14/06/2011
Terras Raras: questão estratégica
Rubens Antonio Barbosa
AAs grandes transformações porque passa o mundo globalizado estão propiciando algumas oportunidades que o Brasil não pode deixar passar. A abertura do mercado global para terras raras brasileiras é uma delas.
Terras raras são um grupo de 17 tipos de metais não ferrosos de nomes estanhos: lantânio, neodímio, ítrio, promécio, cério, praseodímio, samário, európio, gadolínio, térbio, disprósio, hólmio, érbio, túlio, itérbio escândio e lutécio. Relativamente abundantes na natureza, possuem propriedades químicas semelhantes e misturados a outras substanciais são utilizados para a fabricação desde produtos simples como isqueiros até supercomputadores, ipods, painéis solares e aplicações militares em virtude de sua forca magnética que permite uma grande miniaturização dos componentes.
A produção desses minerais está concentrada (97%) na China, que detém um terço das reservas mundiais e concentra, juntamente com Rússia, EUA e Austrália, cerca de 70% das reservas globais. India, Rússia, Brasil, Malásia, e EUA são outros produtores marginais.
Segundo estudos do Congresso dos EUA, a demanda global está crescendo significativamente, passando de 134 mil tons em 2010 para 180 mil tons em 2012, representando um mercado de cerca de US$10 bi.
A questão das terras raras ganhou uma dimensão política e estratégica quando a China, depois de incidente pesqueiro com o Japão, ameaçou reduzir as quotas de exportação para esse país. Ao mesmo tempo, as autoridades chinesas deixaram saber que haveria uma redução de 40% das quotas de exportação para o mercado mundial para proteger o meio ambiente.
A notificação feita ao Japão e a gradual redução das quotas nos últimos cinco anos repercutiram imediatamente no mercado e o preço desses metais disparou. Em vista da reação internacional, Pequim desmentiu a redução das quotas, com pouco efeito para estabilizar o mercado, mas recentemente aumentou a taxação sobre o produto.
EUA e Europa denunciaram a China por prejudicar a produção de produtos sensíveis ocidentais. A atitude do governo chinês, caso mantida no futuro, poderá desencadear uma guerra comercial de grande repercussão dada a natureza estratégica desses metais. O controle sobre as terras raras pode dar à China no futuro uma forte vantagem tecnológica e aumentar sua capacitação militar em relação aos EUA.
O domínio chinês sobre produtos de que os países industrializados, em especial os EUA, dependem de maneira tão vital, sem fontes alternativas no curto prazo, fez com que o governo de Washington se movimentasse para esclarecer os objetivos da China.O Departamento de Defesa e o Congresso produziram documentos para identificar possíveis riscos para a segurança nacional norte-americana.
Os países da Europa, a Coréia e os EUA começaram a buscar fontes alternativas para diminuir a dependência da China. O Japão, o maior consumidor mundial, iniciou negociações com a Mongólia e o Casaquistão para iniciar a exploração de novas jazidas desses minérios.
O Brasil é um dos poucos países a possuir reservas confirmadas desses minérios. Recentemente anunciou-se a descoberta de jazidas de tálio. Ocupando a terceira posição depois de China e India, segundo o US Geological Survey, o Brasil deteria uma das maiores reservas do mundo.
A importância estratégica desses produtos, torna urgente a definição de uma política de produção e de comercialização para atender ao interesse nacional.
Grupo de trabalho interministerial integrado pelos Ministérios das Minas e Energia e da Ciência e Tecnologia está examinando o assunto e deverá proximamente propor uma política de fomento à produção e à capacitação tecnológica para tornar viável a exploração desses minérios.
Sinalizando políticas corretas e coerentes com o interesse do país, o relatório sugere a conveniência da negociação de acordos bilaterais comerciais e científico-tecnológicos. Empresas detentoras de know how para a fabricação de produtos de alta tecnologia, à base de terras-raras, poderiam associar-se, por meio de parcerias público-privadas para a implantação no Brasil de uma cadeia produtiva, competitiva e ambientalmente correta que poderia viabilizar, no longo prazo, a exploração das jazidas até aqui inexploradas, em função do pouco interesse demonstrado pela indústria nacional.
O alto custo da exploração, associado às complexidades técnicas, explica a reticência do setor privado em investir e as dificuldades da empresa Indústrias Nucleares do Brasil (INB), estatal responsável pela política de lavra e comercialização das terras raras.
O Ministério da Ciência e Tecnologia está procurando atrair a companhia Vale para explorar as terras raras e utilizar o minério em produtos de maior valor agregado. Estão sendo mantidos igualmente entendimentos com a Alemanha para desenvolver programa de cooperação nessa área.
O Brasil tem uma oportunidade excepcional de negócio e terá um posicionamento estratégico, se aproveitar esta janela de mercado.
Assim como ocorre com o Urânio, os minerais raros radioativos são monopólio estatal, exercido pela INB. Uma política racional tanto dos minerais radioativos quanto os raros deveria passar pela abertura, como ocorre com o petróleo, da exploração pelo setor privado, com todas as cautelas e controles que existem hoje na área petrolífera.
A demanda global para diversificar as fontes de suprimento das terras raras coloca o Brasil em posição privilegiada para não só atrair novas tecnologias, mas também para participar de um promissor mercado externo. O interesse externo sobre as reservas brasileiras é grande. Impõe-se a aprovação de regras claras de longo prazo que defendam o interesse nacional e possam atrair investimento para a exploração dessa riqueza.
Rubens Barbosa, ex-Embaixador em Washington (1999-2004)
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