oscilação muito forte desse tipo", diz. Para o empresário Lawrence Pih, presidente do grupo Moinho Pacífico S.A., a súbita alta do dólar pode criar um forte desequilíbrio no setor. Boa parte dos moinhos negociou a produção de farinha no mercado interno com base nos preços de R$ 1,60 por dólar. Em poucos meses, o dólar subiu cerca de 50% ante o real. "Isso é uma maxidesvalorização do real. Provocará um impacto muito forte nos moinhos."
O setor, segundo ele, não consegue importar trigo porque os financiamentos de importação sumiram do mercado.
O vice-presidente da Abimed (Associação Brasileira de Importadores de Equipamentos, Produtos e Suprimentos Médico-Hospitalares), Abrão Melnik, chega a prever alta nos custos dos procedimentos médicos devido à taxa de câmbio.
Isso porque 40% dos materiais médicos são importados.
Para este ano, a Abimed previa importações de US$ 2,5 bilhões, mas, com a desvalorização do real, a estimativa deverá ser revista. Os implantes ortopédicos e os marca-passos, por exemplo, são alguns dos equipamentos médicos mais importados.
h) Previsão de PIB do Brasil cai, mas ultrapassa média da AL
Se confirmadas, as previsões do FMI para o crescimento da economia brasileira colocarão o país à frente da média dos países latino-americanos pela primeira vez em vários anos.
O Fundo projeta um crescimento de 5,2% do PIB neste ano e de 3,5% em 2009. Em relação à previsão feita em abril, houve corte de 0,5 ponto para o ano que vem. Para a América Latina, a média prevista de crescimento é de 4,6% em 2008 e 3,2% em 2009. As reduções decorrem da crise financeira.
O FMI afirma que os emergentes devem sofrer com a queda nas exportações (derivada de uma demanda mundial menor por commodities e manufaturados) e, mais importante, com pressões para usar reservas para defender suas moedas.
Pela primeira vez em mais de cinco anos, o Banco Central brasileiro realizou um leilão de venda de reservas para tentar trazer o dólar para baixo do pico do dia, de R$ 2,48.
Charles Collyns, economista-chefe-adjunto e especialista em Brasil no FMI, afirmou que a pressão sobre o dólar deriva do "aperto do mercado internacional de crédito".
"Eu creio que isso explica o motivo de a taxa de câmbio no Brasil estar tão pressionada. O Brasil também é um grande exportador de commodities, e está sofrendo queda na receita (em dólares) por esse lado."
Pela primeira vez em vários anos, o Brasil passou a ter em 2008 déficit em dólares nas suas transações com o resto do mundo e necessita do equivalente a cerca de 1,5% do seu PIB em recursos de fora para se financiar. Com o aperto internacional, a expectativa de alguns analistas é que o financiamento fique cada vez mais difícil, daí a tendência de alta da cotação da moeda americana.
Collyns afirmou também que a pressão cambial poderá ter impactos iniciais sobre a inflação -já que produtos importados ficarão mais caros.
A contrapartida a esse cenário, disse, é que a atividade econômica tende a se desacelerar. O país precisará importar menos, e o consumo poderá ser atendido por uma folga maior nos limites de produção das empresas locais.
Para Collyns, se esse cenário prevalecer e o dólar refluir, o Brasil terá condições até de baixar os juros para estimular sua economia.
Sem citar especificamente o Brasil, mas falando dos emergentes em geral, o economista do FMI Jörg Decressin disse que em certos momentos os países serão obrigados a usar suas reservas para conter a valorização do dólar.
"Um grande número de emergentes acumulou enormes quantidades de reservas, e fizeram isso com o propósito de afastar choques vindos dos mercados nos tempos difíceis. E é exatamente isso (usar as reservas) que esses países devem fazer quando for necessário", afirmou Decressin.
