03 a 07 de março de 2008

Comércio Exterior

Resultados
Cresce importação de máquinas usadas
Mineração vai investir US$ 32 bi até 2011
Comércio com o Japão rende US$ 2,3 bilhões

Agronegócio

Paraná terá de esperar para voltar à Europa
Carnes suína e de frango mais perto do Chile
Embarques brasileiros de suco de laranja disparam

Mercosul

Argentina quer novos investimentos para renovar acordo
Fabricante argentino pede mais três anos de proteção para TVs

Organização Mundial do Comércio (OMC)

Montadoras se cansam da OMC e buscam mercados

Plano Internacional

Brasil ignora ameaça de Chávez, critica Uribe e quer apuração na OEA
Venezuela deve recorrer ao Brasil para comprar comida




Comércio Exterior

a) Resultados

Os resultados da balança comercial nos dois primeiros meses do ano, apontando uma queda da média por dia útil de 67,1% em relação ao mesmo período de 2007, geram preocupação com o que pode ocorrer na conta de transações correntes ao longo do ano. Cabe, portanto, avaliar com cuidado o que foi obtido até agora e o que não se pode projetar para todo o ano.

Há divergências entre os economistas nas estimativas para o saldo da balança comercial em 2008, que variam de US$ 20 bilhões até US$ 35 bilhões. O resultado dos dois primeiros meses é, seguramente, atípico, mas, levando em conta a média por dia útil, temos, em relação aos dois primeiros meses de 2007, aumento de 20,5% das exportações e de 50,7% das importações.

As exportações continuam crescendo, apesar do arrefecimento da atividade nos países industrializados. Esse crescimento foi de 24,5% para os produtos básicos, de 18,4% para os bens semimanufaturados e de 17% para os manufaturados; paralelamente, registra-se um aumento das vendas de 8,5% para a União Européia, de 42,7% para o Mercosul, de 5,6% para os EUA e de 32,5% para a Ásia.

Esses resultados foram obtidos com uma valorização, em torno de 20% em um ano, do real ante o dólar. Tudo indica que, por causa das pressões das demandas da China, os preços das commodities continuarão em elevação. Já agora em março começarão as exportações do complexo soja e, em maio, as de açúcar. O crescimento excepcional das importações se deve ao aumento das compras de petróleo a um preço elevado e, também, de maquinário industrial (+83,9%). Excluídas as importações de automóveis, verifica-se que as de bens de consumo duráveis aumentaram 49,3%, menos do que as de outras categorias.

Não há dúvida de que o crescimento das importações em geral se deveu à valorização da taxa cambial (refletindo a desvalorização do dólar), que não deverá prosseguir no ritmo atual, embora não se possa prever uma desvalorização do real a curto prazo. O aumento das importações de maquinário industrial deve permitir um aumento da produção doméstica nos próximos meses, assim como uma redução da importação de alguns bens de consumo, especialmente levando em conta que os produtos importados da China deverão aumentar de preço.

Só uma profunda crise nos países industrializados deverá agravar o panorama do comércio exterior.

b) Cresce importação de máquinas usadas

Diante da dificuldade em encontrar material novo para entrega rápida, o setor industrial aumentou no ano passado a participação de máquinas usadas, adquiridas de empresas e fornecedores estrangeiros, nas fábricas em atividade no país. E a tendência, segundo avaliação do secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento, Ivan Ramalho, é a continuidade desse processo em 2008.

Só no ano passado, a compra no exterior de maquinário usado cresceu 68%. O gasto com essas compras subiu de US$ 1,421 bilhão em 2006 para US$ 2,385 bilhões em 2007.

A maior parte dos equipamentos usados que vem sendo instalados nas fábricas brasileiras foi usada antes por empresas dos EUA e da Europa. A China também é uma fornecedora, mas em menor volume.

Entre os equipamentos constam caldeiras, reatores nucleares, instrumentos mecânicos, máquinas eletrônicas e elétricas, aparelhos de som e imagem, aparelhos cirúrgicos, partes e peças para máquinas em geral e equipamentos para uso em autopeças. Na lista também figuram veículos e material para ferrovias, tratores, embarcações e aeronaves. Além de autopeças, os bens de capital de segunda mão estão sendo usados em siderúrgicas, fábricas que produzem máquinas, indústria química, empresas de transportes e de energia.

