26/04/2005
Diálogo Estratégico
Rubens Antonio Barbosa
Quando de sua primeira campanha presidencial, George W. Bush reuniu, para ajudá-lo na área de política externa e de defesa, um restrito grupo de assessores que já havia trabalhado diretamente com os Presidentes Regan e Bush. Integrado por Dick Cheney, Donald Rumsfeld, Colin Powell, Paul Wolfowitz, Richard Armitage e Condoleezza Rice. Esse grupo logo ficou conhecido como os Vulcanos, em alusão ao Deus romano do ferro e do fogo, justamente pelas suas duras posições no campo internacional.
Nos primeiros quatro anos da Administração George W. Bush, Condoleezza Rice, como Assessora de Segurança Nacional na Casa Branca, manteve uma atitude discreta, mas sempre com forte influência nas decisões mais importantes da politica externa norte-americana. Especialista em guerra fria e em União Soviética, desde seu tempo na Universidade de Stanford, Rice demonstrou grande habilidade ao preservar-se das disputas internas entre o Departamento de Estado e o Departamento de Defesa, sobretudo depois de 11 de setembro, quando o Governo norte-americano declarou os EUA um pais em guerra contra o terrorismo e preventivamente atacou o Iraque.
Em 2001, coordenou um dos documentos modernos mais importantes dos EUA, a Doutrina de Segurança Nacional. Nele fica explícita a filosofia da “paz através da força nas relações internacionais”, com ataques preventivos e mudança de regime em países que ameaçem a segurança nacional norte-americana e que passou a ser a marca registrada da ação unilateral da única superpotência global.
Na segunda Administração Bush, Rice substituiu Colin Powell como Secretária de Estado. Dada a proximidade anterior com Bush, Rice está executando a política externa definida pelo presidente, que, na verdade, em larga medida é a dela, não se esperando assim grandes inovações na substância. Combate ao terrorismo, apoio a democracia e à não-proliferação (Irã e Corea do Norte), êxito nas campanhas militares no Afeganistão e no Iraque, e as relações com a Europa, a Rússia e com a China continuarão a ser as prioridades dos EUA.
Rice, entretando, introduziu significativas mudanças no estilo da ação diplomática. Estilo pulso forte com delicadeza, ao contrário de Colin Powell, que relutava em viajar e preferia manter seus contatos por telefone, a Secretária de Estado, nos tres primeiros meses de governo, já visitou 22 países. Na Europa, sua primeira viagem, buscou reaproximação. Mais recentemente, visitou a Russia procurando colocar em perspectiva criticas feitas por Bush sobre ameaças a democracia.
Hoje, em mais um de seus períplos, Rice chega ao Brasil. Em seguida deverá participar no Chile de reunião Comunidade da Democracia, além de visitar a Colômbia e El Salvador.
A primeira visita de Condoleezza Rice à América Latina ocorre em um dos momentos de mais baixa prioridade atribuida pelos EUA à região, o que explica, em parte, a gradual perda da influência norte-americana, evidenciada na sucessão do Secretário-Geral da OEA. Coincide, por outro lado, com um período de perturbação política, sobretudo na Bolívia e no Equador, onde os presidentes foram forçados a renunciar e de instabilidade na Venezuela e na Colômbia.
As relações bilaterais entre Brasil e EUA, no entanto, estão em excelente nível, como demonstram as recentes visitas de Colin Powell, no final de 2004, de Donald Rumsfeld, no inicio de 2005, e agora de Condoleezza Rice. Não há conflitos ou grandes problemas na área política e diplomática e a visita será simbólica no sentido de estreitar ainda mais as relações entre os dois países.
Refletindo a importância do Brasil no contexto regional, o principal foco das conversações certamente recairá sobre a situação regional e a percepção do Governo brasileiro sobre a evolução política, econômica e social de nossos vizinhos. No Brasil, Rice deverá anunciar a política norte-americana para a América Latina.
A América Latina sempre foi uma preocupação distante e episódica para a Secretária de Estado e a visão de Brasilia sobre a situação regional poderá certamente ser útil para a Casa Branca e o Departamento de Estado.
Não faltarão temas regionais como Venezuela, Equador, Bolivia, Haiti e a situação da OEA, bem como questões globais, como reforma das Nações Unidas, Iraque e Oriente Médio, a preservação e o fortalecimento da democracia, o livre comércio, o desenvolvimento sustentado, a não proliferação deverão ser mencionados.
Havendo assumido o cargo de Vice-Ministro no Departamento de Estado, Robert Zoellick, antigo representante comercial dos EUA (USTR), deve influir para que Rice explore também uma agenda comercial, sobretudo na América Latina. É possivel, por isso, que o tema ALCA seja tratado nos encontros no Brasil, sobretudo depois das declarações, logo retificadas pelos Ministros Amorim e Jose Dirceu, de que o Brasil tirou a ALCA da pauta do Governo.
Três outros assuntos, poderão ser também abordados pela sua relevância e por direta ou indiretamente estarem relacionados com interesses estratégicos dos EUA: a viagem ao Brasil do Presidente George W. Bush em novembro próximo, a realização da Cúpula América Latina-Oriente Médio, pelo potencial de críticas que poderá despertar contra os EUA e Israel, e a crescente presença da China na região, em especial, pelas implicações para a segurança nacional dos EUA caso se concretizem os acordos de reorientação das vendas de petroleo venezuelano dos EUA para a China.
Carismática, dura, mas suave (é pianista clássica bissexta), dependendo do quadro político interno nos EUA, Condoleezza Rice poderá, em quatro anos, estar no centro dos acontecimentos sucessórios, como curiosamente admitiu em ato falho, logo corrigido, em recente entrevista em Moscou.
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