Entre os grandes emergentes, a China seguirá como o mais ativo, com crescimento previsto de 9,7% neste ano e de 9,3% no próximo -contra 11,9% em 2007.
i) País vai aplicar alíquota antidumping em importações de fibras de viscose
Os sete ministros que integram a Câmara de Comércio Exterior (Camex) aprovaram resolução que aplicará direito antidumping sobre fibras de viscose (fibracel) importadas de três países: Áustria, China e Taiwan. A medida é provisória e tem duração de seis meses. Passam a incidir alíquotas específicas fixas de US$ 0,33/kg (Áustria), US$ 0,39/kg (Taiwan) e US$ 0,18/kg (China). Segundo informações do Ministério do Desenvolvimento, a fibra de viscose é utilizada em malharias e tecelagens, na fabricação de peças de vestuário, tecidos para decoração, mesclados ou não com poliéster ou algodão.
A investigação do Departamento de Defesa Comercial (Decom) foi iniciada em outubro de 2007 a pedido da Vicunha. A Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit) foi admitida no processo como parte interessada. O período analisado foi de 1º de janeiro a 31 de dezembro de 2007. Além de itens fabricados na Áustria, China e Taiwan, foram analisados produtos da Indonésia e Tailândia. Apenas três empresas apresentaram defesa: Lenzing, IBR e Thai Rayon Public Company.
Os técnicos do Decom concluíram que o dumping causou dano à indústria brasileira, principalmente redução expressiva do lucro operacional. As importações de fibracel dos três países cresceram 32,2 pontos percentuais de 2003 a 2007 - passaram de 6,1% a 38,3% do mercado brasileiro. Nesse período, as importações de terceiros países também elevaram sua fatia de mercado de 1,9% a 16,3%. Por outro lado, os fabricantes nacionais perderam 46,6 pontos percentuais de market share.
Agronegócio
a) Exportação de café cresce em setembro
As exportações brasileiras de café totalizaram 2,915 milhões de sacas de 60 quilos (verde e solúvel) em setembro, um crescimento de 29,8% sobre igual período de 2007, segundo levantamento do Conselho dos Exportadores de Café do Brasil (Cecafé). Em receita, os embarques somaram US$ 485,2 milhões, com elevação de 58,6% sobre o mesmo mês do ano passado.
No acumulado dos nove primeiros meses do ano, os embarques ficaram em 19,994 milhões de sacas, com baixa de 2% em relação a igual período de 2007. Já em receita, as vendas externas atingiram, no período, US$ 3,259 bilhões, com aumento de 19,2%.
Segundo o Cecafé, as exportações de café robusta têm se destacado ao longo deste ano. Entre janeiro e setembro último, os embarques ficaram em 1,611 milhão de sacas de 60 quilos, alta de 63,6% sobre igual período do ano anterior. O Brasil é o maior produtor e exportador de café, sobretudo do tipo arábica. Nesta safra, a produção nacional está estimada em 45,85 mil sacas, aumento de 27,1% sobre o ciclo anterior. A produção do arábica representa 76,92% do total; e o robusta, os 23,08% restantes, segundo a Companhia Nacional do Abastecimento (Conab).
Mesmo com o bom ritmo dos embarques durante este ano, o Cecafé deverá manter em 27 milhões de sacas a estimativa de exportações totais para 2008. A Alemanha continua como principal importador do café brasileiro. Neste ano, os alemães compraram 3,280 milhões de sacas, seguidos pelos Estados Unidos, com 3,093 milhões de sacas. A Itália, em terceiro lugar, importou 1,915 milhão de sacas e a Bélgica, 1,569 milhão.
b) Exportação sobe 38,5%
As exportações de produtos agrícolas renderam US$ 6,8 bilhões em, alta de 38,5% em relação ao resultado de igual mês de 2007. Descontadas as importações, o superávit no mês passado foi de US$ 5,7 bilhões. Os dois resultados são recordes para o mês de setembro, segundo informações do Ministério da Agricultura. No acumulado de janeiro a setembro, o agronegócio exportou 29,2% a mais que nos primeiros nove meses de 2007, alcançando a cifra de US$ 55,3 bilhões. Os destaques das vendas no exterior são os produtos do complexo soja (grão, farelo e óleo)
Mercosul
a) Mercosul não atinge metas econômicas fixadas pelos sócios
O Mercosul teve, nos últimos anos, bons resultados nas metas para fortalecimento institucional e social, e um desempenho baixo ou nulo na maioria dos objetivos econômico-comerciais traçados pela diplomacia, segundo avaliação da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp).