A decisão de ampliar o uso de equipamentos usados importados é polêmica. Embora ajude a resolver um problema momentâneo, torna o Brasil destino de material obsoleto.

Ramalho diz que a demanda mundial por bens de capital está aquecida em razão da expansão asiática e que os industriais brasileiros estão sendo levados a importar máquinas usadas porque não podem aguardar prazos de entregas de 12 a 24 meses. Em alguns casos, os empresários recorrem a essa situação enquanto aguardam a entrega da encomenda nova.

Ramalho acha que a compra de usados tende a aumentar neste ano porque os tradicionais fornecedores, como as fábricas alemãs, não conseguirão solucionar o gargalo da falta de produtos para entrega imediata no curto prazo.

O outro lado da questão é o risco de o Brasil se tornar o destino de maquinário de tecnologia ultrapassada descartado por empresas americanas e européias. Associações industriais vêem a elevação desse tipo de importação com apreensão porque avaliam que esse movimento pode comprometer a competitividade da indústria nacional.

A compra de máquinas e equipamentos é o destaque das importações do Brasil. No primeiro bimestre deste ano, esse gasto aumentou 57%, chegando a US$ 2,4 bilhões. Esse ritmo de crescimento é maior que o de 2007, quando as importações atingiram o recorde de US$ 120,6 bilhões, com US$ 25,1 bilhões de maquinário.

c) Mineração vai investir US$ 32 bi até 2011

A mineração brasileira revisou mais uma vez as previsões de investimento até 2011. Entre pesquisas em novas áreas e a produção de minérios, a nova projeção é de que sejam investidos até US$ 32 bilhões no período - a expectativa anterior era de US$ 28 bilhões.

"É um montante em que se consideram projetos confirmados. Mas esse valor pode aumentar se a Vale (ex- Companhia Vale do Rio Doce) confirmar alguns planos de investimento na área de Serra Sul em Carajás", explica Marcelo Ribeiro Tunes, diretor de assuntos minerários do Instituto Brasileiro de Mineração (Ibram). Caso isso ocorra, os investimentos passariam dos US$ 40 bilhões.

O ferro é o mineral que lidera as projeções de investimento, US$ 14 bilhões até 2011, seguida do níquel, com aportes de US$ 7,6 bilhões. O Ibram calcula que em 2007 o investimento em pesquisa mineral no Brasil bateu recorde e atingiu US$ 350 milhões. "O ritmo frenético do setor minérios continua neste ano e os gastos em prospecção de novas áreas deve chegar a US$ 420 milhões", diz Tunes.

A escalada de preços internacionais das commodities minerais tem sustentado essa corrida. Levantamento do Ibram mostra que do início de 2001 a fevereiro de 2008 o valor de alguns minerais teve reajustes que multiplicaram o valor em até quatro vezes. O minério de ferro e o níquel, por exemplo, tiveram reajustes superiores a 370%.

A alta das commodities minerais e a expansão da produção brasileira deram ao País uma grande contribuição para a balança comercial. O saldo da indústria mineral (incluída a área de produção e processamento, excluído petróleo e gás) fechou 2007 em US$ 20 bilhões, metade do superávit total da balança do País, que alcançou US$ 40 bilhões. A importação total chegou a US$ 9,6 bilhões em 2007, enquanto a exportação atingiu US$ 29,8 bilhões.

A tendência é que a contribuição do setor mineral para o saldo comercial em 2008 seja ainda maior. Embora a taxa de câmbio também afete a competitividade das exportações de minério, o preço internacional tem compensado. Não é o que ocorre em outros setores, por isso, estima-se que mais de 50% do saldo comercial em 2008 venha da mineração.

d) Comércio com o Japão rende US$ 2,3 bilhões

Muito se fala da China mas poucos lembram que o Japão ainda é a segunda maior potência do mundo. E um Produto Interno Bruto de US$ 4,4 trilhões e uma renda per capita de US$ 36 mil não devem ser desprezados por empresários brasileiros. Só no ano passado, o comércio entre os dois países rendeu ao Brasil US$ 2,25 bilhões, de acordo com informações do Ministério das Finanças japonês.

