26/06/2012
Guerra Cibernética e robôs de defesa
Rubens Antonio Barbosa

Os avanços tecnológicos vem colocando enormes desafios para a paz e a segurança internacional. Quando Clausewitz , há quase duzentos anos, fez a observação de que a guerra é a continuação da política por outros meios, não poderia imaginar que ela seria hoje tão atual. Estamos vivendo um período em que a guerra começa a operar por outros meios, não o convencional, como entendido até aqui, mas por instrumentos eletrônicos cada dia mais sofisticados.

A guerra cibernética, com objetivos militares ofensivos com vírus nos computadores iranianos e a utilização de veículos não tripulados (VANTs ou “drones”) na eliminação de lideres da Al Qaeda desafiam as normas internacionais vigentes e colocam questões morais e políticas que deverão ser enfrentadas pela comunidade internacional.

Os EUA e Israel, por meios cada vez mais sofisticados, atacaram os sistemas de computadores que administram as instalações iranianas de enriquecimento de urânio, ampliando significativamente o primeiro uso contínuo de armas cibernéticas. No contexto de uma operação denominada Jogos Olímpicos, um vírus, Stuxnet, desenvolvido nos EUA e em Israel, atacou as instalações em Natanz e depois desativou temporariamente quase mil das cinco mil centrífugas usadas pelo Irã para a purificação do urânio. Outra arma cibernética, o vírus Flame, teria atacado computadores de funcionários do governo iraniano, subtraindo informações estratégicas.

Pouco mencionadas são as ações cibernéticas da China contra os EUA e vice-versa. Os serviços de inteligência dos EUA identificaram 20 grupos associados ao Exército e às Universidades chinesas responsáveis pelos ataques à Google, RSA e à outros alvos americanos. Além dessa espionagem industrial, foram registradas invasões na rede de geração e transmissão de energia e em outras áreas de infraestrutura. Os EUA foram os primeiros a criar um Comando para a cibernética, o que, segundo os chineses, contribuiu para a militarização do sistema. A Agência de Segurança Nacional americana transfere informação reservada para mais de 20 empresas de defesa para que sejam desenvolvidas formas ofensivas e defensivas para o resguardo dos interesses nacionais de Washington.

EUA e China, no contexto do Diálogo Estratégico e de Economia e de contatos militares regulares, começaram desde 2011 a discutir formas para impedir a escalada dos ataques cibernéticos e meios para rápida comunicação entre suas capitais. EUA e Rússia mantêm esses contatos há algum tempo e estabeleceram um linha vermelha para evitar incidentes graves, o que talvez possa repetir-se com a China. Contatos regulares com Israel e com os países da Otan estão se intensificando.

A utilização de arma cibernética tenderá a se acentuar, podendo causar enormes problemas para a população civil, caso energia, transporte e comunicações vierem a ser afetados pela ação antagônica entre governos.

Os robôs militares operam hoje no mar, na terra e no ar. Os países que desenvolvem robôs para fins de defesa estão se equipando com todo tipo de forças de combate e serviços de inteligência cuja capacidade operacional está aumentando continuamente.

As regras de conduta militar no teatro de operações determinam que a decisão do disparo de uma arma deve ser humana. Esta restrição começa a ser questionada com a multiplicação do uso militar dos robôs, porque já existe a possibilidade dos VANTs de inteligência artificial aperfeiçoada, por exemplo, tomarem decisões letais de combate autônomas baseadas nas informações de que dispõem.

À medida que a tecnologia se desenvolve e permite uma maior autonomia dos robôs, a ideia de máquinas controladas a distância por computadores tomando decisões que colocam o mundo diante questões morais são cada vez mais reais e representam um grande desafio para a comunidade internacional.

Essa questão desperta o debate sobre o que foi chamado por The Economist de “ a moral e a máquina”. A capacidade dos robôs de decidir entre o certo e o errado coloca dilemas, como, por exemplo, o de aceitar ou não que um VANT deva disparar um míssil para eliminar um militante terrorista escondido em local onde se encontrem também civis.

Além do problema moral, o uso regular dos robôs está também desafiando as regras internacionais, estabelecidas pelas Nações Unidas e o princípio da soberania dos Estados. Alta funcionária da ONU, recentemente levantou sérias dúvidas sobre a legitimidade dos VANTS perante a lei internacional e a violação dos direitos humanos, em vista dos assassinatos e ferimentos infringidos a civis indiscriminadamente.

O Secretário de Defesa dos EUA, em visita recente à India e ao Afeganistão, não se cansou de repetir que, apesar das reclamações do Paquistão pela violação do seu espaço aéreo, as operações com os VANTS vão continuar a eliminar suspeitos de terrorismo em nome da defesa dos interesses dos EUA. A guerra ao terrorismo, iniciada por George W. Bush e continuada por Barak Obama, está, na prática, restrita hoje aos ataques dos VANTs, que, segundo os últimos números, eliminaram 269 militantes no Paquistão e 38 no Yemen, todos alegadamente da alta hierarquia da Al Qaeda com danos colaterais, um eufemismo para mortes não desprezíveis na população civil. E consta que Obama toma pessoalmente a si a última decisão sobre os membros da Al Qaeda que devem ser eliminados.

A comunidade internacional vai ter de responder ao desafio dessas questões morais, políticas e de soberania. introduzidas pela utilização dos robôs e das armas cibernéticas de defesa ou de ataque.

O Brasil não deveria ficar ausente do debate. Cabe participar das iniciativas que já surgiram para enfrentar o problema, como o Comitê para o Controle de Armamento Robótico, criado nos EUA.

Rubens Barbosa, presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp.

 

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