Apesar do aumento no comércio do Brasil com países do Mercosul (de US$ 3,3 bilhões em 2002 para quase US$ 14 bilhões em 2007), os sócios foram incapazes de concluir tarefas fixadas em 2003 para eliminação das exceções que deixam fora da Tarifa Externa Comum (TEC) quase 67% dos tipos de produtos da lista de mercadorias comercializadas - ou 44% do valor total do comércio dos quatro países. Não conseguiram coordenar políticas agrícolas, ações de defesa comercial, concessão de incentivos ou tratamento para as Zonas Francas.
Essa falta de avanços cria problemas para o Brasil nas negociações comerciais, que se somam às dificuldades de cada país - como na Argentina, em que as maiores sensibilidades da indústria local tornam o governo menos disposto a conceder reduções de tarifas.
Esses problemas levam dirigentes da Fiesp, como o diretor de comércio exterior Roberto Giannetti da Fonseca, a defender a transformação do Mercosul em aérea de livre comércio, sem tarifas comuns para terceiros países. A idéia não é consensual e é rechaçada com veemência pelo Itamaraty, para quem o fim da TEC, mesmo imperfeita, poderia reduzir as preferências conferidas pelos sócios ao Brasil em relação a outros países.
Os diplomatas não gostam de falar em cenários pós-Rodada Doha, por acreditarem que a concentração de esforços exigida pelas negociações da OMC não impediu a exploração das alternativas de acordos para o Mercosul. "Não há um big bang para as negociações bilaterais", diz diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Márcio Cozendey.
Para outro diplomata ligado às negociações comerciais, porém, o iminente reconhecimento de que a rodada fracassou, e só deve ser retomada após 2009, deverá obrigar os negociadores da União Européia a decidir se levam adiante ou não conversas discretas que vêm mantendo com a diplomacia brasileira nas últimas semanas. E deve liberar espaço nas agendas do ministro Celso Amorim e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para dar maior destaque a negociações como a do México, vistas como importantes pelo governo e pelos empresários, mas carente de impulso político.
b) Argentina propõe reunião do Mercosul
O governo da Argentina propôs uma reunião urgente do Mercosul para que os países do bloco discutam a adoção de medidas coordenadas para enfrentar a crise internacional. "Impulsionamos um encontro do Conselho do Mercado Comum do Mercosul, que é a reunião dos ministros de Relações Exteriores e dos ministros da economia (do bloco)", afirmou o chanceler argentino, Jorge Taiana, em entrevista ao canal de televisão C5N. "Parece óbvio que estamos vivendo momentos muito difíceis e precisamos trocar opiniões."
c) Argentina teme efeitos do real desvalorizado
A crise internacional pode abalar mais uma vez a paz nas relações comerciais entre Brasil e Argentina, após os desentendimentos na Rodada Doha da OMC. No país vizinho, acreditam que a desvalorização do real, ocasionada pela crise, provocará duas invasões: de produtos brasileiros na Argentina e de turistas argentinos no Brasil.
Empresários temem que o real desvalorizado e a queda na demanda de produtos brasileiros pelos EUA e pela Europa aumentem ainda mais o superávit comercial do Brasil na relação bilateral.
""É um perigo real e, mesmo que não possamos supor que todas as exportações que iriam para os EUA venham para a Argentina, temos que estar preparados", disse o presidente da União Industrial Argentina, Juan Carlos Lascurain, à imprensa local.
Lascurain afirmou que o governo deve adotar medidas para proteger a indústria local de uma possível invasão brasileira. Apesar de formalmente os dois países afirmarem que sua maior preocupação é uma possível invasão de produtos asiáticos, o governo argentino já estaria estudando aplicar o mecanismo de adaptação competitiva, assinado com o Brasil.
O convênio permite frear importações no âmbito do Mercosul se há ameaça de dano a um setor produtivo.
Como resposta à possível invasão de produtos brasileiros, a desvalorização do real também pode provocar uma nova invasão de argentinos nas praias brasileiras.
"O Brasil havia se tornado um destino muito caro e volta a ser uma opção apetecedora para os argentinos", disse o presidente da Associação Argentina de Agências de Viagens e Turismo, Ricardo Roza, ao jornal "La Nación".
Empresários do setor já discutem medidas para evitar um êxodo nas praias argentinas no verão como o que aconteceu em 1999, com a desvalorização do real.