O Japão percebeu a fartura de crédito e a paixão por carros do brasileiro. Passou a investir ainda mais na indústria automotiva. Em 1997, quando se instalou no interior São Paulo, a Honda vendeu 2 mil unidades. Ano passado foram comercializados nada menos que 87 mil veículos da montadora. Crescimento parecido aconteceu com a Toyota.
Alexandre Uehara, pesquisador da USP especializado em economia asiática, explica que o setor de auto-peças responde pelas maiores importações brasileiras. Ultrapassou o segmento de eletroeletrônicos.

- Em dois anos, esses fabricantes devem se instalar no Brasil para atender a demanda das montadoras - prevê Uehara. - O dólar também se desvalorizou em relação ao iene. As montadoras no Brasil se beneficiaram do real valorizado. É um negócio que está crescendo.

O etanol é um dos produtos mais presentes no comércio entre os dois países.

- Empresas de comércio exterior como a Mitsui, Marubeni, Mitsubishi e outras têm feito muitos investimentos no país em setores como etanol, infra-estrutura, mineiro de ferro e outros - conta Rei Oiwa.

A Petrobras abriu ano passado uma refinaria Okinawa para produzir etanol no Japão.

- Para melhorar a relação entre os dois países, o Brasil precisa divulgar mais sua imagem no Japão - aconselha Alexandre Uehara. - Muitos empresários japoneses desconhecem o nosso país.

Rei Oiwa, diretor do departamento de pesquisa da Japan External Trade Organization (Jetro), revela que a japonesa Sumitomo Tubos e a francesa Vallourec vão investir US$ 1,7 bilhão na construção de uma fábrica de tubos de aço em Minas Gerais.

A América Latina se transformou em 2007 na região que mais aumentou as exportações para o Japão, com crescimento de 18,4% em relação ao ano anterior, de acordo com o Ministério das Finanças japonês.

Agronegócio

a) Paraná terá de esperar para voltar à Europa

O Paraná, que ficou de fora da lista inicial de exportação de carne bovina para a União Européia devido à febre aftosa de 2005, corre o risco de voltar a vender ao bloco apenas em 2009. A previsão é do ministro da Agricultura, Reinhold Stephanes, que esteve em Curitiba e participou de reunião da Câmara Setorial de Orgânicos.

Até agora o Estado não foi considerado livre de aftosa pela Organização Internacional da Saúde Animal (OIE), mas o ministro disse que os procedimentos científicos sobre o caso estão na França e serão discutidos entre março e setembro. "O Paraná não teve aftosa, não tem aftosa, mas foi prejudicado por causa da aftosa do Mato Grosso do Sul, assim como São Paulo e parte de Minas". Ainda que admita que a volta do Paraná à UE poderá acontecer só em 2009, o ministro espera poder antecipar a boa notícia para este ano.

Sobre as recentes negociações com os europeus, Stephanes voltou a afirmar que o Brasil não cedeu, mas teve de seguir acordo feito há oito anos com a UE, de fornecer produto rastreado. "Houve exagero na exigência, só que o Brasil aceitou e depois não cumpriu as normas".

Agora, o ministro disse que o primeiro passo foi manter o processo de negociação e o mercado aberto - "por menor que seja" - para evitar que outros países que usam a UE como referência deixassem de comprar carne brasileira. "Vamos agregar novas propriedades dentro das normas atuais. Devemos chegar a duas ou três mil propriedades, para dar densidade à exportação". Depois, ele planeja simplificar as normas em vigor, e essa negociação deverá ser iniciada ainda em 2008.

A intenção, segundo Stephanes, é desburocratizar e analisar o que é essencial ao processo de rastreabilidade. A forma, se com brinco ou chip, na orelha ou no umbigo do animal, também será discutida. O ministro disse que não está sob pressão e que "nenhuma autoridade que conheça o problema está contra a forma" que ele está agindo.

"As coisas têm uma lógica. Em comércio você não chuta o pau da barraca, não chuta o balde do leite, não chega e diz ´vamos romper com a União Européia´", afirmou. O presidente do Sindicarne-PR, Péricles Salazar, reclamou da demora na liberação do Paraná como livre de aftosa. O Estado teve de esperar os procedimentos do Mato Grosso do Sul para entrar com pedido de análise. Para ele, a liberação pode acontecer ainda no primeiro semestre. No entanto, lembrou, muitos produtores do Estado estão desestimulados, por isso não dá para prever quanto tempo precisarão para se adaptar às normas da UE. "Apoiamos o ministro, mas defendemos uma reformulação do Sisbov", afirmou o dirigente.

b) Carnes suína e de frango mais perto do Chile

O Chile poderá anunciar nos próximos dias a abertura de seu mercado às carnes de suínos e aves in natura do Brasil. Estes produtos nunca foram importados pelos chilenos, que alegavam problemas sanitários. Com as garantias oferecidas à gestão da presidente Michelle Bachelet de que os animais criados no Brasil estão livres de doenças como newcastle, por exemplo, neste ano o comércio bilateral ganhará novas frentes.

