Reforço para o soft power brasileiro
Rubens Antonio Barbosa
Um dos aspectos da nossa política externa que pouco tem merecido atenção é o da assistência técnica e financeira prestada pelo Brasil a dezenas de países, especialmente da África e da América Latina. São gestos políticos que tentam reforçar nossa solidariedade. Discretamente,e aumentando de forma gradual seu “soft power”, o Brasil, nos últimos anos,se tornou um dos maiores doadores e prestadores de assistência técnica e financeira a países de menor desenvolvimento relativo.
Recente relatório,elaborado pelo Ipea e pel aAgência Brasileira de Cooperação (ABC), do Ministério das Relações Exteriores,reúne dados e informações sobre as principais iniciativas implementadas pelo Brasil, de forma bilateral ou multilateral, no contexto da Cooperação Brasileira com outros países em desenvolvimento. Em 2010, o país investiu aproximadamente R$ 1,6 bilhão na cooperação para o desenvolvimento, representando um aumento nominal de 91% em relação a 2009. Deste total, R$ 548 milhões foram gastos a título de contribuiçã opara 143 organismos internacionais. Outros R$ 490 milhões tiveram como destino ações de cooperação técnica, científica, tecnológica, educacional ou ajuda humanitária. 68,1% dos processos bilaterais de cooperação foram compaíses da América Latina e Caribe, e 22,6% com países do continente africano.
Os recursos são em parte oriundos da ABC.Provêem também de outras instituições, como Embrapa, Conab e BNDES; do Tesouro Nacional para ajuda humanitária a países afetados por desastres naturais, para a UNDP das Nações Unidas, para o programa de alimentação da FAO, para ajuda a faixa de Gaza e ao Haiti. Com essa finalidade, foram criados escritórios de pesquisas agrícolas em Gana; fazenda-modelo de algodão no Mali; fábrica de medicamentos anti-retrovirais em Moçambique; e centros de formação profissional em cinco países africanos.
Por iniciativa da Secretaria de Assuntos Estratégicos da Presidência da República, a Fiesp promoveu recentemente encontro em que foram examinados diferentes aspectos do “soft power” brasileiro. Nessa oportunidade, o papel da ABC foi ressaltado como de grande relevância e sugeriu-se o fortalecimento da Agência e o reforço dos recursos financeiros colocados a sua disposição, já que o orçamento disponível para 2011 (US$ 52mi) foi reduzido para US$ 36 milhões em 2012 e em 2013.
Durante a visita da presidente Dilma Rousseff à Etiópia para reunião da União Africana, foi criado o Grupo África para estudar medidas com vistas a ampliar a assistência técnica e de desenvolvimento do Brasil aos países daquele continente. Foi noticiado nessa oportunidade que uma das medidas em estudo pelo Governo brasileiro seria a transformação da ABC em uma autarquia, com mais autonomia e maiores recursos financeiros (da ordem de R$300 milhões).A estrutura dessa nova agência ainda não está definida e um grupo de trabalho analisadiversos modelos internacionais. A ABC continuaria com a vinculação com o Itamaraty, embora com autonomia orçamentária, e seria criada uma carreira própria para seus funcionários.
O fortalecimento da ABC é uma noticia alvissareiraque deve ser apoiada com entusiasmo. Viráaperfeiçoar e reforçar um importante instrumento da politica externa a serviço da projeção do Brasil no exterior (“soft power”). A ABC só não pode executar sua missão de forma mais eficiente e atuante pela absoluta falta de recursos.
Caso essas providências sejam tomadas, ficaria afastada a ideia em estudo de atribuir à Agência a competência para tratar de comércio internacional, com o suposto objetivo de favorecer a balança comercial do pais.Além dessa vertente comercial com a função adicional de financiar a compra de produtos brasileiros e de promoção de negócios na África e na América Latina, a agência teria ainda a competência paraapoiar os investimentos de empresas nacionaisno exterior.
Essa possibilidade, também noticiada pela imprensa, colocaria em perigo o braço de assistência técnica do Itamaraty com repercussão negativa sobre nossa projeção externa.
Para as funções que poderiam ser atribuídas a essa nova Agência já existem outros órgãos públicos: a Agência Brasileira de Exportações (APEX), que cuida da promoção de produtos brasileiros no exterior, com participação em feiras e organização de eventos, a Agência Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI), que cuida de buscar investimentos produtivos e a inovação, e o próprio Itamaraty, por meio do Departamento de Promoção Comercial.Por outro lado, o governo discute a mais de dois anos a criação do Banco de Importação e Exportação (Eximbank) que deveria financiar os compradores de produtos brasileiros. O banco está paralisado por disputa interna entre diversos órgãos do Governo.
O comércio exterior brasileiro não precisa de mais outro órgão para aumentar sua eficiência emaior participação no intercâmbio global. Quase 20 ministérios e agências interferem direta ou indiretamente no processo de exportação, e a burocracia e a ineficiência desses órgãos é um dos fatores que alimentam o custo Brasil e tornam nossos produtos menos competitivos.
O setor externonecessita de menos interferência do governo e mais coordenação no processo decisório. No documento Agenda de Integração Externa, recentemente divulgado, a Fiesp pede a reforma do processo decisório para tornar mais efetiva a ação do governo por meio do fortalecimento da CAMEX como ponto focal da formulação da politica de comercio exterior e da negociação externa. Para alcançar esse objetivo, a Fiesp propõe vincular a CAMEX diretamente ao presidente da Republica a fimde dar um peso politico maior no contexto da politica econômica e ampliar a coordenação interna.
Rubens Barbosa, presidente do Conselho de Comércio Exterior da Fiesp