Como medida de proteção, o chanceler argentino, Jorge Taiana, sugeriu reunião do Conselho do Mercado Comum, que reúne ministros de Economia e chanceleres do Mercosul. No entanto, a reunião deve ser convocada pelo Brasil, que têm a presidência pro tempore do bloco.
Organização Mundial do Comércio (OMC)
a) Sem Doha e com crise, Brasil busca negociações bilaterais
As negociações regionais e bilaterais de comércio do Brasil devem ganhar novo impulso entre o fim deste ano e o começo de 2009, apesar das incertezas provocadas pela crise financeira mundial. Governo e setor privado discutem estratégias para as negociações de abertura de mercado para os produtos brasileiros, com o impasse a que chegaram as negociações multilaterais de liberalização comercial na Organização Mundial de Comércio (OMC). Os empresários querem ampliar os temas negociados com os parceiros comerciais, e já estabeleceram prioridades. E eles também avaliam que a crise pode trazer oportunidades para o Brasil, pois o mercado interno torna as negociações atrativas para os demais países.
O governo relutou em aceitar o fracasso das negociações na OMC, por avaliar que só uma negociação abrangente como a realizada na chamada Rodada Doha pode atender aos interesses do país como a redução e eliminação de subsídios que distorcem o comércio agrícola e a diminuição generalizada nas tarifas impostas sobre alguns dos principais produtos de exportação brasileiros. Mas a negociação ficou comprometida com a troca de comando na Comissão Européia, na sexta-feira, quando o negociador da rodada, Peter Mandelson mudou de posto no governo britânico e foi substituído por lady Ashley, que terá num mandato tampão, até o fim de 2009.
Altos funcionários de diversos ministérios se reúnem para estabelecer um "mapa" dos principais parceiros comerciais do Brasil, e coordenar uma estratégia para ampliação de mercados nesses países.
"Vamos analisar quais países têm condições de ser alvo de negociações para uma área de livre comércio, com quais devemos nos limitar a negociar preferências comerciais, e em quais a questão é fazer ações de promoção comercial", explicou ao Valor o diretor do departamento econômico do Ministério das Relações Exteriores, Carlos Márcio Cozendey. Alguns países com quem o Brasil já tem acordos comerciais podem merecer discussões mais profundas para evitar que as regras de controle fito-sanitário continuem funcionando como barreiras comerciais não-tarifárias, acrescenta ele.
A reunião de técnicos do Itamaraty e dos ministérios do Desenvolvimento e da Agricultura, além da Agência de Promoção de Exportações (Apex) tem o objetivo também de coordenar as ações que os órgãos do governo vem fazendo nos mercados do exterior. "As embaixadas terão um mapa de onde estão as prioridades em cada país", informa o diplomata. A coordenação da burocracia encarregada das negociações faz parte da nova política industrial, anunciada neste ano, lembra Cozendey.
O setor privado já se adiantou e apresentou ao governo um estudo, realizado pela Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), que estabelece como prioridade dos esforços de negociação comercial do Brasil os Estados Unidos, a União Européia, o México e os demais países da América Latina. Há interesse também na África do Sul e na Índia, embora a competição indiana levante resistências entre alguns setores. "Há um pós-Doha, e não queremos ficar parados", comenta o diretor do departamento de negociações internacionais da Fiesp, Mário Marconini.
Existe uma diferença de visão entre os diplomatas e os negociadores do setor privado: enquanto os empresários afirmam que muitas das negociações em curso seriam ditadas mais por interesse político que comercial (em países de menor peso comercial na África, por exemplo, como o Marrocos), os negociadores do governo argumentam que estão explorando todas as possibilidades que aparecem no radar comercial, para que, no conjunto, tenham peso no volume de comércio com Brasil.
O Brasil é o país da América Latina com maior diversificação de destino das exportações, embora, como nota a Fiesp, quase 57% das vendas externas estejam concentradas em quatro parceiros: União Européia, Estados Unidos, Argentina e China.