A perspectiva de novos negócios animava ontem o embaixador Mario Vilalva, que representa o Brasil há cerca de um ano e meio no Chile. Os criadores chilenos, observou, não conseguem suprir a demanda doméstica por carne suína, enquanto os de aves estão vendo nas exportações aos Estados Unidos, em especial de peito de frango, melhor oportunidade do que abastecer a geladeira dos consumidores chilenos.

O Brasil, porém, segue sem exportar carnes - exceto o Rio Grande do Sul, cuja carne bovina está liberada desde 2006. Na frente bovina, contudo, o embargo chileno, que afetou exportações da ordem de US$ 200 milhões por ano, continua duro.

O Chile, assim como outros países, exige que produtores brasileiros rastreiem o gado com rigor. Ou seja, é exigido um acompanhamento por meio de etiquetas de identificação penduradas em cada animal. Este sistema, batizado de Sisbov (Serviço Brasileiro de Rastreabilidade da Cadeira Produtiva de Bovinos e Bubalinos), é administrado pelo Ministério da Agricultura e deve ser adotado por todo aquele que quiser exportar carne para União Européia, Suíça e Albânia, além do Chile.

O sinal verde para uma venda mais ampla de carne bovina ao Chile ainda vai demorar um pouco mais, mas o embaixador Vilalva diz que o processo está na reta final. "Não conseguimos ainda elementos consistentes sobre nosso sistema (Sisbov), mas estamos melhorando e em breve o embargo do Chile pode ser suspenso", disse o embaixador. Apesar do otimismo do diplomata brasileiro em relação à proximidade da abertura para as outras carnes, os Exportadores brasileiros acreditam que o processo ainda deverá demorar um pouco mais.

Segundo Pedro de Camargo Neto, presidente da Associação Brasileira da Indústria Produtora e Exportadora de Carne Suína (Abipecs), o processo em seu segmento está mais acelerado, tendo em vista que uma missão técnica chilena já esteve no Brasil, visitou seis ou sete fábricas que poderão ser habilitadas a exportar e saiu com boas impressões. "Só que ainda não sabemos o resultado da visita", disse.

Segundo ele, o mercado chileno será relativamente pequeno para a carne suína do Brasil, mas será importante do ponto de vista de credibilidade. Isso porque o Chile tem acordos bilaterais com México e Japão, que são tão exigentes - e protecionistas - quanto os vizinhos sul-americanos quando o assunto é sanidade.

Christian Lohbauer, presidente da Associação Brasileira dos Produtores e Exportadores de Frangos (Abef), tem mais ou mesmo a mesma visão de Camargo Neto. Ele afirma, contudo, que em seu segmento o processo de abertura chilena está mais atrasada, o que sugere que uma decisão nesse sentido demorará mais. Segundo ele, uma missão técnica do Chile deverá desembarcar no Brasil para habilitar plantas exportadoras de carne de frango até o começo de abril.

c) Embarques brasileiros de suco de laranja disparam

A receita oriunda dos embarques brasileiros de suco de laranja congelado, que atingiu US$ 186,2 milhões em fevereiro, aumentou 234,1% em relação ao mesmo mês de 2007 e registrou, assim, a maior variação positiva em uma lista de 12 produtos agropecuários exportados pelo país divulgada na segunda-feira pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex).

Na mesma lista, o segundo maior percentual de crescimento das vendas ao exterior no mês passado foi o do óleo de soja bruto. As exportações do produto alcançaram US$ 121,3 milhões, 227,4% mais que em fevereiro de 2007. O algodão também se destacou, com um incremento de 115,8%, para US$ 45,9 milhões, sempre de acordo com a Secex.

