09/10/2012
Protecionismo e Competitividade
Rubens Antonio Barbosa

Nas últimas semanas, o Primeiro Ministro do Reino Unido, David Cameron, e o Representante Comercial dos EUA, Ron Kirk, expressaram preocupação e criticaram o Brasil pelo aumento de tarifas de importação de alguns produtos industriais, consideradas como protecionistas e contrárias a compromissos contraídos no âmbito do G-20 e da OMC.

Por outro lado, Japão, Estados Unidos União Europeia, Japão e Austrália também questionaram o Brasil na OMC por ter transformado medidas temporárias, como o conteúdo nacional na licitação da telefonia móvel (G4), a redução do IPI e a nova politica automotiva, em politicas industriais permanentes

O governo brasileiro, a começar pela presidente Dilma, respondeu que o Brasil não modificou sua politica comercial e que as medidas adotadas visavam a legítima defesa dos setores industriais afetados por toda as formas espúrias de manipulação do comércio, inclusive a cambial, que, na prática, anula as tarifas negociadas pelo Brasil no âmbito da OMC.

O aumento de 200 tarifas, proposto pela Argentina e aceito pelo Brasil, terá duração limitada e estão de acordo com as regras da OMC. Apresentadas como ações de defesa comercial, as restrições podem ser vistas no mesmo contexto de outras medidas compensatórias concedidas ao setor produtivo e exportador pela ineficiência do governo em avançar na agenda para recuperar a competitividade da economia. A redução da taxa de juros, a desvalorização cambial, a redução do preço da energia, a desoneração da folha de salários e os acenos sobre a flexibilização da legislação trabalhista, além da nova regulamentação do ICMS são as principais medidas aplicadas ou em estudo pelo governo. Tratam-se de ações que apontam para o caminho correto, mas insuficientes para reduzir significativamente a perda da competividade do setor produtivo. É necessário definir uma politica industrial que crie as condições para o renascimento da indústria de transformação brasileira. As medidas restritivas podem resolver temporariamente problemas de alguns setores, mas não são as respostas que o setor privado espera do governo. O protecionismo não é solução para os problemas internos de competitividade.

A crise econômica que dura há mais de cinco anos e a falência da Organização Mundial de Comércio com o fracasso da Rodada de Doha que pretendia liberalizar o comércio global, podem explicar a desaceleração do comercial internacional que não deverá crescer mais de 2,5% em 2012 e cerca de 3,5% no ano próximo. Nesse contexto de baixo crescimento, de aumento do desemprego e de pouca perspectiva de rápida recuperação das principais economias desenvolvidas, as acusações de protecionismo contra o Brasil servem mais ao público interno norte-americano e britânico, às vésperas de eleições presidenciais ou em meio a dificuldades politicas.

Relatório recente sobre Protecionismo no âmbito dos países do G-20, elaborado pelo Global Trade Alert (GTA), da Universidade de St Gallen, na Suiça, mostra que a tendência restritiva é bem mais ampla. Nele são analisadas medidas aplicadas desde 2008 pelos governos com base em dois critérios: medidas discriminatórias e quase certamente discriminatórias.

Quando os países do G-20 são comparados em relação ao número de medidas discriminatórias aplicadas, Japão, Argentina, Turquia, Índia e Arábia Saudita encabeçam a lista, seguidos dos 27 países da União Europeia: a França, os EUA e o Reino Unido.

Considerando o número de medidas discriminatórias e a porcentagem das mesmas em relação às práticas liberalizantes, os países que menos utilizaram medidas protecionistas foram o México, a África do Sul e o Brasil.

Por outro lado, o levantamento da GTA apresenta grandes surpresas quando identifica quais os países que mais aplicaram medidas quase certamente discriminatórias, quantas linhas tarifarias, quantos setores e parceiros comerciais ficaram afetados por essas medidas.

Pelo interesse e pelo ineditismo da pesquisa, vale a pena reproduzir parcialmente o resultado desse trabalho, com a indicação dos dez países que, com medidas quase certamente discriminatórias:

- Mais as aplicaram: União Europeia (UE) (302), Rússia (169), Argentina (141), Índia (74), Reino Unido (67), Alemanha (64) França (61), China (60), Itália (56) e Brasil (54);

- Afetaram o maior número de linhas tarifárias (categorias de produtos); Vietnã (931), Venezuela (786), Cazaquistão (732), China (732), UE27 (656), Nigéria (599), Argélia (476), Argentina (467), Rússia (446), Índia (401);

- Afetaram o maior número de setores: Argentina (63), Argélia (62), UE27 (57), China (52), Nigéria (45), Rússia (45), Alemanha (44), Cazaquistão (44) EUA (42), Gana (41);

- Afetaram o maior número de países: China (193), UE27 (187), Holanda (163), Alemanha 9155), Polônia (155), Índia (153), Indonésia (153), Bélgica (152), Finlândia (152), Argentina (151)

Em termos de medidas discriminatórias, assim, a União Europeia é a campeã do protecionismo; em termos de linhas tarifárias afetadas, o Vietnã é o número um (em virtude das repetidas desvalorizações competitivas da sua moeda); em termos de setores afetados, a Argentina é a primeira da lista; e em termos de parceiros afetados, a China encabeça a relação (em parte devido a extensa lista de políticas administradas por meio de descontos seletivos de VAT para os exportadores)

A China e a Argentina são os únicos países presentes em todas as listas das quatro categorias dos maiores responsáveis por politicas protecionistas. Alemanha, Índia e Rússia estão listadas em três das quatro listas dos mais restritivos. O Brasil aparece em apenas uma das listas e mesmo assim em décimo lugar.
Não há quem fique bem na foto do protecionismo.

Rubens Barbosa, Presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp.

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