Apesar de considerarem os Estados Unidos um alvo essencial nos esforços para acordos de comércio, os especialistas ligados à indústria reconhecem que há pouco espaço de negociação. "Nem os republicanos, nem os democratas estão muito interessados na idéia de negociar com um país grande como o Brasil tão cedo", comenta o diretor executivo da Confederação Nacional da Indústria (CNI), José Augusto Fernandes. A Coalizão Empresarial, que coordena os interesses da indústria brasileira nesse tipo de negociação, deve fazer uma consulta aos empresários todo o país para mapear os interesses dos diversos setores, informa.
Segundo Fernandes, que participou, em setembro, de uma missão aos EUA para discutir perspectivas de comércio, o novo governo americano, antes de iniciar alguma nova negociação comercial de peso, terá de atender às preocupações dos sindicatos, em questões como seguro-saúde e proteção ao emprego ameaçado com a crise financeira.
Fernandes também é pouco otimista em relação às conversas com a União Européia. Os europeus devem fazer pressão para abertura do setor industrial sem muitas contrapartidas em redução de barreiras a produtos agrícolas, acredita ele. O governo tem expectativa de retomar contatos com os europeus ainda neste ano. Nos últimos dias, segundo o graduado diplomata que participa das negociações, diplomatas da UE e do Mercosul tem mantido conversas freqüentes, na tentativa de definir um "ponto de partida" para retomar as negociações entre os dois blocos comerciais.
No caso do México, um dos mercados hoje mais cobiçados pela indústria brasileira, a resistência vem dos mexicanos, incomodados com a falta de melhores resultados dos acordos de livre comércio já firmados pelo país - como o Nafta, com EUA e Canadá. Fernandes acredita, porém, que talvez seja possível atrair os mexicanos reforçando uma negociação que ainda se arrasta nos meios diplomáticos, para uma área de livre comércio na América Latina, entre os membros da Associação Latino-Americana de Integração (Aladi). "O México tem interesse nisso, pelos mercados da região", comenta ele.
Segundo Marconini, da Fiesp, os industriais temem que o Brasil perca mercados para a concorrência, ao ficar fora de acordos de livre comércio entre parceiros do país. "O Brasil está mais preparado para essas negociações, e é um mercado atraente, com a crise", argumenta ele. "O contexto internacional mudou, sobretudo em nosso favor; o Brasil precisa renovar sua política de negociações comerciais", defende.
b) Brasil pede para a OMC examinar falta de crédito para exportadores
O Brasil decidiu acionar a Organização Mundial do Comércio (OMC) para examinar o impacto da crise financeira internacional e buscar alternativas à atual retração de financiamento para os exportadores. A iniciativa brasileira é sem precedentes e ocorre em meio à constatação de que os grandes bancos internacionais enxugaram o crédito de curto prazo para as exportações, apesar de os países em desenvolvimento estarem entre os melhores pagadores.
Em documento submetido aos outros 151 países membros da OMC, o país sugere que a entidade inicie contatos inclusive com os bancos privados, a fim de avaliar o real impacto do aperto de crédito sobre o financiamento ao comércio e ver alternativas para mitigar o problema.
Também pela primeira vez, o Brasil se posiciona publicamente contra a total implementação do Acordo de Basiléia 2, pelo qual os bancos terão de manter mais capital em proporção do risco dos ativos. Para o Brasil, essas regras são positivas. Só que, no atual aperto global de crédito, podem ter efeitos ainda mais negativos no fluxo do comércio global, em vez de aumentar a estabilidade do sistema financeiro.
Essa crise financeira é provocada pelos países industrializados, mas tem impacto nos países em desenvolvimento, em particular no comércio e essa discussão precisa ser feita, afirmou o embaixador brasileiro na OMC, Roberto Azevedo.
No documento enviado ontem aos outros países, o Brasil observa que, com a instabilidade dos mercados financeiros desde agosto de 2007, o sistema multilateral de comércio tem atuado como um absorvedor de choques, com regulamentações vagas ou insuficientes em particular nos sistemas financeiro e monetário afetando inequivocamente o comércio.
O Brasil procura chamar a atenção para uma situação paradoxal, já que um estudo da própria OMC mostra que o financiamento ao comércio é um dos modos mais seguros de crédito devido à sua curta maturidade e existência de garantia física (os produtos), por exemplo.