Houve avanços expressivos também para carne de frango in natura (53,6%, para US$ 421 milhões), farelo de soja (53,3%, para US$ 229,9 milhões), milho (31,3%, para US$ 78,8 milhões), carne suína in natura (30,5%, para US$ 86,6 milhões) e café em grão (11,3%, para US$ 319,4 milhões).

Recuaram, em contrapartida, as vendas ao exterior de soja em grão (14,6%), açúcar refinado (14%), açúcar bruto (8,4%), fumo em folha (7,6%) e couro (3,6%).

Mercosul

a) Argentina quer novos investimentos para renovar acordo

O governo argentino está pressionando os fabricantes de autopeças a investir no país. Esse é o principal nó para a renovação do acordo automotivo de Brasil e Argentina, que controla o comércio neste setor e expira em 30 de junho. Um novo acerto deve prorrogar por mais cinco anos a isenção de tarifas de importação mediante alguns limites. Os sócios do Mercosul já deixaram claro, no entanto, que não vão se comprometer com o livre comércio no fim desse período. "Não podemos desde já prever o que vai acontecer daqui há cinco anos", disse Ivan Ramalho, secretário-executivo do Ministério do Desenvolvimento.

Os argentinos amargaram déficit de até US$ 1,4 bilhão com os brasileiros em autopeças em 2007. Este segmento impediu uma queda mais significativa do prejuízo total da Argentina com o Brasil no setor automotivo, que ficou em US$ 2 bilhões no ano passado, 7% a menos que em 2006. Em veículos prontos (carros, automóveis e ônibus), o déficit dos argentinos foi de US$ 400 milhões, o que significou queda de mais de 35% comparado com 2006. Nos carros de passeio, a Argentina conseguiu até um pequeno superávit de US$ 78 milhões com o Brasil em 2007.

Os fabricantes de autopeças argumentam que não há escala no país vizinho que justifique gastos significativos. "Investimento não acontece por decreto. Só se houver incentivos", disse ao Valor Antônio Carlos Meduna, principal negociador do Sindicato Nacional da Indústria de Componentes para Veículos Automotores (Sindipeças). Ele explica que a consolidação da indústria é necessária para elevar a competitividade e reduzir preços.

O comércio de autopeças é hoje o maior responsável pelo desequilíbrio que persiste na balança comercial dos dois países, apesar da recuperação do consumo, da produção e da exportação argentina de veículos. Segundo o governo argentino, o país registrou déficit de US$ 1,4 bilhão com o Brasil em autopeças em 2007, mas há divergências sobre o dado. Para o governo brasileiro, o déficit ficou em US$ 1 bilhão. De qualquer forma, o prejuízo para os argentinos é crescente. O déficit estava em US$ 420 milhões em 2005 e em US$ 910 milhões em 2006.

De acordo com Juan Cantarella, gerente geral da Associação de Fábricas Argentinas de Componentes (Anfac), a indústria local responde por 32% das autopeças consumidas no país. Ele diz que o percentual é "muito pequeno" e que a produção argentina cresceu em valores absolutos, mas não em participação relativa. Apesar do câmbio favorável - o dólar está cotado a 3,10 pesos -, Cantarella afirmou que a inflação corrói parte dos benefícios. "O setor de autopeças hoje é o maior problema no comércio bilateral".

Em veículos prontos, o comércio entre os dois países está mais equilibrado. O déficit da Argentina com o Brasil caiu de US$ 1,26 bilhão em 2005 para US$ 806 milhões em 2006 até atingir os US$ 419 milhões do ano passado. Com os mercados dos dois países crescendo , as montadoras recuperaram suas fábricas na Argentina e elevaram os embarques para o Brasil. "Este é um momento especial para construir acordos que gerem investimentos", disse Antônio Sérgio Martins Mello, vice-presidente da Associação Brasileira dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) e diretor de assuntos corporativos da Fiat.

Para Ramalho, do Ministério do Desenvolvimento, um prazo mais longo para o acordo trará mais previsibilidade para o investimento. Os dois países cogitam cinco anos, mas ainda não bateram o martelo. Durante a reunião de ontem, não foi discutido qual será o "flex", mecanismo que controla o comércio. Hoje, para cada dólar importado, o Brasil pode exportar no máximo US$ 1,95. O "flex" efetivamente praticado pelas montadoras atualmente é de US$ 1,5.

