23/08/2011
Personagem a procura de um autor
Rubens Antonio Barbosa

A questão da competitividade na economia brasileira, um dos temas mais importantes da atualidade para o setor produtivo e exportador, foi o tema central das discussões do 30º. Encontro Nacional dos Exportadores (ENAEX), realizado no Rio, na semana passada.

As causas da perda competitividade, como a apreciação do câmbio, o custo Brasil, as altas taxas de juro e as dificuldades em avançar na inovação foram tratadas de forma abrangente.

A combinação da apreciação do Real com a desvalorização do dólar e do Yuan resultou na erosão das tarifas de importação negociadas na OMC (tanto a aplicada, quanto a consolidada), segundo estudo da FGV. O custo Brasil, ao invés de diminuir está aumentando. O investimento novo na indústria se reduz e custos adicionais cada vez mais afetam as empresas: guerra fiscal nos portos, a definição de novas regras para o aviso prévio, a eventual entrada em vigor da Resolução 158 da OIT que torna mais difícil a demissão nas empresas e que criam tantos problemas na França e na Itália.

Essa menor competitividade está acarretando perda de espaço no mercado interno e no exterior para os produtos manufaturados, a re-primarização da pauta de exportação e a desindustrialização da indústria de transformação.

Foram também examinadas medidas tomadas recentemente pelo governo Dilma visando a uma nova política industrial, tecnológica e de comércio exterior. Elas representam um primeiro passo na direção correta para contrabalançar a perda de competitividade e necessitam ser ampliadas. Apesar das dificuldades dentro do governo para sua aprovação em virtude do confronto entre a perspectiva de renúncia fiscal e o corte de gastos e a política de combate à inflação, espera-se que o Plano Brasil Maior tenha resultados mais efetivos para as empresas do que as medidas tomadas em 2003, 2008, 2009 e 2010.

A busca de novas idéias para melhorar a competitividade mostrou-se frustrante.

Lembrei, talvez com alguma dose de ingenuidade, que as novas idéias são as velhas idéias, sobretudo a retomada das discussões sobre as reformas que há quinze anos dormem nas gavetas do executivo e do legislativo: tributária, trabalhista, da previdência social e política deveriam voltar a ser negociadas por estímulo da sociedade civil e dos setores empresariais afetados. Mencionei que medidas no mercado futuro de moedas deveriam separar operações legitimas de hedge das transações especulativas, que exercem pressão para a valorização do câmbio. Na área da inovação, além do que já está sendo feito pelo governo e da implementação das medidas de apoio agora adotadas, mas que somente terão efeito no longo prazo, são necessárias ações de promoção de investimento em inovação para aumentar a participação da empresa privada no total dos gastos com pesquisa e desenvolvimento.

Por último, referi-me a mudança na estrutura decisória governamental do comércio exterior. A notícia de que a Presidente Dilma teve de intervir diretamente para que as medidas do Plano Brasil Maior pudessem ser anunciadas e tivessem significado real para o setor privado reforçou minha convicção de que comércio exterior deveria ser tratado de forma independente. Impõe-se a criação do cargo de presidente da Câmara de Comércio Exterior (CAMEX), subordinado diretamente à presidência da república, para dar maior peso e força política ao setor, facilitar a coordenação dentro do governo e propiciar um comando unificado e efetivo, a exemplo do que ocorre nos EUA com o USTR, o verdadeiro ministro do comércio exterior.

O sucesso da política econômica nos últimos anos e o grande salto quantitativo do comércio exterior - que quadruplicou em oito anos - escondem os problemas reais que afetam o setor. Sem as reformas, a perda da competitividade não se resolverá, nem no longo prazo, e até lá, como dizia Keynes, estaremos todos mortos (no caso, também a indústria brasileira). Menos do que na China ou nos EUA (registrou superávit de US$8 bilhões com o Brasil), que estão defendendo seus interesses, o problema está no Brasil pela falta de vontade política do governo e pela passividade da sociedade, da classe política, dos empresários e dos sindicatos para levar adiante as necessárias reformas estruturais.

O ENAEX, assim, foi importante por fazer um balanço amplo dos avanços de das dificuldades do comércio exterior brasileiro.

Não posso deixar de observar, contudo, que a agenda de discussão é a mesma dos últimos quinze anos. Poucas foram as referências sobre as novas realidades. Somos bons em diagnósticos, a partir do passado e do que ocorre hoje, mas temos dificuldade para enfrentar, com visão estratégica, os desafios representados pelas grandes transformações porque passam o mundo, a América do Sul e o próprio Brasil.

Estamos presenciando a mudança do eixo comercial do Atlântico para o Pacifico. A China tornou-se o novo pólo dinâmico de crescimento para a economia mundial e o grande fornecedor de produtos industriais fazendo surgir um novo ordenamento produtivo no mundo. A demanda global para o Brasil está hoje na agro-indústria, no setor de minérios e, em breve, estará no petróleo, todos incorporando avanços significativos em inovação e com alto valor agregado. A estratégia de comércio exterior e de negociação comercial de todos os países vem se ajustando à nova dinâmica na Ásia, nosso principal parceiro comercial superando a América Latina e a Europa. O setor industrial está perdendo seu vigor e reduzindo prematuramente sua importância na economia.

O que fazer? O que desejamos para o Brasil nesse novo quadro? Qual a nossa visão para o futuro para alcançar o stutus de potência econômica global nos próximos 15 anos, como se prevê no exterior? Esse é o nosso real desafio.


Rubens Barbosa, ex-Embaixador em Washington (1999-2004)

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