Só que, com o aperto de crédito global, houve uma retirada do fornecimento de crédito (de curto prazo) pelos grandes bancos internacionais. Segundo fontes, as instituições preferem emprestar, quando o fazem, para o longo prazo, com rendimento aparentemente mais garantido.
O Brasil reclama que exportadores de países em desenvolvimento que buscam financiamento para exportação se encontram na estranha situação de estarem entre os que têm melhor capacidade creditícia, e portanto menos riscos, mas incapazes de ter acesso a crédito num cenário com percepção de alto risco. Isso provoca exigências mais severas por parte dos bancos ou simplesmente a resposta de que os fundos não são mais disponíveis.
O Brasil quer que a OMC examine a crise de aperto de crédito na sua próxima reunião do Grupo de Trabalho sobre comércio, Divida e Finanças, que foi criado há anos para reforçar a coerência entre comércio internacional e finanças e salvaguardar o sistema comercial de efeitos de instabilidade financeira e monetária.
A delegação brasileira pede também para a entidade examinar a dimensão do novo ciclo de endividamento de países em desenvolvimento, especialmente de importadores líquidos de alimentos e de petróleo. Para o Brasil, a OMC precisa estudar como isso terá impacto no comércio regional e global.
Até agora, o diretor-geral da OMC, Pascal Lamy, tem usado a crise financeira para insistir na importância de conclusão da Rodada Doha como uma apólice de segurança da economia global e para continuar a ter o papel de absorvedor de choques.
c) Apesar de apoio oficial, Rodada Doha não empolga o país
Acusado de ser um dos responsáveis pelo fiasco das negociações de liberalização comercial na Organização Mundial de Comércio (OMC), a chamada Rodada Doha, o governo indiano se recusa até a admitir que tenham fracassado definitivamente as tentativas de acordo. E garante seu empenho e apoio ao esforço do governo brasileiro para tentar, até 31 de dezembro, um consenso entre os principais negociadores sobre as fórmulas que deverão orientar os cortes nas barreiras ao comércio de mercadorias industriais e agrícolas.
Não podemos nos deixar levar por emoções. Brasil e Índia têm de trabalhar juntos para encontrar uma solução para a rodada Doha, diz um dos principais negociadores indianos, o secretário especial do Ministério do Comércio da Índia, Rahul Khullar.
Ele se preocupa, ainda, em desfazer a impressão - geral em Genebra e veiculada até na imprensa indiana - de que foi sério o desentendimento entre os governos brasileiro e indiano na última tentativa fracassada de um acordo, em Genebra, quando o Brasil chegou a se mostrar disposto a aceitar as propostas endossadas pela União Européia e pelos Estados Unidos. Brasil e Índia estão jogando juntos, seja em Genebra, seja nas negociações bilaterais, garante. O G-20 está vivo e bem, diz, em referência ao grupo formado pelos países em desenvolvimento em contraponto às propostas dos EUA e da Europa para agricultura.
Khullar diz que negociações técnicas em Genebra tiveram grande avanço e que é pequena a diferença a ser resolvida, o que pode ser alcançado caso haja engajamento de todos os parceiros. Ele reconhece que a tarefa é dificultada pela transição de governo nos Estados Unidos, e pela recente substituição do chefe dos negociadores europeus, Peter Mandelson, pela relativamente inexperiente Catherine Ashton.
O negociador indiano argumenta que a proximidade de uma troca de governo nos EUA ainda pode servir de motivação a mais para os negociadores buscarem um compromisso do governo americano, que facilite a continuidade das negociações a partir do próximo ano. Se for fechado um acordo, ficará mais difícil de reabri-lo na próxima administração, diz ele, especulando sobre uma possível vitória do candidato democrata, Barack Obama.
O tom otimista das declarações do secretário especial de Comércio não é compartilhado por observadores independentes. Para o embaixador Santosh Kumar, diretor de projeto do ICRIER, um dos principais think tanks indianos em relações internacionais, os custos da Rodada Doha para a Índia, com o aumento da concorrência sobre os 300 milhões de pobres agricultores indianos, até agora, são maiores que os ganhos dos setores mais competitivos com a liberalização do comércio. A situação do Brasil é diferente da nossa, exemplifica.