Não será tarefa fácil convencer a indústria de autopeças a produzir na Argentina. Tecnicamente, estabelecer "flex" apenas para autopeças é complicado. Fraguío reconheceu que os investimentos tem que ser "voluntários", mas espera ajuda "efetiva" do Brasil. A negociação não chegou nesse ponto, mas uma fonte experiente enumera algumas possibilidades. O BNDES poderia financiar empresas de autopeças brasileiras que invistam na Argentina. O Brasil não reclamaria de medidas pouco ortodoxas dos argentinos de apoio à indústria. Ou ainda seriam criados "dispositivos inteligentes" no acordo para estimular a produção. As negociações estão apenas começando. Os dois governos voltam a se reunir em 27 de março, em Brasília, e em 10 de abril, em Buenos Aires.

b) Fabricante argentino pede mais três anos de proteção para TVs

Os fabricantes argentinos de televisores solicitaram que seu governo prorrogue por mais três anos a salvaguarda que protege o mercado da entrada de aparelhos convencionais produzidos na Zona Franca de Manaus. A indústria local também quer estender a restrição para TVs de LCD e de plasma. Os fabricantes brasileiros argumentam que não há justificativas para mais tempo de proteção. Foi realizada uma audiência pública com as partes interessadas sobre o tema em Buenos Aires.

Entre o fim de 2004 e 2007, período em que a salvaguarda esteve em vigor, o mercado argentino de televisores convencionais cresceu 112%, conforme a Associação Nacional de Fabricantes de Produtos Eletroeletrônicos (Eletros). Com as vendas reguladas por cotas, a participação do Brasil no consumo do vizinho caiu de 16% para 4,3%. Para o setor privado brasileiro, os dados comprovam que as importações não causam dano aos argentinos.

Segundo uma fonte da Eletros, é preocupante que os argentinos solicitem a inclusão de TVs de LCD e plasma na salvaguarda. O Brasil exportou 7.905 unidades desses televisores à Argentina em 2007, o que significa alta de 25% em relação a 2006. As indústrias instaladas na Zona Franca de Manaus, no Brasil, e na Terra do Fogo, na Argentina, buscam aumentar a escala de produção dos televisores de LCD e plasma, cujos preços são mais altos.

As salvaguardas contra a importação de TVs produzidas em Manaus foi instituída em fevereiro de 2005 com duração de três anos. Foram estabelecidas cotas para as importações brasileiras de 100 mil unidades em 2005, 169 mil em 2006 e 235 mil em 2007. A salvaguarda expirou no início deste ano, mas o governo argentino institui uma nova cota de 175 mil unidades até setembro, enquanto avalia o pedido da indústria nacional.

Com o mercado interno aquecido em 2007, os fabricantes brasileiros venderam para a Argentina o equivalente a apenas 32% da cota. Segundo a Eletros, a divisão da cota entre os fabricantes resulta em volumes muito pequenos, que dificultam a logística.

Os setores privados dos dois países tentaram, sem sucesso, estabelecer um acordo de restrição voluntária das vendas brasileiras. Segundo uma fonte, os argentinos se comprometeram a não pedir a renovação da salvaguarda, enquanto o acordo era negociado. Mas não cumpriram a promessa.

Organização Mundial do Comércio (OMC)           

a) Montadoras se cansam da OMC e buscam mercados

Sem mais paciência para esperar a conclusão da Rodada Doha da Organização Mundial do Comércio (OMC), a indústria automobilística brasileira revela ao Estado que em abril vai apresentar um mapa dos mercados com quais gostaria que o governo começasse a negociar acordos comerciais.

No setor privado, a sensação é de que o Brasil não pode mais ficar à mercê do que vai ocorrer na OMC para conquistar mercados. Para se lançar em uma nova estratégia, a Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea) está concluindo um estudo sobre as prioridades ofensivas para as exportações do setor.

"Vamos identificar onde estão nossos principais interesses e onde acreditamos que podemos ser competitivos", afirmou Jackson Schneider, presidente da Anfavea, que esteve em Genebra para reuniões na Organização Internacional de Fabricantes de Veículos (OICA, em inglês).

Para ele, Doha ainda é vital e precisa ser concluída, mas o País não pode ficar parado. O projeto inclui eventuais acordos comerciais com países da América Latina, árabes, da Ásia e da África. "Esses são os mercados que temos vantagens comparativas", afirmou Schneider.

Há até a possibilidade de se negociar um acordo de autopeças com a Europa, já que o setor brasileiro estaria demonstrando competitividade suficiente para enfrentar a concorrência dos países ricos.

O plano vem no momento em que as exportações do setor começam a estagnar. Em 2008, a previsão é que o valor seja o mesmo de 2007, de cerca de US$ 13 bilhões. Em volume, a queda será de cerca de 5% em razão da valorização do real. A Marcopolo, por exemplo, conta que passou de vendas de mil ônibus por ano ao Oriente Médio em 2004 para menos de cem hoje.

O que está fora de questão é um acordo com a China. Hoje, o país já tem 82 marcas de carros, ante a média de 47 na Europa e nos Estados Unidos. O que assusta a Anfavea é a possibilidade de esses veículos estarem sendo produzidos com mão-de-obra barata e beneficiados por um câmbio mantido artificialmente pelo governo.

EUA e Europa vêem o setor automotivo brasileiro como um dos obstáculos ao acordo na OMC. Querem que o Brasil reduza em 60% a tarifa de importação de veículos.

Plano Internacional

a) Brasil ignora ameaça de Chávez, critica Uribe e quer apuração na OEA

Recusando-se a fazer críticas diretas à mobilização de tropas pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez, o governo brasileiro condenou a ofensiva militar que resultou na morte de guerrilheiros colombianos e cobrou de Bogotá um pedido de desculpas "mais explícito" ao Equador, que rompeu formalmente relações diplomáticas com a Colômbia. A Venezuela expulsou o embaixador colombiano, mas não estava claro ontem se romperia definitivamente a relação com Bogotá.

O ministro das Relações Exteriores, Celso Amorim, reconheceu que a crise entre Colômbia e Equador é "altamente preocupante" e "extremamente grave", ressaltando que "a violação territorial é condenável". O uso dessas expressões - pouco freqüentes no intrincado jargão diplomático - refletiu o nível de tensão com que o Itamaraty e o Palácio do Planalto trataram, nas últimas 48 horas, a possibilidade de um conflito armado entre os dois países, com participação também da Venezuela de Chávez.

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva telefonou aos presidentes do Equador, Rafael Correa, e da Colômbia, Álvaro Uribe. Do primeiro, segundo relato de Amorim, ouviu que as desculpas apresentadas por Uribe eram "insuficientes".

Já o presidente colombiano reiterou a Lula que mantinha as "qualificações" do pedido - ou seja, que o ataque não podia ser evitado e era uma resposta às Farc. Diante do impasse, o próprio Lula orientou Amorim a mobilizar os governos latino-americanos para uma reunião de emergência na Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington.

O Brasil tentará convencer Colômbia e Equador a aceitar a criação de um comitê de investigação, liderado pelo próprio secretário-geral da OEA, o chileno José Miguel Insulza, para apurar em que condições ocorreu a invasão do território equatoriano por tropas colombianas. "O governo colombiano tem uma versão, e o governo do Equador tem outra. Somente uma investigação pode esclarecer", disse Amorim.

O chanceler procurou deixar claro - enfatizando esse comentário pelo menos cinco vezes durante sua entrevista - que a responsabilidade por "baixar a temperatura" da crise é da Colômbia e lembrou que a inviolabilidade do território é um "princípio basilar" das relações internacionais. "Uma violação territorial é algo condenável", afirmou Amorim, completando com a ressalva de que algumas circunstâncias específicas podem relativizar esse conceito.

"Mas o ônus da prova fica do lado de quem cometeu a infração, que coloca em insegurança todos os Estados da região, sobretudo os menores. Não há uma negativa de que houve essa invasão. Há discrepâncias em relação às circunstâncias", observou o ministro, uma hora após receber a notícia de que Quito havia rompido relações diplomáticas com Bogotá. Em seguida, ele sugeriu à Colômbia "um pedido de desculpas não tão condicionado e ao mesmo tempo a garantia de que isso não se repita". "Se um vizinho entra na sua casa, a primeira coisa que ele faz é pedir desculpas. A segunda coisa é explicar por que fez aquilo."