Para Ashok Bhattasharya, editor-gerente do Business Standard, segundo maior jornal de negócios da Índia, é real o alívio na sociedade indiana com o fracasso da Rodada Doha. Não há nenhum entusiasmo com as negociações da OMC no país, diz.
Plano Internacional
a) Crise se transfere a Congresso na Bolívia
Com o fracasso da rodada de negociações entre o presidente Evo Morales e os governadores rebeldes da Bolívia, o palco do impasse em torno da nova Constituição do país será agora o Congresso, onde a oposição, que domina o Senado, apela para que La Paz dê mais tempo para a discussão do texto. Do contrário, promete barrá-lo.
O pedido por uma revisão ampla da Carta foi feito pelo presidente do Senado da Bolívia, Oscar Ortiz, do conservador Podemos. Ortiz repete, assim, a exigência dos governadores autonomistas, rejeitada pelo governo e motivo do desfecho negativo do diálogo.
Morales aceita alterar o apenas o capítulo das autonomias administrativas, a principal reivindicação dos departamentos.
O presidente do Senado pediu ainda que permaneçam no país os organismos internacionais, entre eles a Unasul (União de Nações Sul-Americanas). Os observadores acompanharam os 17 dias da rodada de negociações encerrada no domingo.
Ortiz diz que os facilitadores internacionais serão testemunhas da ameaça ao Congresso feita por movimentos sociais pró-Moralesm, que prometem cercar na semana que vem a sede do Legislativo, em La Paz, para pressionar pela aprovação da convocação dos dois referendos que faltam para promulgar a Carta, aprovada por constituintes governistas em 2007. O governo, que planeja passar as leis até o dia 15, já usou a estratégia.
Considerando o quórum completo nas duas Casas do Congresso, o governo não garante os votos necessários à aprovação, já que o Podemos, segunda bancada no Legislativo, anunciou voto contra. Daí a intenção de Morales de contar com dissidentes do partido, independentes e com a pressão dos movimentos sociais, acusados de impedir a entrada de opositores no prédio.
Apesar dos apelos da oposição no Senado, os principais governadores oposicionistas, Rubén Costas (Santa Cruz) e Mario Cossío (Tarija), não classificaram o diálogo de fracasso. Também deixaram de rejeitar a Constituição como ilegal, passando a pedir uma revisão do registro eleitoral, num endosso implícito dos referendos.
Repetiram que não houve acordo, mas tampouco ruptura, daí terem aceitado tirar uma fotografia ao lado de Morales. Costas foi questionado pela imagem, num índice da pressão regional contra a Carta. "Costas explica porque saiu na foto", titutou o site do "El Deber", o principal jornal de Santa Cruz.
Às TVs locais, o governador cruzenho disse que a imagem era a prova de que o diálogo gerou a pacificação do país que estava "à beira de uma guerra civil". Esse também foi o discurso do ex-chanceler chileno, Juan Gabriel Valdés, que chefiou a missão da Unasul na Bolívia.
b) China reage a crise com baixa de juros e corte de imposto
A China anunciou a redução de 0,27 ponto percentual na taxa de juros, que passou para 6,93% ao ano, e o fim da cobrança de 5% sobre os rendimentos da poupança. Também foi criado um fundo para ajudar pequenas e médias empresas exportadoras. No Japão, onde a Bolsa teve a maior queda desde 1987, o banco central endossou o corte de juros coordenado na Europa, mas disse que não vai fazer o mesmo, já que o índice no país é de só 0,5% ao ano.
O pacote chinês visa minimizar as perdas dos exportadores, que sofrem com a retração nas vendas globais e com os altos preços de matérias primas. Já o fim da cobrança de 5% do imposto de renda sobre os rendimentos em poupança vai beneficiar as pessoas físicas.
As medidas foram anunciadas após fortes quedas das ações das principais empresas chinesas nas Bolsas. Por conta do fuso horário, o anúncio da redução na taxa de juros por diversos bancos centrais chegou tarde demais para os mercados na Ásia. A Bolsa de Tóquio caiu ontem 9,4%, a maior queda em 21 anos. A Bolsa de Hong Kong, a maior da China, caiu 8,17%.
As ações das três maiores companhias petrolíferas chinesas, PetroChina, Sinopec e Cnooc, caíram 14,05%, 12,5% e 14,25%, respectivamente.