Pressionado diversas vezes a dar sua opinião a respeito das ameaças feitas por Chávez de enviar caças russos Sukhoi à Colômbia, o chanceler brasileiro tentou insistentemente desviar o foco, apontando que "as coisas têm que ser tratadas com uma ordem lógica". Amorim até admitiu que as interferências de Chávez em assuntos de outros países devem ser tratada pela diplomacia brasileira, mas apresentou o seguinte raciocínio: as relações entre Venezuela e Colômbia já estavam deterioradas, e agora há uma crise nova e mais acentuada entre Colômbia e Equador. Portanto, é hora de agir na crise mais emergencial, para evitar o aumento da tensão. A única crítica esboçada por Amorim, indireta e sem que tivesse sido repetida, foi dizer que uma "reparação adicional", pela Colômbia, permitiria "circunscrever o tema no espectro bilateral" - referência a Chávez.

A delicadeza da situação mobilizou o governo, quando Amorim foi convocado para a reunião semanal de coordenação política no Palácio do Planalto. A avaliação feita pela cúpula do governo foi de que, apesar de uma atuação firme, o Brasil deve agir nos bastidores, em um primeiro momento, para não tornar-se mais um foco de tensão.

O governo quer colocar em prática a capacidade de mobilização diplomática na crise, sem apostar em uma escalada militar. "Eu não acho que seja provável haver um conflito armado", afirmou Amorim. Embora tenha participado de reuniões no Palácio do Planalto, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, também remeteu o assunto à diplomacia, e seus assessores informaram que o problema não estava com os militares.

O chanceler ressaltou que considera "muitíssimo remota" a possibilidade de participação brasileira e disse desconhecer qualquer contato de Lula com os militares para reforço das tropas na Amazônia, nas áreas de fronteira com a Colômbia e com a Venezuela.

b) Venezuela deve recorrer ao Brasil para comprar comida

A Venezuela anunciou o fechamento da fronteira com a Colômbia, um de seus mais importantes fornecedores de alimentos, têxteis e veículos, o que deve forçar o governo venezuelano a fazer importações de emergência de outros países, inclusive do Brasil. Uma escalada na crise entre os vizinhos andinos tem o potencial de aumentar a inflação venezuelana, num momento em que o país passa por escassez de alimentos e bens de consumo.

"Não podemos depender de absolutamente nada de um país que adota uma postura de guerra contra todos seus vizinhos", disse o ministro venezuelano de Agricultura, Elias Jaua. Apesar de não citar diretamente novas compras do Brasil, o ministro se referiu ao país diversas vezes como uma espécie de garantidor da segurança alimentar da Venezuela.

Luis Vicente León, diretor do instituto venezuelano Datanálisis, afirma que a situação de desabastecimento pode se agravar de modo "dramático": "A Colômbia é um fornecedor muito importante de produtos como açúcar, leite e trigo, cujo nível de desabastecimento já chega a 50%. Se a crise continuar, a situação pode se tornar dramática". Para ele, importações de emergência teriam então de ser feitas, inclusive do Brasil.

O índice de escassez elaborado pelo Banco Central da Venezuela, que mede a falta de oferta em relação à demanda, ficou em janeiro pouco abaixo dos 20%. Em janeiro do ano passado, o índice estava em 13,4%. Entretanto, analistas independentes dizem que, numa avaliação mais correta do índice, ele poderia chegar a mais do que 30%.

O comércio entre Venezuela e Colômbia chegou a quase US$ 6 bilhões no ano passado. Ele foi majoritariamente favorável aos colombianos, que venderam US$ 4,5 bilhões em alimentos e bens de consumo para a Venezuela.

Numa das primeira medidas anunciadas para combater o desabastecimento, o ministro de Planejamento e Desenvolvimento da Venezuela, Haiman El Troudi, disse que o governo vai facilitar a liberação de dólares para que as empresas possam importar mais produtos. Ele não se referiu diretamente ao fechamento da fronteira com a Colômbia, mas o anúncio foi visto pelo mercado como um modo emergencial de combater a escassez de alimentos e outros bens.

"Não há como esconder. As compras terão de ser feitas de emergência, não importando de onde", disse um economista de um órgão financeiro internacional sediado em Caracas. Ele pediu para não ser identificado.

El Troudi reconheceu que a medida é inflacionária: "Enquanto estivermos importando produtos, seguiremos importando também inflação". Dados oficiais mostram que os preços de alimentos subiram 31,9% de janeiro de 2007 a janeiro de 2008. A inflação total foi de 24%.

Esses dados são vistos pelo mercado financeiro venezuelano como subdimensionados.

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