A taxa de reservas obrigatórias para os bancos também será reduzida em 0,5 ponto percentual a partir do dia 15.
Depois de crescer 11,9% em 2007, o PIB chinês deve crescer 9,5% este ano e 8% em 2009.
Para estimular o consumo, o Conselho de Estado chinês anunciou que suspenderá a cobrança de 5% nos rendimentos em poupança.
O baixo consumo é a preocupação do governo, por conta da previsível redução dos mercados para exportação.
A Bolsa de Tóquio caiu 9,4% ontem, a maior queda em um só dia desde 1987. As ações da Toyota caíram 12% com a previsão de que seus lucros cairão 40% em 2009 pela queda nas vendas no mercado americano. Apesar de endossar o corte coordenado de juros, o Banco do Japão disse não poder fazer o mesmo, já que a taxa no país é de apenas 0,5% anual.
O dólar caiu abaixo de 100 ienes pela primeira vez em seis meses, devido à crença de que a moeda americana vai passar por uma desvalorização.
c) Secretário dos EUA vê risco de aumento do protecionismo
A crise financeira pode levar ao aumento do protecionismo, advertiu o secretário de Comércio dos EUA, Carlos Gutierrez. O risco das dificuldades dos mercados financeiros é sempre que alguém as utilize como pretexto para implantar maior proteção (tarifária). E esse é um grande erro, disse Gutierrez. Segundo ele, o presidente George Bush já disse que os EUA querem manter o mercado.
Ele afirmou que embora existam alguns produtos para os quais os EUA não têm total abertura, o país é o mercado mais aberto do mundo. A análise do secretário refere-se às tarifas médias de importação. O problema é que, em alguns casos, os EUA aplicam sobretaxas que impedem a entrada no mercado americano de produtos de interesse de países emergentes, como o etanol brasileiro. Temos trabalho a fazer e aspectos a aperfeiçoar, reconheceu Gutierrez.
Ele avaliou, no entanto, que o Brasil tem condições de aumentar as exportações de etanol para os Estados Unidos via Caribe. O Caribe pode exportar para o mercado americano até 70% do volume de álcool produzido na região sem a incidência de tarifas, informou. O Brasil não utiliza esses 70%, disse Gutierrez. Ele fez as declarações após fazer uma palestra, ontem, no Rio, para empresários em evento promovido pela Câmara de Comércio Americana. Gutierrez participou, em São Paulo, do Diálogo Comercial Ministerial entre Brasil e Estados Unidos e de uma reunião do Fórum Bilateral de CEOs (presidentes de empresas).
Os EUA têm interesse na discussão de um acordo bilateral de investimentos com o Brasil, diz o secretário. O objetivo é aumentar negócios, investimentos e empregos nos dois países, disse Gutierrez. Para ele, a melhor proteção para os investimentos são leis como as de direito de propriedade intelectual. Outro tema em pauta refere-se à possibilidade de um acordo tributário entre os dois países para reduzir a bitributação.
Aos empresários, Gutierrez, que fez a última visita ao Brasil como secretário de Comércio dos EUA, fez uma defesa da abertura comercial. Na visão dele, os países mais abertos, que exportam muito, têm acordos comerciais e investem, podem sair mais rápido da crise. Já os países que mantêm os mercados mais fechados devem encontrar mais dificuldades para superar os problemas criados pela crise financeira, avaliou Gutierrez.
O secretário também aproveitou o encontro com empresários no Rio para defender a retomada das negociações da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC). Os benefícios de Doha são hoje mais importantes do que eram há seis meses, comparou. Na avaliação dele, Doha não está morta e o reinício das discussões depende do papel de líderes como os presidentes George Bush e Luiz Inácio Lula da Silva.
Gutierrez reconheceu que a crise financeira deverá reduzir o crescimento da economia americana, com efeitos sobre as exportações do país. Em períodos econômicos difíceis, o Brasil, do mesmo modo que o próximo governo dos Estados Unidos e de outros países em todo o mundo, terá que estabelecer políticas para o futuro. Continuaremos em nosso caminho de abertura e engajamento global ou nos isolaremos economicamente? Espero que o Brasil, os EUA e outros países permaneçam abertos e engajados, disse Gutierrez no discurso aos empresários.